Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro: Brasil está abaixo da média da América Latina nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (Wikimedia Commons/Wikimedia Commons)
Rodrigo Caetano
Publicado em 12 de março de 2020 às 06h00.
Última atualização em 12 de março de 2020 às 06h00.
Hoje, dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), metas criadas pela ONU para medir o avanço socioeconômico dos países, o Brasil atingiria apenas um: assegurar o acesso confiável à energia para todos.
Estabelecidos em 2015, os ODS são usados por países e empresas para definir projetos e políticas ambientais e de sustentabilidade. Entre as principais metas, que devem ser alcançadas em 2030, estão a de acabar com a pobreza, com a fome e assegurar uma vida saudável para todos.
O Brasil enfrenta desafios significativos em 10 objetivos, incluindo acabar com a fome e com a pobreza. Nos quesitos construir infraestruturas resilientes e fomentar a inovação, o desafio é permanente (veja quadro abaixo). “Estamos ficando para trás”, afirma Carlo Pereira, diretor executivo da Rede Brasil do Pacto Global, órgão das Nações Unidas responsável por disseminar os ODS entre as empresas. “Em 30% dos ODS, estamos abaixo da média da América Latina”.
Para mudar o quadro, a Rede Brasil desenvolveu uma nova estratégia de atuação, em parceria com a consultoria Falconi. O plano estabelece métricas e prioridades para as cerca de 900 empresas signatárias do pacto.
Segundo Viviane Martins, presidente da Falconi, o setor empresarial brasileiro enfrenta duas questões principais em relação aos ODS, uma de governança e outra de gestão. “Em se tratando de governança, há uma necessidade de sensibilização dos presidentes e da alta diretoria das empresas”, afirma. “Eles precisam entender que isso não é uma questão de marketing, mas sim de perenidade da companhia e de mitigação de riscos.”
Na gestão, Viviane afirma que as companhias brasileiras enfrentam algumas dificuldades. De início, há um problema de como incorporar os ODS na estratégia corporativa. “É comum enxergarem esse aspecto como uma questão departamental, apenas da área de responsabilidade social”, afirma. “Na verdade, os objetivos devem permear toda a organização e ser encarados não só como algo que gera benefícios para a sociedade, mas também retorno para as empresas”.
A estratégia elaborada pela Falconi estabelece cinco frentes de ação prioritárias: desenvolvimento de projetos com metas atreladas aos ODS, inserção dos objetivos nas estratégias de negócios das empresas, participação em fóruns de discussão e movimentos globais, ampliação de parcerias e atuação regionalizada e engajamento de pequenas e médias empresas das cadeias de valor das grandes companhias signatárias do Pacto.
Juntamente com a nova estratégia, foi lançada uma plataforma online para auxiliar as empresas a medirem seu desempenho com relação aos ODS, chamada de SDG Action Manager. O sistema, gratuito, indica riscos e oportunidades de negócio, além de propor metas para a construção de planos de ação. A plataforma foi desenvolvida em parceria com a B Lab, organização sem fins lucrativos que desenvolve certificações em sustentabilidade, criadora do Sistema B.
“Assumir compromissos práticos é importante”, afirma Carlos Takahashi, diretor-geral no Brasil da BlackRock, a maior gestora de recursos do mundo, com 6,9 trilhões de dólares em ativos. “No Brasil ainda precisamos de uma organização maior para que o cenário mude rapidamente. Não podemos mais ficar no movimento inercial, temos de sair do campo da vontade para o campo da prática”.
A BlackRock é uma das principais impulsionadoras dessa pauta no mundo. Desde 2012, o CEO da companhia, Larry Fink, escreve uma carta anual destinada ao mercado, na qual aborda, especialmente, o desenvolvimento sustentável.
Este ano, a carta de Fink, divulgada em janeiro, trouxe alguns compromissos que serão adotados pela própria gestora, como desinvestir em empresas que geram mais de 25% das suas receitas a partir da exploração do carvão. “Num futuro próximo, e mais cedo do que muitos preveem, haverá uma realocação significativa de capital”, escreveu Fink.
O fraco desempenho do Brasil em relação aos ODS também pode dificultar o investimento estrangeiro. Segundo Hugh Smith, diretor de investimentos ESG da Refinitiv, uma das principais provedoras de informações financeiras do mundo, há uma correlação entre os objetivos de desenvolvimento sustentável e os dados de ESG (sigla em inglês para meio ambiente, social e governança), que são usados por investidores para medir a sustentabilidade das companhias.
“Investidores de títulos soberanos com estratégias de longo prazo tendem a priorizar países que estão avançando com os ODS, mesmo que tenham economias mais fracas”, diz Smith. O executivo está no Brasil para o lançamento de uma plataforma da Refinitiv que integra dados ESG na avaliação de riscos das empresas.
Essa é uma demanda crescente dos investidores, segundo Smith. “Hoje falamos em investimentos ESG. No futuro, falaremos apenas em investimentos. As questões socioambientais serão integradas”, afirma. Em relação aos países, a tendência é de que esse tipo de dado seja incorporado ao cálculo do PIB. Um aumento das emissões de carbono, por exemplo, será descontado do crescimento econômico.
Para Carlo Pereira, da Rede Brasil do Pacto Global, a falta de evolução dos indicadores também aumenta os riscos de convulsão social, o que impacta a economia. “No mundo, tivemos 47 grandes mobilizações sociais em diferentes países. Para este ano, a previsão é de 75”, afirma. “Dá um frio na barriga”.
Hoje, o país atingiria apenas um dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável definidos pela ONU para 2030