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No xadrez do Fed, Powell joga parado entre os riscos de recessão e inflação

Presidente do Federal Reserve mantém cautela antes de quedas de juros e mercado descarta corte em março

Jerome Powell, presidente do Federal Reserve (Samuel Corum//Getty Images)

Publicado em 19 de março de 2024 às 17h22.

Última atualização em 19 de março de 2024 às 17h45.

Todas as expectativas do mercado estão voltadas para a decisão do Federal Reserve (Fed) desta quarta-feira, 20. Era nesta reunião que, no início do ano, muitos investidores acreditavam que viria a primeira queda de juros dos Estados Unidos. Mas o cenário mudou de lá para cá e praticamente ninguém espera que o Fed altere agora sua taxa de juro, atualmente no intervalo entre 5,25% e 5,5 %.  Para além da tradicional coletiva de imprensa do presidente do Fed, Jerome Powell, a novidade será a divulgação do relatório trimestral. Nesse documento, os membros do Fed revelam suas projeções para a taxa de juros do fim deste e dos próximos anos e para outros indicadores, como o Índice de Preço sobre Consumo Pessoal (PCE, na sigla em inglês).

No último relatório, divulgado na decisão de juros de dezembro, o Fed previu que a taxa de juro encerraria o ano 0,75 ponto percentual abaixo do nível atual -- o que levou investidores a deduzirem que seriam três cortes de 0,25 ponto percentual (p.p.). Naquele momento, no entanto, havia grande divergência entre as expectativas do Fed e do mercado, que chegou a precificar sete cortes de 0,25 p.p. ao longo do ano, começando pela decisão de março. O medo é que o Fed reduza a previsão de cortes de juros de três para apenas dois para este ano.

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O que mudou a percepção do mercado (e do próprio Fed) foram os dados da inflação corrente e do mercado de trabalho, que têm surpreendido para cima a cada divulgação. O PCE, principal referência de inflação do Fed, terminou fevereiro a 2,4%, ainda acima da meta de 2%, enquanto o CPI segue acima de 3% desde 2021. Já a atividade, que poderia adicionar urgência para os cortes de juros, segue firme. A despeito dos temores de recessão do ano passado, a economia americana encerrou 2023 com crescimento de 3,2% e a taxa de desemprego está em 3,9%, pouco acima dos 3,5% do pré-pandemia e abaixo da taxa de desemprego média dos países da OCDE, que terminou 2023 a 4,2%.

"Os dados de crescimento, emprego e inflação dos Estados Unidos continuam demasiado quentes para que o Federal Reserve considere cortes iminentes nas taxas de juro", avalia em nota James Knightley, economista-chefe internacional do banco ING.

Quando o Fed começará a cortar o juro?

A poucas horas da decisão desta quarta, investidores precificam que a queda de juros começará apenas em junho. Mas uma corrente do mercado já espera que os cortes iniciem apenas em julho. Para o fim do ano, as maiores apostas ainda são de três cortes de juros, como sinalizado pelo Fed em dezembro. Uma revisão das projeções de cortes pelo Fed pode tornar o mercado ainda mais cauteloso quanto ao ímpeto do banco central americano em cortar as taxas de juros.

Nenhum indicador sozinho é mais importante que a taxa de juros dos Estados Unidos. Quanto mais alta, maior é a propensão dos investidores em manter o dinheiro alocado em títulos e a evitar ativos de risco.  Por isso, há a expectativa de que a queda dos juros gere maior otimismo nos mercados globais, com alta das bolsas e queda do dólar. Por outro lado, Powell joga agora por seu legado e não quer ser lembrado como um presidente do Fed que foi leniente aos riscos da inflação.

A questão que ninguém sabe ao certo é se essa piora dos indicadores de inflação (especialmente no setor de serviços) são duradouros ou apenas sazonais, como defendido por parte do mercado. É prudente, com uma economia saudável, segurar as taxas de juros em patamar restritivo para consolidar a queda da inflação. Só que, com o juro real cada vez mais alto (efeito da desinflação), a economia americana fica ainda mais pressionada. Os juros, vale lembrar, estão no maior patamar desde o início do século e a inflação ao consumidor, que bateu pico de 9,1% em 2022, já resfriou para 3,2%.

Na subida de juros, o Fed foi bastante criticado por ter demorado a apertar sua política monetária. Parte dos investidores temem, agora, que a demora para reduzir a taxa de juros produza mais efeitos negativos que positivos para a economia americana.

É um consenso, até agora, que o Fed tem atingido seu objetivo com maestria. Afinal, os Estados Unidos conseguiram derrubar a inflação sem causar grandes danos, como em outros ciclos de alta de juros. Só que o êxito da subida, assim como no alpinismo, não exclui os riscos da descida. A possibilidade de recessão não está descartada, como pontuou neste mês o presidente do J. P. Morgan, Jamie Dimon. Nem o risco de um repique da inflação. Na dúvida, Powell tem escolhido esperar.

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