Famílias que sofrem a perda de salários cortam gastos ou adiam compras
Repórter colaborador
Publicado em 10 de setembro de 2024 às 07h16.
A deflação que persegue a China desde o ano passado agora está mostrando sinais de espiral, ameaçando piorar as perspectivas para a segunda maior economia do mundo e gerando preocupação entre investidores. Para alguns, Pequim deve ter ações políticas mais efetivas para resolver a questão.
Dados divulgados na segunda-feira confirmaram que, além dos custos dos alimentos, a subida dos preços ao consumidor mal foi registrada em grandes setores da economia, num momento em que as rendas estão caindo.
Um indicador da Bloomberg Economics aponta a que a queda nos preços deve se estender dos cinco trimestres atuais para até o ano que vem. Isso equivaleria à maior sequência de deflação da China desde que os dados começaram a ser compilados, em 1993.
O perigo para a China é que a deflação pode crescer como uma bola de neve, encorajando as famílias que estão se recuperando da queda dos salários a cortar gastos ou adiar compras porque esperam que os preços caiam ainda mais. Com isso, as receitas das empresas sofrerão, sufocando o investimento e levando a mais cortes salariais e demissões, levando famílias e empresas à falência, numa espiral péssima para o PIB como um todo.
Pesquisas mostram que isso já está começando a acontecer. Em setores da economia favorecidos pelo governo — como fabricação de veículos elétricos e energias renováveis —, os salários para quem está entrando no mercado de trabalho caíram quase 10% em agosto em relação ao pico em 2022.
Esse é um ciclo que o mundo já viu antes no Japão, começando na década de 1990, durante um período que veio a ser conhecido como suas "décadas perdidas" — quando uma estagnação esmagadora seguiu uma bolha nos mercados imobiliário e financeiro.
Embora as autoridades chinesas tenham tentado sufocar a discussão sobre deflação, alertando analistas para evitar o uso do termo, ele está começando a entrar na discussão pública. O ex-presidente do banco central Yi Gang disse na semana passada que erradicar a deflação tem que ser prioridade para os formuladores de políticas, uma rara admissão de uma figura proeminente na China de que a queda dos preços está ameaçando as perspectivas de crescimento.
Em um sinal de que as pressões de preços estão se tornando ainda mais moderadas, a inflação básica da China — que exclui itens voláteis como alimentos e energia — esfriou em agosto para o nível mais fraco em mais de três anos. As expectativas de deflação estão se espalhando pelos mercados, alimentando uma alta de títulos que levou os rendimentos a mínimas recordes e alimentou preocupações oficiais de que os bancos ficaram muito expostos aos riscos das taxas de juros.
As fracas pressões de preços são evidentes no ritmo de crescimento do PIB nominal da China, que se expandiu apenas 4% no segundo trimestre — bem abaixo da meta de crescimento econômico real do país de cerca de 5% este ano.
A inflação foi mais fraca do que o previsto em três dos últimos quatro meses, crescendo apenas 0,6% em agosto — um aumento devido em grande parte a uma recuperação de 2,8% nos preços dos alimentos. A inflação básica no mês passado subiu apenas 0,3%, para permanecer abaixo de 1% pelo 18º mês seguido.