Economia

Papa, FMI e ministro argentino debatem dívida externa e desigualdade

Encontro inusitado juntou Papa Francisco, Martin Guzmán e Kristalina Georgieva no Vaticano em momento crucial para renegociação da dívida argentina

Presidente do FMI, Kristalina Georgieva, ministro da Economia da Argentina, Martin Guzman, e Papa Francisco (Remo Casilli/Reuters)

Presidente do FMI, Kristalina Georgieva, ministro da Economia da Argentina, Martin Guzman, e Papa Francisco (Remo Casilli/Reuters)

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AFP

Publicado em 6 de fevereiro de 2020 às 14h36.

Última atualização em 6 de fevereiro de 2020 às 15h10.

Cidade do Vaticano - Um seminário organizado pelo Vaticano promoveu um encontro público inusitado entre o Papa Francisco, o ministro da Economia da Argentina, Martin Guzmán, e a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, nesta quarta-feira (5).

Em seu discurso de 20 minutos, sem citar diretamente a Argentina, Francisco pediu formas de renegociar dívidas soberanas de países que têm que enfrentar "sacrifícios insuportáveis" para pagá-las.

"Nestes casos é necessário encontrar modalidades de redução, dilatação e extinção da dívida, compatíveis com o direito fundamental dos povos à subsistência e ao progresso", disse o papa.

Ele defendeu que as dívidas devem ser pagas com os credores, mas ponderou que não seria lícito cobrar a quitação dos valores enquanto populações inteiras enfrentam a fome e o desespero.

O recado do papa veio diante de duas figuras centrais da renegociação da dívida argentina: o ministro da Economia, Martin Guzmán, e a diretora-gerente do FMI, Kristaliana Georgieva.

No dia anterior, os dois haviam tido uma reunião privada em Roma. Depois, o ministro disse que a Argentina quer pagar o que deve, mas sem provocar uma recessão profunda, e classificou as conversas como construtivas.

O ministro descreveu a dívida como "insustentável" e antecipou que o país não está disposto a aplicar medidas de austeridade, o que poderia deixar ainda mais argentinos em situação de pobreza.

O passivo é de 311 bilhões de dólares, dos quais 44 bilhões com o FMI. A dívida externa é equivalente a cerca de 91% do PIB argentino.

O valor a ser renegociado até 31 de março, na meta do governo, é de cerca de 195 bilhões de dólares (57% do PIB). Uma missão técnica do FMI é aguardada em Buenos Aires na próxima semana para discutir a questão.

Antes do discurso de Guzmán, falou a diretora-gerente do FMI. Ela também não citou a Argentina diretamente, mas mandou um recado aos países latino-americanos recomendando que os governos arrecadem mais e gastem melhor.

Desigualdade

Se na intricada questão da Argentina os recados foram mais sutis, o mesmo não aconteceu em outros temas, como a desigualdade econômica excessiva.

"O mundo é rico e, no entanto, os pobres aumentam à nossa volta", disse o pontífice depois de citar uma série de dados sobre a pobreza no mundo.

"Se existe pobreza extrema no meio da riqueza (também extrema), é porque permitimos que a lacuna aumente e se torne a maior da história", completou.

As palavras de Francisco, que tem feito a questão da pobreza e da desigualdade uma das marcas do seu pontificado, foram aplaudidas pelos presentes, entre eles os ministros do Tesouro do México, da Economia do Paraguai e El Salvador, e especialistas como Joseph Stiglitz e Jeffrey Sachs.

"Nosso sistema econômico gerou desigualdades excessivas", admitiu Goergieva, depois de enfatizar que esse é apenas um dos fatores de descontentamento em vários países da América Latina.

Em um texto publicado no site do FMI, ela citou o próprio Papa e classificou a desigualdade excessiva como uma "sombra escura" sobre a economia e que coloca em cheque a própria legitimidade do sistema aos olhos dos cidadãos.

Entre os esforços para amenizar o problema, ela cita o combate à evasão fiscal e aos paraísos fiscais, assim como investimentos em educação e eficiência do gasto social.

As três prioridades para a economia global listadas por Kristalina são "crescimento inclusivo, integração global justa e ação sobre o clima".

"Nenhum dos desafios econômicos que enfrentamos serão relevantes em 20 anos se não abordarmos as mudanças climáticas agora", escreve.

(Com João Pedro Caleiro, de EXAME)

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