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A "ação dourada" que pode travar a venda da Embraer

Papel de classe especial é herança do processo privatização da Embraer e dá ao governo poder de veto a decisões estratégicas

 (Marcos Issa/Bloomberg News/Bloomberg)

(Marcos Issa/Bloomberg News/Bloomberg)

Rita Azevedo

Rita Azevedo

Publicado em 22 de dezembro de 2017 às 18h12.

Última atualização em 22 de dezembro de 2017 às 18h31.

São Paulo -- A Bolsa balançou na última quinta-feira, após o norte-americano Wall Street Journal noticiar o interesse da Boeing pela EmbraerEm questão de horas, os papéis da fabricante de aeronaves brasileira passaram de pouco mais de 16 reais para a casa dos 21 reais. Na máxima do dia, as ações chegaram a subir 40%. Com o volume bem acima do usual, as negociações chegaram a ser bloqueadas em alguns momentos.

A informação foi confirmada pouco mais tarde pelas duas empresas. Por meio de fato relevante, Boeing e Embraer disseram que estudam uma possível associação, mas que “não há garantias de que qualquer transação resultará dessas discussões.”

Apesar da intenção das duas companhias, um detalhe pode travar a venda da Embraer. Trata-se da chamada golden share (ações de ouro ou ações douradas, em tradução livre do inglês), uma ação de classe especial que garante à União direitos direitos de caráter estratégico.

Nesta sexta-feira, o presidente Michel Temer foi enfático ao dizer que usará tal poder para barrar a transferência de controle da produtora de aeronaves. "Golden share serve para isso, para o governo tomar essa decisão”, afirmou Temer.

No mundo, as golden shares começaram a ser utilizadas na década de 1980 no Reino Unido, após uma crise de financiamento do Estado que fez com que companhias estatais fossem repassadas à iniciativa privada. Seu uso foi visto, na época, como uma maneira de privatizar as empresas, sem que para isso fosse necessário abrir mão do controle delas.

Em pouco tempo, o modelo passou a ser copiado por outros países, como o Brasil. Até hoje, o governo brasileiro mantém golden shares da Vale, do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB) e da Embraer. 

No caso da fabricante de aviões, a posse das ações permite que o governo interfira em qualquer decisão relativa à mudança de denominação da empresa e do objeto social, na criação ou alteração de programas militares, na transferência do controle acionário, entre outros pontos.

A adoção da golden share é polêmica. O próprio ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, encaminhou recentemente uma consulta ao Tribunal de Contas da União (TCU) para saber se é possível extinguir essa classe especial de papéis.

Na visão de Meirelles, segundo apurou o Valor Econômico, as golden shares não são bem vistas pelo mercado e acabam influenciando negativamente no valor das companhias.

"Elas são mal vistas porque, do ponto de vista da governança corporativa, a transparência e a igualdade entre acionistas ficam comprometidas", explica Marcos Piellusch, professor de finanças da Fundação Instituto de Administração (FIA).

Alternativa

Um dos motivos para a Boeing estar interessada na Embraer é a recente aquisição da Airbus, uma de suas principais concorrentes. Em outubro deste ano, a companhia europeia anunciou a compra da linha de jatos regionais (C-Series) da canadense Bombardier, que competem diretamente com os E-Jets da Embraer.

Sem a possibilidade de comprar o controle da Embraer, a Boeing poderá tentar outras alternativas -- que não esbarrem no governo brasileiro -- para não perder a briga contra a Airbus.

Para analistas da Coinvalores, uma possibilidade é que ela repita o modelo adotado pela própria Airbus e proponha a criação de uma joint venture específica para jatos menores, excluindo a produção de jatos militares.

"A golden share dá ao governo brasileiro também poder de veto em questões envolvendo os programas militares da Embraer, mas aparentemente não há nada que impeça um possível negócio como o que comentamos, envolvendo os E-jets", dizem em nota enviada a clientes.

Fabio Falkenburger, sócio do escritório de advocacia Machado Meyer também acredita que o governo pode não interferir em uma possível joint venture ou em algum outro negócio que não envolva a área militar.

"É até difícil avaliar se economicamente faz sentido o governo travar a entrada de um investidor como a Boeing que pode trazer uma série de benefícios para o país, como a transferência de tecnologia", diz ele. 

Independentemente do modelo adotado, a negociação também precisará ser avaliada pelos conselhos das duas empresas e pelos órgãos reguladores dos Estados Unidos e do Brasil. 

 

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