"iFood chinês" começa campanha contra desperdício no delivery
Usuários reclamam que porções estão vindo menores e mais caras. O presidente Xi Jinping diz que teme falta de alimentos por causa do coronavírus
Carolina Riveira
Publicado em 17 de agosto de 2020 às 11h16.
Última atualização em 18 de agosto de 2020 às 09h56.
O coronavírus fez a China começar uma campanha contra desperdício de comida. A discussão foi levantada pelo presidente Xi Jinping , que diz que a pandemia "soou o alarme" para o problema no país -- que historicamente sofre com insegurança alimentar. Agora, as duas maiores plataformas de delivery do país (e do mundo) se uniram ao movimento: a Ele.me e a Meituan Dianping.
Na semana passada, a Meituan, que responde por metade dos serviços de delivery na China, publicou um comunicado propondo que restaurantes em todo o país a promover ações de redução do desperdício de alimentos e incentivassem seus clientes a fazer o mesmo. Uma das propostas é deixar claro durante os pedidos online o tamanho das porções.
Já o Ele.me, que pertence à gigante de e-commerce Alibaba, se uniu a uma associação culinária local para que, a partir de agora, as porções em sua plataforma sejam menores. A proposta foi chamada de "plano do meio prato" e encoraja os restaurantes a reduzirem as porções para evitar o desperdício, segundo o jornal South China Morning Post (que pertence à Alibaba).
As ações têm recebido críticas nas redes sociais chinesas. Segundo escreveram clientes no Weibo (o "Twitter chinês"), na prática não houve redução significativa dos preços, enquanto houve redução nas porções.
As mudanças começaram depois que o presidente Xi Jinping disse na semana passada que era urgente que o país tomasse medidas contra o "chocante" desperdício de comida e inaugurou o que chamou de "Campanha do Prato Limpo". O problema ficou mais latente em meio à pandemia do coronavírus, que, segundo o presidente, "soou o alarme" e que a China deveria manter "um senso de crise" sobre a alimentação.
A pandemia atrapalhou algumas das cadeias de produção e distribuição de alimentos, tanto dentro da China quanto globalmente. O governo em Pequim nega que a China esteja à beira de uma onda de fome ou de falta de alimentos.
Mas, mesmo antes do coroanvírus, a questão da segurança alimentar na China já era um assunto. O país, é sabido, passou por períodos de fome severa após guerras. Nas últimas décadas, com o crescimento econômico, os chineses não tiveram mais problemas alimentares. Ainda assim, sua população de 1,4 bilhão de habitantes demanda amplos investimentos para manter todos alimentados.
Outro desafio recente do país é a "ocidentalização" da alimentação chinesa. Com a abertura de redes de fast-food (o McDonald's, por exemplo, está na China desde a década de 1990), o país tem consumido alimentos que sua indústria e agricultura próprios não produz. Não à toa, a China é uma das maiores exportadores de insumos alimentares no mundo -- no Brasil, os chineses importam produtos como soja para o gado e proteína animal.
Diante da campanha de Xi, não só as empresas de delivery mas associações de restaurantes em todo o país passaram a incentivar a redução do desperdício na alimentação. Em Wuhan, onde a pandemia começou em janeiro, a associação local de restaurantes criou uma proposta em que grupos de dez pessoas só peçam comida suficiente para nove. Depois, mais pratos só seriam levados à mesa se os clientes solicitassem.
Em algumas cidades, a "campanha" criada por Xi teve traços preonceituosos. Um restaurante na província de Hunan, ainda segundo o South China Morning Post, criou uma campanha chamada "pese antes de pedir".
A campanha não só afirmava para clientes pesarem a comida, mas a eles mesmos. A comunicação chegava a dizer que mulheres abaixo de 40 quilos não deveriam pedir mais de dois pratos, enquanto homens na faixa dos 70 e 80 quilos poderiam pedir até três. A proposta foi criticada na internet e o restaurante pediu desculpas neste fim de semana, afirmando que o objetivo era "que as pessoas não desperdiçassem comida e pedissem de forma saudável".
A campanha nacional chegou até mesmo às redes sociais. O Douyin, de vídeos rápidos, passou a regular competições de comida online -- o app é o irmão-chinês do TikTok, que também pertence à companhia-mãe do app, a ByteDance. Se os usuários procuram termos como "competição de comida", uma mensagem de alerta e pedido para evitar o desperdício de comida aparece.