“Política fiscal está errada”, diz Gustavo Franco
Para o ex-presidente do Banco Central, a inflação não cai no Brasil por causa da forma como a política fiscal é conduzida
Da Redação
Publicado em 8 de novembro de 2013 às 15h22.
São Paulo – Para Gustavo Franco, a inflação não cai no Brasil por causa da condução da política fiscal . A política fiscal está errada, segundo o ex-presidente do Banco Central (entre agosto de 1997 e janeiro de 1999, no governo de Fernando Henrique Cardoso). “Não sei de onde veio a teoria de que a situação fiscal brasileira era boa. Nesse momento começaram a liberar demais a despesa e a situação, que não era boa, ficou ruim”, afirmou.
Para o economista, que é filiado ao PSDB, com a Dilma, o governo do PT assumiu uma identidade mais próxima do que foram os ideais teóricos do próprio partido. “O governo Lula, em política macroeconômica parecia-se mais com o governo FHC e agora as diferenças se acentuaram, num momento em que a economia começa a piorar”, disse.
No final do ano, o estrategista-chefe da Rio Bravo e um de seus sócios fundadores lançou o livro “As Leis Secretas da Economia”, para, com 74 leis, mostrar que a economia brasileira obedece a leis próprias.
EXAME.com - Algumas “leis” do livro falam sobre previsões e expectativas que acabam não se concretizando. Recentemente, isso aconteceu com a projeção do crescimento do PIB. O que significa esse desacerto?
Gustavo Franco - O desacerto nas previsões é inevitável porque, como digo no livro, é a “lei de Malan”: o futuro tem por ofício ser incerto, e eu diria que o passado, às vezes, também. Diante dessa incerteza estrutural da economia, qualquer previsão sempre está fadada ao erro, o melhor que você faz é jamais trabalhar com previsão. A economia é um exercício coletivo e comportamentos das coletividades têm por natureza serem incertos. O que fez o atual ministro da Fazenda [Guido Mantega] foi mais a fixação de uma meta para si que uma previsão, embora não tenha apresentado dessa forma, o que teria sido mais prudente. Ele fala o número e vira previsão, é um pequeno erro que se transforma depois em uma coisa cara para ele. Mas foi uma meta frustrada, ele trabalhou para um crescimento maior e falhou. É até pior. Ficaria menos ruim se fosse anunciado dessa forma [como uma meta pessoal]. A previsão, na verdade, pressupõe uma capacidade que as pessoas não tem, ela é, em si, um ato presunçoso. É mais humilde ter uma meta.
EXAME.com - Em junho, a inflação acumulada em 12 meses poderá ultrapassar novamente o teto da meta. Porque o Brasil não consegue baixar a inflação?
Gustavo Franco - Porque a política fiscal está errada, é muito simples. Nos vínhamos com uma política fiscal no limite do que era estabelecido, com superávit primário de 3%, que dava um déficit administrável. Tínhamos uma situação precária que estava sob controle e foi essa a situação herdada pela administração do PT. As metas fiscais não foram modificadas nos primeiros anos. Não sei de onde veio a teoria de que a situação fiscal brasileira era boa, nesse momento começaram a liberar demais a despesa e a situação, que não era boa, ficou ruim. O que é mais doído é perceber que as autoridades fizeram de propósito, acreditando no que estavam fazendo, aumentaram os gastos públicos, pioraram o déficit público, achando que isso era bom para a economia. Foi um erro e agora estamos pagando – com a possibilidade de downgrade, inclusive.
EXAME.com - Qual pode ser o impacto de um rebaixamento do rating do Brasil?
Gustavo Franco - Piora tudo. A percepção de uma piora ampla é captada muito na retórica dos empresários, que falam muito em perda de confiança, de credibilidade e nada anda, a economia de mercado depende de confiança. Se você está inseguro, sobretudo em razão de políticas de governo que são erráticas ou erradas mesmo, nada anda, estamos com o país praticamente parado. O PIB não anda, economia não cresce, isso com a economia em pleno emprego, sofremos um período de expectativas deterioradas.
EXAME.com - Uma das leis apresentadas no livro fala que “a inflação machuca (aleija), mas o balanço de pagamentos mata”, como ela pode ser entendida hoje?
Gustavo Franco - A lei reflete um pensamento de que como os problemas causados pela inflação estão dentro de casa, você sempre pode empurrar com a barriga, mas o da balança de pagamentos não dá para empurrar com a barriga. Esse é o sentido da lei. Ficou pior hoje em dia, você não consegue mais empurrar com a barriga o doméstico. É verdade que a balança de pagamentos mata, talvez seja verdade que a inflação também mata.
EXAME.com - O Brasil tem que escolher entre desemprego baixo e inflação baixa?
Gustavo Franco - Não, de jeito nenhum, esse é o tipo de discussão que havia lá atrás. Essa é uma discussão que ficou para trás, suposta escolha entre estabilidade ou crescimento, não existe isso, você pode ter as duas coisas, é só fazer as coisas certas. É a política fiscal que está errada, a gastança está descontrolada, politizada, sem lógica e fora de proporção.
