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"Governo levou gasto público ao colapso", diz Márcio Holland

Ex-secretário de Política Econômica do governo Dilma reconheceu erros do governo do qual fez parte

Ex-secretário de Política Econômica, Márcio Holland: "ocorreu um colapso nas despesas públicas nos últimos anos". (Elza Fiúza/Agência Brasil)
DR

Da Redação

Publicado em 5 de maio de 2016 às 14h40.

São Paulo - Márcio Holland, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo Dilma , reconhece que o governo do qual fez parte levou os gastos públicos ao colapso e diz que, hoje, o Brasil é incapaz de alcançar resultados fiscais que possam estabilizar a relação da dívida bruta em relação ao PIB.

Ele é autor do livro Economia do Ajuste Fiscal - Por que o Brasil Quebrou, que chega às livrarias até o início de junho.

Em entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, ele diz que, mesmo que a União consiga superávits primários em 2017 e 2018, a relação dívida/PIB não se estabilizará antes de 2019.

Holland, que participou da equipe do ministro Guido Mantega no primeiro mandato Dilma (2011/2014), admite que o governo exagerou em medidas anticíclicas que depois contribuíram para o agravamento da crise, como a desoneração da folha de pagamento, reduções de IPI para a indústria e uma montanha de recursos para o BNDES.

O exagero, segundo ele, poderia ter sido evitado se o governo tivesse "estatísticas de qualidade".

Como forma de tentar recuperar o equilíbrio fiscal, o ex-secretário, agora de volta ao trabalho na pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV), defende um programa de privatização que inclua a venda do braço comercial da Caixa Econômica Federal, dos Correios e da Casa da Moeda.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

O senhor está para publicar o livro 'Economia do Ajuste Fiscal - Porque o Brasil quebrou'. E por que o Brasil quebrou?

Porque o País vive uma incapacidade de fazer resultados fiscais que reduzam a relação dívida bruta/PIB ao nível de 2014, por exemplo, em torno de 53%, 55% do PIB. Há uma incapacidade de geração de superávit não só hoje, mas no próximo ano e muito provavelmente em 2018 e 2019.

Por quê?

Porque ocorreu um colapso nas despesas públicas nos últimos anos. Mantidas as condições atuais de gastos e a estrutura de benefícios, não podemos mais apostar em uma recuperação da economia que leve a um aumento de arrecadação que cubra os gastos. Veja as despesas previdenciárias. Ficaram estáveis em 1% do PIB até 2014. De repente entraram numa escalada de crescimento. Já é previsto 2,5% de déficit da Previdência em 2017.

O governo fez escolhas equivocadas de políticas econômicas?

Algumas medidas anticíclicas que adotamos e que acabaram contribuindo para o agravamento da crise não precisariam ter sido tomadas se tivéssemos estatísticas de qualidade. Passamos quatro anos no escuro, achando que os investimentos no País estavam caindo porque as estatísticas do IBGE apontavam para taxas inferiores a 20% do PIB para todo o período que estivemos no governo. Só depois descobrimos que os investimentos superavam os 20% do PIB. Mas já tínhamos adotado medidas anticíclicas fortes que não precisariam ser feitas. A culpa não são dos técnicos do IBGE, que aliás são de uma extrema competência. O problema é que, no Brasil, o governo vê as estatísticas como se fosse uma coisa secundária e não libera os recursos necessários para o IBGE fazer bem o seu trabalho.

A Nova Matriz Macroeconômica foi um erro?

A adoção da nova matriz macroeconômica virou a principal explicação para a crise atual. Foi uma combinação da necessidade de ter de se corrigir o câmbio, fazendo intervenções para desvalorizar a moeda, com a adoção das desonerações porque se achava que a economia crescia pouco. O IBGE anunciava uma taxa de crescimento muito menor que a anunciada em março do ano passado. O Brasil estava tendo um PIB em torno de 1% em 2012. Parecia que ia se repetir em 2013. Acabamos descobrindo depois que o Brasil cresceu 3,9% e, em seguida, 2,7%.

