Avenida Paulista. (Alexandre Schneider/Getty Images)
Ligia Tuon
Publicado em 6 de abril de 2020 às 12h47.
Última atualização em 6 de abril de 2020 às 16h12.
Diante dos impactos da pandemia do coronavírus na economia, o Santander Brasil revisou sua expectativa sobre o Produto Interno Bruto (PIB) de 2020 para uma queda de 2,2% ante uma alta de 1% calculada há três semanas.
O número faz parte do novo cenário-base do banco, que prevê um achatamento da curva de contágio pelo novo coronavírus no final de abril e uma retomada da atividade no fim de julho. Se esse movimento de concretizar, em 2021, o PIB pode crescer 1,7%, segundo a instituição.
"Dada a esperada perda de demanda e de capacidade produtiva da economia, não teremos recuperação em V (na qual a retomada é tão rápida quanto a queda), mas em U, ou seja, gradual ao longo dos próximos anos. Mas, nesse cenário base, chegamos no fim de 2021 praticamente no nível do pré-crise (do coronavírus)", disse Ana Paula Vescovi, economista do Santander em teleconferência com jornalistas, nesta segunda-feira, 6.
A queda da demanda no mundo vem se acelerando nos últimos meses na medida que a doença se espalha, fazendo com que os países tentem cobrir a lacuna temporária na atividade com políticas fiscal e monetária. As medidas de proteção, que também são vistas no Brasil, podem evitar uma possível quebradeira de empresas e demissões em massa.
O Brasil contabiliza mais de 11 mil casos confirmados de Covid-19 e 486 mortes pela doença. Em 31 de março, há uma semana, portanto, registrava 4.256 casos e 136 mortes.
O comportamento das estatísticas aqui é muito semelhante ao da Coreia do Sul, destaca o Santander no relatório, mas o número de casos cresce a uma taxa ligeiramente mais alta e sem a escala de testagem vista na Coreia do Sul.
"De acordo com epidemiologistas das principais universidades do mundo, espera-se que os casos no Brasil dobrem a cada 5,2 dias. Com essa informação, o número de casos nos próximos 10 dias pode atingir de 17 mil a 25 mil. Esta é a razão pela qual ações para conter a propagação e expansão do vírus, de hospitais disponíveis e de camas são tão importantes", escreve o banco.
As incertezas levaram o Santander a analisar outros cenários de curto prazo, e variações negativas em relação ao cenário-base são mais prováveis do que as positivas.
Num cenário negativo extremo, que considera o recuo da curva de contágios e da política de isolamento no fim de junho, o PIB de 2020 pode recuar 6%, segundo Vescovi, com recuperação de 2,8% em 2021.
A chance do cenário se deteriorar a esse ponto é de uma em quatro, segundo Vescovi. Já um cenário mais positivo, com a política de confinamento terminando no meio de abril, tem apenas 5% de chance de acontecer, segundo o cálculo.
"Só vemos a saída plena da crise, ainda que com atividade parcialmente recuperada, quando houver segurança em relação ao contágio: ou com imunização de fato, que seria com vacina, ou da forma natural, na qual o vírus começa a encontrar barreiras para se espalhar, dado o grau de imunização da população", explica Vescovi.
O arrefecimento da crise se refletirá também, segundo a economista, no tempo médio que doentes pela Covid-19 em estado crítico fiquem nos leitos de UTI. Hoje, esse tempo médio é de duas semanas. A capacidade hospitalar pode dobrar caso esse período seja reduzido pela metade.
O aumento no número de casos de Covid-19 no Brasil levou a uma nova onda de cortes nas previsões para o PIB de 2020.
O Bank of America (Bofa), por exemplo, anunciou na semana passada que passou a ver contração de 3,5% no PIB de 2020.
O banco destaca que, entre os países da América Latina, o Brasil é um dos mais sensíveis ao preço das commodities (em queda há meses, acompanhando a retração forte na demanda global) e ao mercado chinês, maior parceiro comercial brasileiro. Essa previsão também incorpora o forte impacto no consumo e no investimento, em função da paralisação parcial das atividades no país.
O Bofa cita ainda que a falta de uma resposta política eficaz para controlar a propagação do vírus nos mercados desenvolvidos e em alguns mercados emergentes levou a instituição a reduzir sua previsão para o crescimento do PIB global em 2020 de 0,3% para uma queda de 2,7%.
“Essa deve ser uma recessão consideravelmente pior do que a de 2008/09. Tanto os formuladores de políticas quanto o público em muitas economias não aprenderam a lição da China: a política mais eficaz é um bloqueio rápido e rigoroso”, diz o Bofa em relatório.
Nesta sexta-feira, 3, o banco UBS também divulgou uma revisão da expectativa para a economia brasileira em 2020, que foi de um crescimento de 0,5% para um recuo de 2%. “Um primeiro semestre ruim e uma recuperação possivelmente tímida nos levam à essa revisão”, disse em relatório.
O UBS espera que o Brasil entre em recessão técnica já no segundo trimestre, por conta das restrições no varejo, após apresentar duas quedas seguidas no PIB trimestral, uma de 3,6% e outra de 20%.
Dados da atividade no início de março já apontam para esse resultado, diz o banco, que cita o tombo recorde dos serviços no período. A atividade no setor sofreu a maior queda desde o início da pesquisa, 13 anos atrás. O movimento é atribuído quase que exclusivamente ao fechamento de empresas e à redução da demanda do consumidor devido às medidas adotadas para contenção do coronavírus..
O UBS também cita as vendas de automóveis do mês que, até agora, já caíram 32% em relação a fevereiro.
“Por enquanto, ainda esperamos que o segundo semestre apresente números melhores, com alta de 17% no PIB no terceiro trimestre e de 5% nos últimos três meses do ano”, diz o banco.
Mas o Brasil só deve voltar a alcançar o nível de atividade do quarto trimestre de 2019 em 2021, para quando o UBS espera um PIB 3% maior, ante alta de 4,9% prevista anteriormente.
“Este cenário pressupõe que as formas mais graves de distanciamento social comecem a terminar em maio. A extensão além de maio provavelmente levará a um crescimento abaixo do previsto”, diz em relatório.
A mediana das previsões de economistas reunidas pelo BC ainda não acompanha a sensação de instituições e autoridades públicas. Há duas semanas, o secretário da Fazenda e Planejamento do estado de São Paulo, Henrique Meirelles falou à Exame que seus cálculos já apontam para a contração de 3% do Brasil no ano, mas com perspectiva de retomada no segundo semestre.
A última atualização nos cálculos do governo federal foi divulgada no dia 20 de março, quando a equipe econômica disse que espera um crescimento do PIB de 0,02% neste ano.