EXAME.com - Nessa semana, o Ministro da Fazenda falou que o investimento, que cresceu no primeiro trimestre, terá expansão de até 7% esse ano. O Brasil tem condições de ter esse crescimento?
Gustavo Franco - Não. O nível de investimentos ainda é muito baixo, ridiculamente baixo. O Brasil é um país de baixo investimento há muitos anos, esse crescimento de agora não quer dizer nada, teríamos que crescer por muitos anos para o Brasil ter crescimento consistente. Não creio que isso vai acontecer em um futuro próximo porque vivemos um momento de falta de confiança todo o mundo empresarial fala isso. Não é o momento de esperar grandes iniciativas empresariais de expansão de capacidade. Mas entendo que o governo festeje a estatística do primeiro trimestre.
EXAME.com - Como o Brasil pode impulsionar os investimentos e a produtividade?
Gustavo Franco - Isso é um assunto muito vasto e que começa com uma mudança de filosofia. O mundo empresarial gostaria de ver políticas públicas de várias naturezas, todas voltadas para uma economia de mercado e que não é bem o que temos visto nos últimos anos. Temos visto maior intervencionismo, que causa insegurança no mundo empresarial e não adianta brigar contra isso, isso é como o mundo funciona. Com mais intervencionismo o setor privado se amedronta.
EXAME.com - Como teria sido o crescimento econômico em 2012 sem as intervenções?
Gustavo Franco - 2012, seguramente, teria sido melhor sem as medidas de intervenção. Com exceção das medidas intervencionistas feitas no calor da crise de 2008, que eram semelhantes talvez as que os Estados Unidos fizeram, todo o resto das medidas intervencionistas terminou sendo de pouca efetividade ou tendo o funcionamento contrário. O nível de investimento no Brasil está mais ou menos parado há vários anos, em torno de 18%/19% do PIB e nesse intervalo o BNDES triplicou de tamanho. Como o BNDES triplica e o investimento fica igual?
EXAME.com - Se as eleições fossem hoje, qual seria o foco do debate econômico?
Gustavo Franco - Acho que os debates terão esses assuntos, como fazer o investimento acordar, se engajar no modelo de crescimento e é um debate interessante. Acho que o governo do PT assumiu uma identidade mais próxima do que foram os ideais teóricos do PT, o governo Lula, em política macroeconômica parecia-se mais com o governo FHC e agora as diferenças se acentuaram, num momento em que a economia começa a piorar. Tem muita convergência de opinião sobre como conduzir as coisas, é ótimo que o governo reduza a taxa de juros e isso todo mundo quer. Todo mundo quer a mesma coisa, a questão é o modo de fazer e o bom é ter um debate do modo de fazer.
São Paulo – Para Gustavo Franco, a inflação não cai no Brasil por causa da condução da política fiscal . A política fiscal está errada, segundo o ex-presidente do Banco Central (entre agosto de 1997 e janeiro de 1999, no governo de Fernando Henrique Cardoso). “Não sei de onde veio a teoria de que a situação fiscal brasileira era boa. Nesse momento começaram a liberar demais a despesa e a situação, que não era boa, ficou ruim”, afirmou.
Para o economista, que é filiado ao PSDB, com a Dilma, o governo do PT assumiu uma identidade mais próxima do que foram os ideais teóricos do próprio partido. “O governo Lula, em política macroeconômica parecia-se mais com o governo FHC e agora as diferenças se acentuaram, num momento em que a economia começa a piorar”, disse.
No final do ano, o estrategista-chefe da Rio Bravo e um de seus sócios fundadores lançou o livro “As Leis Secretas da Economia”, para, com 74 leis, mostrar que a economia brasileira obedece a leis próprias.
EXAME.com - Algumas “leis” do livro falam sobre previsões e expectativas que acabam não se concretizando. Recentemente, isso aconteceu com a projeção do crescimento do PIB. O que significa esse desacerto?
Gustavo Franco - O desacerto nas previsões é inevitável porque, como digo no livro, é a “lei de Malan”: o futuro tem por ofício ser incerto, e eu diria que o passado, às vezes, também. Diante dessa incerteza estrutural da economia, qualquer previsão sempre está fadada ao erro, o melhor que você faz é jamais trabalhar com previsão. A economia é um exercício coletivo e comportamentos das coletividades têm por natureza serem incertos. O que fez o atual ministro da Fazenda [Guido Mantega] foi mais a fixação de uma meta para si que uma previsão, embora não tenha apresentado dessa forma, o que teria sido mais prudente. Ele fala o número e vira previsão, é um pequeno erro que se transforma depois em uma coisa cara para ele. Mas foi uma meta frustrada, ele trabalhou para um crescimento maior e falhou. É até pior. Ficaria menos ruim se fosse anunciado dessa forma [como uma meta pessoal]. A previsão, na verdade, pressupõe uma capacidade que as pessoas não tem, ela é, em si, um ato presunçoso. É mais humilde ter uma meta.
EXAME.com - Em junho, a inflação acumulada em 12 meses poderá ultrapassar novamente o teto da meta. Porque o Brasil não consegue baixar a inflação?
