(Andrew Harrer/Bloomberg/Getty Images)
GabrielJusto
Publicado em 24 de setembro de 2021 às 12h47.
O atual presidente da Comissão de Orçamento do Senado dos EUA, o senador Bernie Sanders, sempre foi um crítico feroz do modelo econômico americano. Estrela da ala de extrema esquerda do Partido Democrata, Sanders é conhecido por posições radicais e constantes ataques aos “milionários e bilionários” dos Estados Unidos, pessoas que, segundo ele, se beneficiam de um sistema injusto que provoca desigualdade social.
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Com posição de destaque em Washington desde a eleição de Joe Biden, Sanders participou ativamente da elaboração de um programa de estímulo à economia que o governo está propondo ao Congresso. Trata-se do maior pacote de gastos públicos da história dos Estados Unidos, um gigantesco plano de investimentos e programas sociais que vai custar US$ 5 trilhões em 10 anos, segundo o Committee for a Responsible Federal Budget.
Para financiar o enorme aumento de gastos, equivalente a três vezes o PIB brasileiro, Sanders repete a recomendação usual: aumentar os impostos da classe "privilegiada", especialmente dos bilionários, os quais, segundo ele, “não sabem mais onde gastar o dinheiro e são indiferentes às dificuldades do cidadão comum,” pontua.
A proposta é coerente com a ideologia política do senador, mas, no mundo real, a conta não fecha. Segundo a edição de abril da revista Forbes, existem nos Estados Unidos exatamente 724 bilionários, com patrimônio total de US$ 4,4 trilhões. Ou seja, mesmo se o governo confiscasse o patrimônio total de todos os bilionários do país, os recursos ainda não seriam suficientes para pagar pelo exorbitante aumento de gastos.
A extrema esquerda sempre esteve presente na política americana, mas nos últimos anos ganhou força e se transformou em um dos principais pilares eleitorais dos Democratas. Sanders, de 80 anos, angariou apoio massivo entre os jovens e chegou em segundo lugar nas prévias do partido que escolheram Joe Biden para concorrer contra Trump nas eleições gerais.
Com a vitória de Biden, um político moderado, mas dependente do apoio da extrema esquerda, a retórica da luta de classes e a descrença no modelo econômico liberal chegaram a Washington.
Do ponto de vista dos investidores, seria um erro ignorar a influência de radicais como Sanders na política econômica americana atual. Obviamente, o mirabolante plano de gastos só poderá ser financiado por meio de um aumento generalizado de impostos, inclusive para a classe média, com consequências negativas previsíveis.
O alerta sobre os riscos de longo prazo provocados pelo descontrole fiscal e pela complacência com a inflação em alta vem de todos os lados, inclusive de dentro do próprio Partido Democrata. Larry Summers, um dos economistas mais respeitados em Washington (ex-secretário do Tesouro na administração Clinton, chefe do Conselho Nacional de Assessoria Econômica do ex-presidente Obama, ex-presidente da Universidade de Harvard e antigo economista-chefe do Banco Mundial) caracteriza a política econômica do governo Biden como “a mais irresponsável dos últimos 40 anos”.
Apesar do aumento dos riscos de longo prazo, o mercado americano permanece atrativo no contexto dos mercados globais, pelo menos por enquanto. As economias da Europa, China, Japão, e da maioria dos mercados emergentes, inclusive do Brasil, apresentam fundamentos ainda mais frágeis e, por falta de alternativas, o capital internacional continua fluindo para os Estados Unidos.
Com alta em dólares de quase 20% no ano, a bolsa americana continua com o melhor desempenho entre os maiores mercados do mundo — as bolsas da Europa e do Japão têm altas mais moderadas, enquanto China, Brasil e outros mercados de países emergentes estão em território negativo.
Impulsionados pelos enormes gastos do governo e pelas injeções de liquidez por parte do banco central americano, os ativos em dólar devem continuar com bom desempenho, mas isso pode mudar se não houver moderação em Washington.
*Gestor de investimentos internacionais e fundador da Stratton Capital