Plano Real, 30 anos: Gustavo Franco e o combate à doença da hiperinflação
Principal desafio da equipe que criou o Plano Real, segundo o economista, era controlar as expectativas políticas e da sociedade de que o problema da inflação não teria uma solução mágica ou simples
Repórter especial de Macroeconomia
Publicado em 28 de junho de 2024 às 06h01.
Última atualização em 3 de julho de 2024 às 09h39.
Gustavo Franco retornou ao Brasil em 1986, após concluir o doutorado em Economia na Universidade Harvard, com uma tese que analisava as hiperinflações nos Estados Unidos. O trabalho permitiu a ele uma visão privilegiada sobre como o dragão inflacionário era um problema que assolava, sobretudo, os mais pobres e como era possível domar essa besta que atormentava o país.
“Todas as hiperinflações experimentam muita volatilidade. Temos casos de cinco meses seguidos de inflação de até 100% ao mês e, de repente, essa taxa cai. Há muita influência de fatores como a taxa de câmbio, em casos de guerra ou revolução. Isso fazia o caso brasileiro meio singular porque não tinha nada parecido com uma guerra. Mesmo nos casos latino-americanos da mesma época, Peru e Bolívia tinham confusões políticas sérias”, afirmou.
A hiperinflação brasileira, disse Franco, começa a ficar grande, exatamente, na Nova República, com a democracia. O governo militar termina com uma inflação na faixa de 150% ao ano. E vamos de 150% ao ano para 82% ao mês — que anualizada, seria mais de 11.000% ao ano —, no último mês da presidência de José Sarney.
Plano Real não foi uma bala de prata
E o principal desafio da equipe que criou o Plano Real era controlar as expectativas políticas e da sociedade de que o problema não teria uma solução mágica ou simples.
“O primeiro desafio era reconhecer que uma inflação desse tamanho indica uma infecção muito grande. Não é virar uma chave e tudo está consertado. Não é um erro de conta ou uma coisa pequena. Estávamos doentes como país e precisávamos pensar em um tratamento que seria amplo e demoraria anos. Doenças sérias não são curadas com uma pílula, bala de prata ou fórmula mágica”, disse.
Segundo Franco, o Plano Real acertou no diagnóstico e ao controlar as expectativas políticas e da sociedade, com um programa transparente e bem detalhado para a população.
"Quando você fala em um Plano Real, ele é quase tudo. A reforma das reformas. Mas ele tem capítulos. O capítulo da reforma monetária, da política monetária e tem outras reformas. Agora, com 30 anos, é fácil enxergar os períodos de cada ciclo" — Gustavo Franco
Plano Real, 30 anos — série documental
Franco foi entrevistada para a série documental "Plano Real, 30 anos", um projeto audiovisual da EXAME que ouviu alguns dos principais economistas, executivos e banqueiros do Brasil.
Entre os entrevistados estão:
- Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central e fundador e chairman da Gávea Investimentos
- Carlos Vieira, presidente da Caixa
- Carolina Barros, diretora de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta do Banco Central
- Edmar Bacha, economista e sócio-fundador e diretor da Casa das Garças
- Elena Landau, ex-diretora do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e ex-presidente do Conselho de Administração da Eletrobras
- Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central e sócio-fundador da Rio Bravo
- Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central e sócio da Tendências Consultoria
- Henrique Meirelles, ex-presidente do Banco Central e conselheiro do Banco Master
- Jorge Gerdau, empresário e presidente do Conselho Superior do Movimento Brasil Competitivo (MBC)
- Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente do Conselho de Administração do Bradesco
- Marcelo Noronha, CEO do Bradesco
- Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda
- Pedro Parente, ex-ministro da Casa Civil e sócio da eB Capital
- Persio Arida, ex-presidente do Banco Central e do BNDES
- Orly Machado, fundador e presidente da C&M Software
- Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central
- Roberto Sallouti, CEO do BTG Pactual (do mesmo grupo de controle da EXAME)