Vitrine de uma loja em Nova York: a farra turística do Brasil, que durou dez anos, está acabando (Andrew Burton/AFP)
Da Redação
Publicado em 24 de março de 2015 às 22h09.
Os efeitos da desvalorização da moeda brasileira são facilmente perceptíveis nas ruas de Nova York.
Ao sair da loja B&H EM Manhattan no fim de semana passado, a Tábata Bandez disse que estava acompanhando com nervosismo a queda do real pelo telefone e que desistiu dos planos de comprar um computador para levar para o Rio de Janeiro.
Alguns dias antes, a família Gaião tirava muitas fotos em frente ao Rockefeller Center, mas comprava pouco.
Na Apple Store da Quinta Avenida, Cláudia Tavares decidiu consertar o iPhone do enteado, ao invés de obter o modelo mais novo.
“Dessa vez precisa fazer a conversão e ver se vale a pena”, disse Tavares, 51, que mora em Santos, enquanto esperava na fila. No dia seguinte à chegada para uma estadia de 10 dias, ela e uma amiga, que estão se hospedando com as filhas em um flat, pois os hotéis eram caros demais, foram A Target para comprar alimentos e algumas “tranqueiras”.
Essa era uma das poucas compras que elas planejavam fazer, disse ela.
A farra turística do Brasil, que durou dez anos, está acabando.
Mesmo antes de o real ter caído outros 15 por cento em relação ao dólar neste ano — parte de uma desvalorização de 36 por cento em dois anos que levou a moeda ao seu menor valor em 12 anos na semana passada —, os brasileiros já estavam diminuindo os gastos em viagens ao exterior.
No quarto trimestre, eles gastaram 8 por cento menos do que no ano anterior, a maior queda trimestral desde 2009.
Viagem paga
É possível que mais quedas estejam por vir.
O Goldman Sachs Group Inc. prevê que o real poderia cair outros 10 por cento nos próximos 12 meses e o Standard Chartered Bank diz que a moeda poderia despencar outros 15 por cento até o fim do ano enquanto a presidente Dilma Rousseff está lutando para sustentar a cambaleante economia e ganhar de volta a confiança dos investidores nas finanças de seu governo, ao mesmo tempo em que tenta acalmar os protestos que eclodiram nas ruas devido a um escândalo de corrupção cada vez mais abrangente.
A velocidade em que o real despencou pegou de surpresa alguns turistas. Tavares comprou dólares a R$ 3,10 poucos dias depois de sua amiga, Maria Ester de Barros, ter pago R$ 2,99.
O real, que chegou até a R$ 3,31 por dólar na sexta-feira, estava cerca de 15 por cento mais forte quando elas reservaram as passagens de avião.
“A viagem estava paga, então viemos”, disse Barros. “Mas não para comprar”.
Exceção?
Os brasileiros, é claro, não são os únicos estrangeiros a descobrir que, de repente, têm menos poder aquisitivo nos EUA.
O dólar está disparando em relação à maioria das moedas do mundo, como resultado do plano do federal reserve, banco central norte-americano, para começar a aumentar as taxas de juros neste ano.
A coroa dinamarquesa, o euro, a coroa sueca e o dólar canadense perderam mais de 7 por cento frente à moeda americana.
O Bloomberg Dollar Spot Index, que acompanha o dólar na comparação com 10 moedas de importância, subiu 4,7 por cento neste ano.
Mas a queda do real se destaca.
‘Tortura’
Mesmo depois de ter registrado uma recuperação de 5 por cento durante os dois últimos dias, a queda deste ano ainda é a pior entre as 31 moedas mais negociadas frente ao dólar.
Em Manhattan, Bandez disse que era uma “tortura” acompanhar a desvalorização da moeda dia após dia.
No fim da viagem de oito dias, ela tinha comprado pouco mais do que alguns itens pequenos — cremes e vitaminas — para os parentes.
“Eu olhava todos os dias e tinha vontade de chorar”, disse ela, em referência à cotação do real.
Ela pagou mais de R$ 3,30 por dólar. “Eu vim mais com a ideia de visitar a cidade do que de comprar. Foi basicamente isso que eu fiz”.