Alberto Fernández: "Tenho um problemão, e vou pedir 11 bilhões a mais?!", questionou o presidente eleito (Ricardo Moraes/Reuters)
AFP
Publicado em 26 de novembro de 2019 às 19h46.
Última atualização em 26 de novembro de 2019 às 19h48.
O presidente eleito da Argentina, Alberto Fernández, anunciou nesta terça-feira (26) que desistirá de receber cerca de 11 bilhões de dólares de um crédito de 57 bilhões concedido pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
"O que eu quero é deixar de pedir e que me deixem pagar", disse Fernández, que substituirá o atual presidente, Mauricio Macri, em 10 de dezembro.
"Tenho um problemão, e vou pedir 11 bilhões a mais?!", questionou na Rádio Con Vos.
Fernández, que vai conduzir o governo com a ex-presidente Cristina Kirchner como vice, disse que tentará "reativar a economia para poder pagar e resolver o problema da dívida com sensatez".
"Queremos que não nos emprestem mais grana, mas que deixem nos desenvolvermos. Vamos discutir o tempo que preciso para poder me desenvolver, mas não me dê mais dinheiro", afirmou.
A linha de crédito obtida pela Argentina é a maior que o FMI já concedeu.
Questionado pela AFP, um porta-voz da entidade em Washington se recusou a comentar.
A economia argentina atravessa 20 meses de recessão, e Macri teve que anunciar uma renegociação de títulos de dívida no meio do ano. Segundo o FMI, a atividade econômica cairá 3,1% este ano.
"É como um cara que bebeu muito e está um pouco bêbado. A solução não é continuar bebendo. A solução é parar de beber", disse o novo presidente.
A dívida cresceu cerca de 100 bilhões de dólares no governo liberal de Macri e agora ultrapassa 90% do Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com organizações internacionais.
Quando assumiu em 2015, o endividamento era de 38% do PIB. "Eu tento ser uma pessoa séria", disse Fernández. "Não quero assinar acordos que não vamos cumprir. Esses acordos já foram assinados por Macri. Ele assinou um, dois, três e não cumpriu nenhum", acrescentou.
O FMI suspendeu o desembolso de uma parcela de cerca de US$ 5,4 bilhões em setembro. Assim, o dinheiro estava pendente, após o fracasso do governo em cumprir as metas de inflação, entre outros.
Com essa política, Fernández segue os passos do ex-presidente Nestor Kirchner (2003-2007), de quem era chefe de gabinete. Kirchner disse que "os mortos não pagam dívidas" e refinanciou 76% da dívida que estava em moratória desde a grande crise de 2001.
Com o intuito de o FMI não intervir mais com suas recomendações nas políticas do país sul-americano, Nestor Kirchner quitou toda a dívida com a entidade em 2006, pagando US$ 9,5 bilhões.
Fernández não poderá fazer o mesmo por causa do grande volume dos empréstimos ao governo Macri, de mais de 45 bilhões de dólares.
Fernández disse que a Argentina honrará sua dívida com o FMI e credores privados. Mas, em conversa com a diretora-gerente, Kristalina Georgieva, disse a ela que não poderá pagar se o país não crescer, nem aplicará mais planos de austeridade.
"Não podemos fazer mais ajustes fiscais porque a situação é de enorme complexidade, o nível de ajustes na era Macri tem sido tremendo", tinha dito em sua conversa por telefone.
O FMI afirmou em comunicado que manterá o diálogo com a Argentina e apoiará sua intenção de reduzir a pobreza, que disparou nos últimos quatro anos e hoje afeta um terço dos argentinos. Consultores privados estimam que a pobreza chegará a 40% até o final do ano.
Fernández, aliado dos peronistas de centro-esquerda e centro-direita, superou Macri nas eleições em que tentava se reegeler à frente de uma aliança de direitistas com social-democratas.
A inflação anual até outubro foi de 42,2% e as organizações internacionais estimam que superará os 50% no fim do ano.