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'A situação piorou', diz sobrevivente de massacre na China

Para Shao Jiang, exilado na Europa desde 1997, a história continua oculta ''sob a propaganda do regime unipartidarista, que ainda reprime os direitos humanos''

Há 23 anos, massacre calava as vozes de milhares de jovens na China (Getty Images)
DR

Da Redação

Publicado em 4 de junho de 2012 às 18h58.

Pequim - Passados 23 anos, a lembrança da Praça da Paz Celestial não desaparece da memória do professor Shao Jiang, naquele tempo estudante e para sempre sobrevivente de um massacre que calou as vozes de milhares de jovens chineses que lutavam por reformas que só chegarão, disse, ''quando o povo souber a verdade''.

Jiang, exilado na Europa desde 1997, informou à Agência Efe que a história continua oculta ''sob a propaganda do regime unipartidarista, que ainda restringe as liberdades e reprime os direitos humanos''.

Por isso, o professor se mostrou descrente perante os anúncios reformistas do atual primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, e também sobre das políticas de câmbio que, em teoria, serão herdadas pelos sucessores dos líderes chineses no final do ano.

''Pode-se dizer, inclusive, que a situação se agravou durante os anos 80'', afirmou. O exilado ainda destacou que o regime intensificou seu aparelho de censura por causa da expansão das redes sociais e pelo temor da internet ser um propulsor de manifestações similares às da famosa Praça de Pequim.

Há exatos 23 anos, Jiang foi testemunha de como os tanques e os soldados abriam fogo de forma indiscriminada contra civis e seus corpos ficavam pela estrada. ''Eu sabia que os tanques eram utilizados contra os inimigos, mas, talvez de forma inocente, nunca imaginei que o governo os empregaria contra o seu próprio povo''.

Jiang conseguiu sair com vida do massacre e não sabe quantas pessoas morreram naquele mês de junho em Pequim (os números oscilam entre 100 e os três mil, segundo as fontes), mas não desistiu da luta por uma mudança política na China , a qual vem travando desde quando ainda era um estudante de 22 anos.


Agora, o professor de sociologia da Universidade de Westminster, em Londres, combina seu papel de docente com o ativismo na Anistia Internacional (AI), seu blog (onde escreve periodicamente sobre a atualidade chinesa) e redes sociais como Twitter.

No entanto, Shao Jiang considerou ''muito complicado'' a organização com outros exilados e ativistas que ainda estão na China. ''É muito mais fácil entrar em contato com as pessoas'' disse.

Em meio à entrevista, o professor interrompeu brevemente a conversa ao receber uma mensagem que informa sobre a detenção de ativistas em uma província chinesa (sem revelar qual é), em plena campanha de controle de possíveis atos de comemoração do aniversário por parte do governo.

Ele organizou nesta segunda-feira uma oferenda com velas em honra à memória às vítimas do episódio em frente à Embaixada da China em Londres, consciente de sua ''sorte'', disse à Efe sobre a necessidade que os crimes não caiam no esquecimento.

Esse espírito crítico foi o que o levou a analisar meios alternativos nos dias precedentes ao massacre. Após sair com vida, Shao foi detido por 18 meses para, depois, ficar confinado sob prisão domiciliar até conseguir escapar em 1997.

''Como Chen Guangcheng'', disse à Efe, em referência ao dissidente cego que, após fugir da vigilância policial e passar seis dias na Embaixada dos EUA em Pequim, agora se encontra em Nova York.


Desde que fugiu de seu país, ele não retornou à China. ''Voltaria para a prisão'', afirma. Embora não possa ver sua família, que ainda reside em Tianjin (nordeste), diz que é feliz. ''Aqui posso fazer muitas coisas. Minha intenção é trabalhar duro para mudar a situação'', diz Shao, que está terminando seu doutorado sobre o sistema político e a democratização da China.

Sua receita para a mudança é, sobretudo, a educação. Confia na internet e na capacidade autodidata da juventude: ''Em 89 aprendi muitas coisas. Agora os jovens não entendem o que acontece porque não viveram naquela época e seus pais os educam no silêncio para que não encontrem problemas. É uma postura cínica e é o principal problema''.

O professor ainda destaca que para uma grande mudança, é preciso mobilizar pelo menos 20% da população, algo ainda difícil no país asiático. ''Embora o governo não queira dar direitos, a situação pode mudar se as pessoas se educarem e organizarem entre elas'', falou.

