Governo Temer perdeu força nos últimos meses (Andre Coelho/Bloomberg)
João Pedro Caleiro
Publicado em 26 de junho de 2018 às 06h00.
Última atualização em 26 de junho de 2018 às 06h00.
São Paulo – No último dia 20 de fevereiro, com a reforma da Previdência engavetada, ministros e líderes políticos anunciaram publicamente os 15 projetos prioritários de Michel Temer para a economia.
Desde então, o governo perdeu força diante de episódios como a greve dos caminhoneiros enquanto a previsão para crescimento do PIB em 2018 caiu praticamente pela metade: de 2,89% para 1,55%, segundo o Boletim Focus.
“A agenda está ficando cada vez mais difícil. Temos revisado para baixo as perspectivas do que pode ser aprovado e foi desconstruída a narrativa de uma economia acelerando, que poderia colocar Temer como ator relevante na eleição”, diz Christopher Garman, diretor para as Américas da consultoria Eurasia.
O recesso parlamentar começa no dia 7 de julho e quando os congressistas retornarem, duas semanas depois, devem adotar um esquema chamado de esforço concentrado.
Durante agosto e setembro, apenas uma semana do mês é reservada para sessões deliberativas em que algo é realmente votado e o foco é em pautas inadiáveis (como o Orçamento).
E com a proximidade da eleição, deve diminuir o apetite dos políticos por qualquer questão remotamente controversa, além de haver mais atenção para outros temas (como segurança pública) e vontade de distribuir benesses a setores específicos, gerando risco fiscal.
“Principalmente depois da greve dos caminhoneiros, a agenda positiva do governo começa a dividir espaço com uma agenda negativa, de renúncias e benefícios fiscais, por exemplo. O governo vai ter que gastar energia na defesa, não só no ataque”, avalia Silvio Fascione, analista-sênior da Eurasia em Brasília.
O único projeto prioritário da agenda de fevereiro já aprovado foi a reoneração da folha de pagamentos (PL 8456), porém já diluída e com vetos presidenciais que ainda aguardam apreciação.
E o voto a toque de caixa ocorreu em um contexto atípico: em meio à paralisação dos caminhoneiros, para garantir parte da receita necessária para cobrir os subsídios que mantém o preço do diesel congelado.
Analistas políticos avaliam que os projetos mais factíveis a partir de agora serão aqueles de segundo escalão e cujo impacto econômico é positivo, mas bastante limitado, com ênfase na geração de receitas.
Nem tudo depende só do Legislativo. A regulamentação do teto dos salários públicos (PL 6726), por exemplo, tem chance de aprovação média-alta, segundo as consultorias, mas aguarda uma decisão do Supremo Tribunal Federal sobre auxílio-moradia dos juízes e que ainda não foi marcada.
Veja a situação dos projetos:
A prioridade declarada do governo é a desestatização da Eletrobras, mas a promessa de privatização (PL 9463) deve ficar no mínimo para 2019.
O foco agora é em aprovar um projeto que apare as arestas para vender as distribuidoras, ainda que o leilão possa ocorrer mesmo sem ele.
“O mercado veria isso com ótimos olhos, pois iria sinalizar ao mesmo tempo uma tendência ainda liberalizante e um pouco de caixa para um governo que está raspando o cofre. O momento não seria o mais oportuno, pois vão vender na baixa”, diz André Perfeito, economista-chefe da corretora Spinelli.
Já o projeto de lei que autoriza a Petrobras a vender até 70% das áreas de cessão onerosa do pré-sal, destravando negociações com a União, não estava na pauta em fevereiro, mas foi aprovado na última quarta-feira (20) e vai ao Senado após análise de destaques. Ele permitiria fazer um leilão que pode render até R$ 100 bilhões ao governo.
Outro projeto bem posicionado é a atualização da Lei Geral de Telecomunicações (PLC 79), que passaria a prestação de serviço de telefonia fixa definitivamente para a iniciativa privada.
Também no topo da agenda e com tramitação avançada estão três “medidas de eficiência microeconômica, fundamentais e que geram potencial de crescimento no futuro, mas que sozinhas não conseguem puxar a macroeconomia”, segundo André.
