Economia

Desigualdade dispara em países ricos e cai na América Latina

Relatório da OCDE diz que desigualdade só cresceu nos últimos 30 anos e prejudica o crescimento; impostos e educação são armas para atacar o problema


	Sem teto em Nova York, nos Estados Unidos
 (Getty Images)

Sem teto em Nova York, nos Estados Unidos (Getty Images)

João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 21 de maio de 2015 às 13h10.

São Paulo - A desigualdade não para de subir há mais de 30 anos na maioria dos países ricos, de acordo com um relatório da Organização para Cooperaçao e Desenvolvimento Econômico (OCDE) lançado hoje.

"Nos países da OCDE, os 10% mais ricos da população ganham 9,6 vezes a renda dos 10% mais pobres. Essa relação era de 7:1 nos anos 80, subiu para 8:1 nos anos 90 e para 9:1 nos anos 2000", diz o relatório.

É o terceira vez desde 2008 que a OCDE lança um trabalho sobre o tema, que também foi alvo de trabalho da Oxfam e uma reportagem de capa da revista EXAME.

Como Thomas Piketty mostrou, a riqueza também reverteu uma tendência de boa parte do século passado e ficou ainda mais concentrada do que a renda. Os 10% no topo da pirâmide tem hoje mais de metade da riqueza total.

Entre as razões para isso, a OCDE cita a mudança na estrutura de remuneração no 1% mais rico e nos sistemas de impostos, que se tornaram menos redistributivos após os cortes nas taxas marginais da população mais rica. 

A evolução tecnológica também criou uma polarização nos empregos: de um lado, profissionais qualificados em boas vagas que exigem muita capacidade de raciocínio abstrato. Do outro lado, vagas de meio período ou temporárias, ou o recurso ao trabalho autônomo.

Isso explica porque a desigualdade subia mesmo quando havia pleno emprego em países como os EUA. O que a crise fez foi acelerar a transferência do risco de pobreza dos mais velhos para os mais jovens, mais sujeitos ao desemprego e o trabalho precário.

A única força que deu algum freio nesse processo foi a participação crescente das mulheres na força de trabalho, já que a janela entre as mulheres com os maiores e os menores salários cresce mais devagar do que entre os homens.

O aumento da desigualdade não é um problema só dos mais pobres, mas da economia como um todo. A OCDE estima que o aumento da desigualdade entre 1985 e 2005 retirou 4,7 pontos percentuais do crescimento acumulado entre 1990 e 2010 e sugere formas de combater a concentração de renda aumentando o potencial econômico.

Há também o temor de que o sistema político esteja sendo capturado por uma pequena elite com poder desproprocional para financiar campanhas e influenciar os rumos dos governos.

Em alguns emergentes como Rússia e China, a desigualdade também está em alta desde os anos 2000. Na América Latina e em alguns outros emergentes como o Brasil, ela está em queda (dependendo da medida) graças a uma maior convergência de educação e salários.

Ainda assim, ela segue acima do patamar dos países ricos. Pelo coeficiente Gini, que mede desigualdade de renda numa escala de 0 a 1 (quanto maior, mais desigual o país), os países ricos foram de 0,29 nos anos 80 para 0,32 hoje. O Brasil foi de 0,6 nos anos 90 para 0,55 hoje - queda de 8%.

Combate

A OCDE alerta que não vai ser fácil reverter o aumento da desigualdade, já que ela "está profundamente enraizada nas nossas estruturas econômicas (...) mudar instituições, políticas e relações entre atores econômicos que estiveram entre nós tanto tempo será difícil. E as forças de mudança tecnológica e globalização não irão embora".

A pesquisa econômica já mostra que políticas redistributivas não atrapalham o crescimento (o que não significa que todas tenham, necessariamente, este efeito), mas a receita mais eficiente está em segurar a desigualdade na origem e não na ponta.

O relatório recomenda atenção para a participação feminina no trabalho, com políticas que estimulem a conciliação entre vida profissional e doméstica, além de planos específicos para os mais jovens e para promover a criação de bons empregos.

Como a desigualdade de oportunidades começa cedo, também é essencial garantir uma educação universal e de qualidade do maternal ao ensino médio.

No plano fiscal, a recomendação é rever a taxação sobre renda e a transferir para a riqueza, garantindo que tanto os mais ricos quanto as multinacionais paguem a sua parcela justa. Um exemplo: reduzindo as deduções disponíveis e taxando mais as heranças. Isso inclui também aumentar a transparência e a troca internacional, com cerco aos paraísos fiscais.

Estudos com o Brasil mostram que nossos impostos indiretos aumentam a desigualdade enquanto o imposto de renda e os programas de transferência de renda a diminuem. 

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