Shao Jiang hoje tem a maturidade da meia idade, mas ainda segue fiel aos princípios que o impulsionaram a tomar as ruas da capital chinesa durante os dias que passariam a engrossar a lista de infâmias mundiais.

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Pequim - Passados 23 anos, a lembrança da Praça da Paz Celestial não desaparece da memória do professor Shao Jiang, naquele tempo estudante e para sempre sobrevivente de um massacre que calou as vozes de milhares de jovens chineses que lutavam por reformas que só chegarão, disse, ''quando o povo souber a verdade''.

Jiang, exilado na Europa desde 1997, informou à Agência Efe que a história continua oculta ''sob a propaganda do regime unipartidarista, que ainda restringe as liberdades e reprime os direitos humanos''.

Por isso, o professor se mostrou descrente perante os anúncios reformistas do atual primeiro-ministro chinês, Wen Jiabao, e também sobre das políticas de câmbio que, em teoria, serão herdadas pelos sucessores dos líderes chineses no final do ano.

''Pode-se dizer, inclusive, que a situação se agravou durante os anos 80'', afirmou. O exilado ainda destacou que o regime intensificou seu aparelho de censura por causa da expansão das redes sociais e pelo temor da internet ser um propulsor de manifestações similares às da famosa Praça de Pequim.

Há exatos 23 anos, Jiang foi testemunha de como os tanques e os soldados abriam fogo de forma indiscriminada contra civis e seus corpos ficavam pela estrada. ''Eu sabia que os tanques eram utilizados contra os inimigos, mas, talvez de forma inocente, nunca imaginei que o governo os empregaria contra o seu próprio povo''.

Jiang conseguiu sair com vida do massacre e não sabe quantas pessoas morreram naquele mês de junho em Pequim (os números oscilam entre 100 e os três mil, segundo as fontes), mas não desistiu da luta por uma mudança política na China , a qual vem travando desde quando ainda era um estudante de 22 anos.


Agora, o professor de sociologia da Universidade de Westminster, em Londres, combina seu papel de docente com o ativismo na Anistia Internacional (AI), seu blog (onde escreve periodicamente sobre a atualidade chinesa) e redes sociais como Twitter.

No entanto, Shao Jiang considerou ''muito complicado'' a organização com outros exilados e ativistas que ainda estão na China. ''É muito mais fácil entrar em contato com as pessoas'' disse.

Em meio à entrevista, o professor interrompeu brevemente a conversa ao receber uma mensagem que informa sobre a detenção de ativistas em uma província chinesa (sem revelar qual é), em plena campanha de controle de possíveis atos de comemoração do aniversário por parte do governo.

Ele organizou nesta segunda-feira uma oferenda com velas em honra à memória às vítimas do episódio em frente à Embaixada da China em Londres, consciente de sua ''sorte'', disse à Efe sobre a necessidade que os crimes não caiam no esquecimento.

Esse espírito crítico foi o que o levou a analisar meios alternativos nos dias precedentes ao massacre. Após sair com vida, Shao foi detido por 18 meses para, depois, ficar confinado sob prisão domiciliar até conseguir escapar em 1997.

''Como Chen Guangcheng'', disse à Efe, em referência ao dissidente cego que, após fugir da vigilância policial e passar seis dias na Embaixada dos EUA em Pequim, agora se encontra em Nova York.


Desde que fugiu de seu país, ele não retornou à China. ''Voltaria para a prisão'', afirma. Embora não possa ver sua família, que ainda reside em Tianjin (nordeste), diz que é feliz. ''Aqui posso fazer muitas coisas. Minha intenção é trabalhar duro para mudar a situação'', diz Shao, que está terminando seu doutorado sobre o sistema político e a democratização da China.

Sua receita para a mudança é, sobretudo, a educação. Confia na internet e na capacidade autodidata da juventude: ''Em 89 aprendi muitas coisas. Agora os jovens não entendem o que acontece porque não viveram naquela época e seus pais os educam no silêncio para que não encontrem problemas. É uma postura cínica e é o principal problema''.

O professor ainda destaca que para uma grande mudança, é preciso mobilizar pelo menos 20% da população, algo ainda difícil no país asiático. ''Embora o governo não queira dar direitos, a situação pode mudar se as pessoas se educarem e organizarem entre elas'', falou.

Shao Jiang hoje tem a maturidade da meia idade, mas ainda segue fiel aos princípios que o impulsionaram a tomar as ruas da capital chinesa durante os dias que passariam a engrossar a lista de infâmias mundiais.

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