Um destes projetos é a regulamentação da duplicata eletrônica (PL 9327), já aprovada pela Câmara e atualmente no Senado.
As duplicatas são títulos de crédito para um bem vendido ou serviço prestado que será pago a prazo, e um sistema nacional seria criado para atestar sua validade e antecipar pagamento em qualquer banco, ajudando, em tese, no mercado de crédito e na redução de juros.
Na mesma situação, aprovada pela Câmara mas parado no Senado, está o projeto do distrato (PLS 774), que define regras para a desistência da compra de imóvel na planta. É uma reivindicação antiga do mercado imobiliário, um dos mais afetados pela crise econômica.
Outra prioridade declarada do governo, junto com a Eletrobras, é o projeto do cadastro positivo (PLP 441), que obrigaria a inclusão em um banco de dados nacional das informações sobre empréstimos quitados e obrigações pagas de todas as empresas e consumidores.
Este histórico de crédito poderia ser acessado por instituições financeiras, o que em tese ajudaria a reduzir os juros para os bons pagadores. A lei já passou nas duas casas, mas falta votar os destaques, e há congressistas que alegam preocupação com a proteção dos dados.
“A duplicata tem chances boas, o distrato tenho dúvidas se dá tempo e se o cadastro positivo tiver mudança no texto, o que é mais provável, volta ao Senado. Mas nossa avaliação é que os três passam”, diz Thiago Vidal, coordenador de análise política da consultoria Prospectiva.
Há outros projetos menores com boas chances. Um deles é aquele que permitiria às instituições financeiras fazer depósitos voluntários do Banco Central (PL 9248) como forma de manejar seu estoque de recursos, algo comum em países desenvolvidos.
Outro é a extinção do fundo soberano (MP 830), criado em 2008 para servir de poupança contra crises externas, mas que acabou registrando perdas. Seu fim foi encaminhado através de Medida Provisória e ainda há R$ 500 milhões que devem ser resgatados para ajudar a cumprir a regra de ouro.
A Eurasia calcula que estes três projetos tem cada um metade de chance de aprovação. Segundo a Prospectiva, a primeira proposta tem chance média e as outras duas tem chance baixa.
A Lei das Agências (PL 6621) prevê maior autonomia financeira e melhora de governança nas agências. Seu mérito econômico, diminuir a influência política, é também o que atrapalha sua aprovação.
A nova Lei de finanças públicas (PL 295), que consolida e moderniza alguns procedimentos nessa área, tem uma dificuldade política: precisa de maioria absoluta (e não simples) para passar.
Já a Lei de recuperação das estatais (PL 9215) cria regras para as estatais criarem e efetuarem planos para se reerguer após falências. É algo parecido com o que hoje acontece no setor privado, mas que gera resistência por permitir congelamento de salários e redução de benefícios dos seus empregados.
"Reduzir o risco de corrupção e melhorar a gestão ajudam na imagem da empresa para os investidores e reduzem a necessidade de aportes pelo Tesouro, e nesse sentido são medidas positivas que também tem impacto financeiro, ainda que mais no médio e longo prazo", diz Alex Agostini, economista-chefe da Austin Ratings.
Primeiro item na agenda de fevereiro, o projeto de simplificação das alíquotas do PIS/Cofins ainda nem foi apresentado e já causa resistência. Há grupos que hoje se beneficiam da complexidade atual, mesmo que o governo garanta que não haveria alta da carga tributária como um todo.
A autonomia do Banco Central (PLP 252/1998) tem mais chances, ainda que baixas. Também precisa de maioria absoluta e é controverso entre os principais candidatos à Presidência, tendo sido explorado, por exemplo, na campanha de 2014 contra Marina Silva.
A Lei de licitações e contratos (PL 6814) foi proposta pelo Senado ainda no governo de Dilma Rousseff e aguarda voto em comitê da Câmara. A lei cria uma norma geral para regular licitações e contratos públicos, mas há controvérsias sobre vários pontos.