Criador da Ethereum diz que finanças descentralizadas não falharam no caso FTX
Vitalik Buterin criticou empresas com maior centralização no setor de criptoativos e fez balanço sobre mudanças com o "The Merge"
João Pedro Malar
Publicado em 12 de novembro de 2022 às 15h40.
Última atualização em 12 de novembro de 2022 às 15h47.
Vitalik Buterin, um dos criadores do blockchain Ethereum, falou sobre as consequências da falência da corretora de criptoativos FTX para o ecossistema, destacando que os projetos ligados às finanças descentralizadas ( DeFi, na sigla em inglês) não falharam mesmo diante dos efeitos negativos para todo o setor.
Buterin participou neste sábado, 12, do evento Labitconf em Buenos Aires, na Argentina. Durante sua fala, ele observou que o mais importante para o setor "não é perguntar se cripto foi um sucesso ou falhou, mas sim quais aplicações foram bem sucedidas e quais falharam".
Para ele, agentes centralizados dentro do mundo dos criptoativos, como a própria FTX, foram os que mais falharam com a crise.
Por outro lado, ele disse que "o bitcoin não falhou, o ether não falhou, a Solana não falhou, a Uniswap não falhou. Mesmo as plataformas de DeFi não falharam". Por isso, os grandes prejudicados pela crise foram as empresas de CeFi, finanças centralizadas, tanto nativas do ecossistema de criptoativos quanto fora dele.
"Alguns fundos, entre eles a Alameda Research, conseguiram empréstimos com CeFi, mas não com DeFi. O segmento de DeFi ganhou, as plataformas sobreviveram", destacou. O motivo para Buterin é que os empréstimos via DeFi levam em conta critérios mais objetivos e padronizados para conceder empréstimos, independentemente de "cor de pele ou roupa".
Buterin disse ainda que "a autocustódia ganhou", se referindo aos usuários que gerem seus próprios investimentos, sem o uso de uma exchange. "Muitas das pessoas que foram prejudicados pelo crash da FTX que não entraram em coisas malucas, só queriam um lugar para guardar suas moedas, e muitas pessoas precisam guardar as criptos em algum lugar".
Ele defendeu que "as soluções centralizadas não funcionaram, mas muitas pessoas usam plataformas centralizadas porque elas oferecem mais conveniências que a autocustódia: não precisa entender como algumas coisas funcionam, quais carteiras usar, lidar com muitas complexidades".
A crise, na visão do desenvolvedor, está ligada a uma "imagem de confiança" que o fundador da FTX, Sam Bankman-Fried, foi capaz de passar para atrair investidores e esconder os problemas pelos quais a empresa passava. "Vimos os limites desse modelo nesta semana", ressaltou.
Para ele, o caminho para o setor de DeFi é desenvolver opções de autocustódia que "funcionem melhor. O bitcoin e a Ethereum valorizam a autocustódia e transparência, e temos que melhorar para que essas opções virem as primeiras das pessoas. Espero que esse seja o lado que ganhe mais atenção nos próximos anos".
Especificamente para a Ethereum, Buterin observou que a rede se tornou deflacionária em meio à crise da FTX, com uma redução na oferta disponível da sua criptomoeda nativa, o ether. Isso demonstra, para o criador do blockchain, que após a atualização "The Merge" a Ethereum passou a ser "algo que se beneficia da desordem".
"Quando algo doido acontece, ocorre muita atividade na rede e isso faz com que o ether seja tirado de circulação", explicou Vitalik, se referindo ao fenômeno como um "efeito colateral estranho" da atualização que não era esperado por ele ou pelos responsáveis por atualizações do blockchain.
O criador da Ethereum se referiu ao caso como um "evento louco que acontece em um cenário louco. Os eventos da semana foram suficientes para queimar mais ethers do que foi emitido desde o The Merge. Foi fascinante ver esse efeito em ação".
Ethereum pós-"The Merge"
Vitalik Buterin também falou durante o evento sobre os primeiros meses de funcionamento da Ethereum depois do "The Merge", a mais importante atualização da rede até agora. Para o desenvolver, o evento acabou sendo "muito anticlimático" devido à falta de problemas.
"Eu acho que a falta de acontecimento foi algo que surpreendeu a todos. Todas as atualizações que tínhamos feito tinham algum tipo de bug, algum problema, uma parte da rede caindo, instabilidade. Quando veio o The Merge, nada ocorreu, tudo ocorreu de forma suave", avaliou.
Para ele, uma grande mudança com a atualização foi o ganho de velocidade para a integração de blocos com dados de transações à rede, chegando a 12 segundos para a integração do bloco e seis para o processamento de transações.
A atualização envolveu a passagem do sistema de prova de trabalho (proof-of-work) para a prova de participação (proof-of-stake), que segundo Buterin foi "uma oportunidade de implementar boas ideias com as melhores propriedades".
Ele acredita que as mudanças trouxeram um ganho na experiência dos usuários do blockchain, com uma padronização nos tempos de processamento e ganho de velocidade nas transações. O resultado, afirma, é uma "rede mais estável e mais segura".
Questionado sobre um possível aumento da centralização da Ethereum com a atualização - um dos principais pontos criticados no mercado - Buterin disse que houve uma descentralização pensando na quantidade de grupos de validadores, representando mais uma descentralização "interna".
"Há grandes agentes mas também há menores, e um dos maiores benefícios para descentralização é que resistente à censura, à habilidade da pessoa de comandar o próprio nó e determinar o que valida ou não. Na prática, eu acho que as coisas estão ok agora, mas podem melhorar, e vão melhorar quando for possível sacar o ether [depositado para se tornar um validador]", defendeu.
Buterin contou que o próximo passo nas atualizações da Ethereum, divididas em um calendário com outras cinco mudanças, é melhorar a capacidade de escolher validadores na rede e o quanto eles conseguem reivindicar como recompensa pela validação, mas sem aumentar o poder deles de escolher o que será validado ou não.
"Ainda temos um longo caminho antes de chegar a um caso de mais censura, mas não queremos nem estar perto de problemas de censura, e não estamos ainda. Existem coisas que podem ser feita para evitar chegar nesse lugar", ressaltou.
*O repórter João Pedro Malar viajou a Buenos Aires para a Labitconf a convite da exchange Bitso
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