Gustavo Franco - Porque a política fiscal está errada, é muito simples. Nos vínhamos com uma política fiscal no limite do que era estabelecido, com superávit primário de 3%, que dava um déficit administrável. Tínhamos uma situação precária que estava sob controle e foi essa a situação herdada pela administração do PT. As metas fiscais não foram modificadas nos primeiros anos. Não sei de onde veio a teoria de que a situação fiscal brasileira era boa, nesse momento começaram a liberar demais a despesa e a situação, que não era boa, ficou ruim. O que é mais doído é perceber que as autoridades fizeram de propósito, acreditando no que estavam fazendo, aumentaram os gastos públicos, pioraram o déficit público, achando que isso era bom para a economia. Foi um erro e agora estamos pagando – com a possibilidade de downgrade, inclusive.
EXAME.com - Qual pode ser o impacto de um rebaixamento do rating do Brasil?
Gustavo Franco - Piora tudo. A percepção de uma piora ampla é captada muito na retórica dos empresários, que falam muito em perda de confiança, de credibilidade e nada anda, a economia de mercado depende de confiança. Se você está inseguro, sobretudo em razão de políticas de governo que são erráticas ou erradas mesmo, nada anda, estamos com o país praticamente parado. O PIB não anda, economia não cresce, isso com a economia em pleno emprego, sofremos um período de expectativas deterioradas.
EXAME.com - Uma das leis apresentadas no livro fala que “a inflação machuca (aleija), mas o balanço de pagamentos mata”, como ela pode ser entendida hoje?
Gustavo Franco - A lei reflete um pensamento de que como os problemas causados pela inflação estão dentro de casa, você sempre pode empurrar com a barriga, mas o da balança de pagamentos não dá para empurrar com a barriga. Esse é o sentido da lei. Ficou pior hoje em dia, você não consegue mais empurrar com a barriga o doméstico. É verdade que a balança de pagamentos mata, talvez seja verdade que a inflação também mata.
EXAME.com - O Brasil tem que escolher entre desemprego baixo e inflação baixa?
Gustavo Franco - Não, de jeito nenhum, esse é o tipo de discussão que havia lá atrás. Essa é uma discussão que ficou para trás, suposta escolha entre estabilidade ou crescimento, não existe isso, você pode ter as duas coisas, é só fazer as coisas certas. É a política fiscal que está errada, a gastança está descontrolada, politizada, sem lógica e fora de proporção.
EXAME.com - Nessa semana, o Ministro da Fazenda falou que o investimento, que cresceu no primeiro trimestre, terá expansão de até 7% esse ano. O Brasil tem condições de ter esse crescimento?
Gustavo Franco - Não. O nível de investimentos ainda é muito baixo, ridiculamente baixo. O Brasil é um país de baixo investimento há muitos anos, esse crescimento de agora não quer dizer nada, teríamos que crescer por muitos anos para o Brasil ter crescimento consistente. Não creio que isso vai acontecer em um futuro próximo porque vivemos um momento de falta de confiança todo o mundo empresarial fala isso. Não é o momento de esperar grandes iniciativas empresariais de expansão de capacidade. Mas entendo que o governo festeje a estatística do primeiro trimestre.
EXAME.com - Como o Brasil pode impulsionar os investimentos e a produtividade?
Gustavo Franco - Isso é um assunto muito vasto e que começa com uma mudança de filosofia. O mundo empresarial gostaria de ver políticas públicas de várias naturezas, todas voltadas para uma economia de mercado e que não é bem o que temos visto nos últimos anos. Temos visto maior intervencionismo, que causa insegurança no mundo empresarial e não adianta brigar contra isso, isso é como o mundo funciona. Com mais intervencionismo o setor privado se amedronta.
EXAME.com - Como teria sido o crescimento econômico em 2012 sem as intervenções?
Gustavo Franco - 2012, seguramente, teria sido melhor sem as medidas de intervenção. Com exceção das medidas intervencionistas feitas no calor da crise de 2008, que eram semelhantes talvez as que os Estados Unidos fizeram, todo o resto das medidas intervencionistas terminou sendo de pouca efetividade ou tendo o funcionamento contrário. O nível de investimento no Brasil está mais ou menos parado há vários anos, em torno de 18%/19% do PIB e nesse intervalo o BNDES triplicou de tamanho. Como o BNDES triplica e o investimento fica igual?
EXAME.com - Se as eleições fossem hoje, qual seria o foco do debate econômico?
Gustavo Franco - Acho que os debates terão esses assuntos, como fazer o investimento acordar, se engajar no modelo de crescimento e é um debate interessante. Acho que o governo do PT assumiu uma identidade mais próxima do que foram os ideais teóricos do PT, o governo Lula, em política macroeconômica parecia-se mais com o governo FHC e agora as diferenças se acentuaram, num momento em que a economia começa a piorar. Tem muita convergência de opinião sobre como conduzir as coisas, é ótimo que o governo reduza a taxa de juros e isso todo mundo quer. Todo mundo quer a mesma coisa, a questão é o modo de fazer e o bom é ter um debate do modo de fazer.