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Com projeção de Selic a 13,5%, Felipe Guerra, da Legacy, vê Ibovespa mais caro que a bolsa americana

Em entrevista à EXAME, o CIO afirma que há falta de sincronia entre o Banco Central e o governo, comparando o cenário ao do primeiro mandato de Dilma

Felipe Guerra, sócio-fundador e CIO da Legacy Capital: "há o risco de entrarmos em uma dinâmica semelhante à de 2013 e 2014, , quando o BC aumentava os juros, mas sempre ficava atrás da curva (Legacy Capital /Divulgação)

Publicado em 4 de outubro de 2024 às 15h38.

A percepção de que a bolsa brasileira está barata já é um consenso no mercado há alguns anos. No entanto, essa visão não é compartilhada por Felipe Guerra, sócio-fundador e CIO da Legacy Capital, gestora independente com R$ 20 bilhões sob gestão. Antes de montar sua própria gestora, foi diretor de tesouraria do Santander.

"A bolsa está em um preço justo. Quem diz que a bolsa está barata se baseia nos múltiplos históricos. Mas, analisando os principais setores da bolsa, muita coisa mudou desde os anos 2000," afirmou Guerra em entrevista ao programa Vozes do Mercado, da Exame Invest.

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O CIO argumenta que as maiores empresas do Ibovespa perderam vantagens competitivas ou reduziram seu potencial de crescimento, o que justificaria os múltiplos mais baixos.

Guerra acredita que a bolsa pode subir no curto prazo, dependendo dos estímulos chineses e das tensões no Oriente Médio. Contudo, a médio prazo, ele vê um grande obstáculo para a escalada do Ibovespa: o CDI. A expectativa da casa é que a taxa Selic,atualmente em 10,75%, suba para 13,5%.

"O Brasil está crescendo acima do seu potencial, o que indica uma dinâmica inflacionária. Os juros não estão sendo suficientes para desacelerar a economia. Há uma grande demanda por crédito e o mercado de trabalho está em suas mínimas. Esse cenário fará com que os juros permaneçam elevados por um bom tempo, para ancorar as expectativas de inflação e trazê-las de volta à meta."

O risco de o Banco Central não adotar um ciclo de alta de juros mais agressivo, segundo Guerra, é uma desancoragem ainda maior das expectativas de inflação. "Se a alta de juros for muito gradual, a inflação vai, aos poucos, divergir da meta. É necessário que o BC adote uma postura mais enérgica. Porém, o trabalho do BC é difícil, já que está dessincronizado com o fiscal."

Guerra destaca que o fiscal é uma das maiores preocupações, pois o aumento dos gastos públicos pressiona ainda mais os juros. "Há o risco de entrarmos em uma dinâmica semelhante à de 2013 e 2014 , quando o BC aumentava os juros, mas sempre ficava atrás da curva. O Brasil pode passar por um período de inflação e juros altos."

O CIO da Legacy também chama a atenção para a estratégia do governo de ajustar o fiscal pelo lado da receita. "Se o governo vai arrecadar, será em cima de quem está prosperando, ou seja, as maiores empresas, que estão na bolsa. A bolsa terá a concorrência do governo tentando taxar e do CDI subindo, pois precisará se manter alto por bastante tempo."

Diante desse cenário, Guerra vê melhores oportunidades na bolsa americana. Seu otimismo é baseado em cinco fatores: resiliência da economia americana, desinflação sincronizada em países desenvolvidos, afrouxamento monetário, crescimento dos lucros das empresas e estímulos da China.

Otimismo no exterior

"Se os EUA enfrentarem uma recessão, será leve e breve, talvez por um trimestre. No entanto, é um cenário mais arriscado, pois o mercado está mais equilibrado", afirmou. A estratégia da Legacy tem sido investir na bolsa americana e em títulos do Tesouro. Assim, se a queda na atividade econômica representar um risco para a bolsa americana, a expectativa de juros mais baixos nos EUA geraria ganhos nos títulos e vice-versa.

"Essa combinação não funciona bem quando a inflação está alta, mas quando caminha para a meta, costuma ser eficaz. Se houver uma recessão, haveria perdas na bolsa. Mas até que se saiba se haverá recessão ou não, essa combinação de ativos de risco e juros deve funcionar bem."

Guerra também está otimista com a bolsa chinesa, para a qual prevê novas altas, impulsionadas pela recente rodada de estímulos. "As pessoas estavam relutantes em investir na China, então há uma posição técnica muito 'limpa'. O cenário fundamental estava ruim, com muitos sinais de desaceleração e ações muito baratas."

O potencial de alta, pondera ele, dependerá do fator multiplicador dos estímulos fiscais. "Se o governo distribuir cheques para as famílias, o impacto no consumo e na confiança será significativo, o que pode resultar em uma alta expressiva na bolsa chinesa."

O que pode alterar esse cenário mais favorável no exterior, segundo Guerra, são as eleições americanas e as tensões no Oriente Médio. "Fora esses dois obstáculos, em uma visão de médio prazo, somos bastante positivos para ativos de risco, desde que acompanhados de alguma proteção, seja com a compra de volatilidade ou investimentos em juros."

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