Por isso as medidas?

O governo estava muito preocupado com aqueles números. Queria manter a economia aquecida e promoveu as desonerações. O que aconteceu é que de 2013 para 2014 a economia desaba e vai para zero. 2015 e 2016 nós já conhecemos. Eu acho que culpar só as desonerações e a redução da Selic (o BC derrubou a Selic a 7,25% ao ano) não é muito correto.

Há muitas críticas às interferências do governo e do Ministério da Fazenda na economia.

Claro, mas o que inicia uma queda do humor são as intervenções em taxas. Tanto que, quando foram feitas as concessões, discutimos por mais de um ano se tabelaríamos ou não a TIR (Taxa de Retorno Interno). Depois que o assunto foi para a Fazenda, houve efetivamente a ruptura desse paradigma e nós até fizemos bons leilões. Mas discussão de taxas nesse nível gera desconforto do setor privado.

Então o senhor admite que o governo interferiu demais na economia?

É que a expressão interferir demais é forte. Eu acho que o governo se comunicava muito pouco com o mercado quando fazia essas coisas. A nossa comunicação foi muito ruim. Acho esse que foi um dos maiores erros do governo Dilma Rousseff. Quando se está discutindo concessões, é preciso debater com o setor, ouvir propostas e entender o planejamento de longo prazo das empresas. Agora, é preciso explicar também que outros eventos contribuíram para a tragédia que estamos vivendo. Um deles tem a ver com corrupção.

Houve ou não pedaladas no governo Dilma?

O problema de qualquer contabilidade criativa, pedalada ou qualquer termo assim é a qualidade do dado a ser analisado para saber qual é efetivamente o esforço fiscal do Estado brasileiro. Enquanto estive no governo eu via o problema da mesma forma que os economistas-chefes dos bancos viam, com as estatísticas agregadas nacionais. Eu não tinha controle nenhum do caixa do governo para avaliar a qualidade daquela execução orçamentária ou programa com esse ou aquele fundo. Cada programa do Tesouro Nacional com a Caixa Econômica, com o BNDES ou com qualquer outro banco ou fundo não era a minha área que olhava. Era a Secretaria do Tesouro que olhava isso. Portanto, cabe a ela responder a isso com transparência.

O que vai ficar depois da Lava Jato?

Os bons negócios virão. Sobre governança, gostaria de destacar que, no Estado brasileiro, ainda há uma série de empresas estatais que não têm mais muito sentido de existir e têm uma governança muito ruim.

Está falando de privatização?

Acho que o termo privatizar deve ser reforçado e reusado sem preconceitos. Infelizmente, por causa do histórico ideológico ruim, esse termo foi demonizado. Cometo a coragem de citar alguns nomes de empresas. Por exemplo, a Caixa Econômica Federal tem um braço comercial muito forte que não faz o menor sentido ser 100% controlado pelo Tesouro. É um negócio non sense na situação brasileira e o Estado arrecadará R$ 30 bilhões ou mais com um negócio desse. Os Correios não têm nenhuma aliança estratégica no Brasil. O faturamento dos Correios é muito alto e provavelmente não tem nem lucro adequado. É um negócio sem sentido para o Estado. Eu citaria também a Casa da Moeda. Não faz sentido nenhum.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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São Paulo - Márcio Holland, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda no governo Dilma , reconhece que o governo do qual fez parte levou os gastos públicos ao colapso e diz que, hoje, o Brasil é incapaz de alcançar resultados fiscais que possam estabilizar a relação da dívida bruta em relação ao PIB.

Ele é autor do livro Economia do Ajuste Fiscal - Por que o Brasil Quebrou, que chega às livrarias até o início de junho.

Em entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, ele diz que, mesmo que a União consiga superávits primários em 2017 e 2018, a relação dívida/PIB não se estabilizará antes de 2019.

Holland, que participou da equipe do ministro Guido Mantega no primeiro mandato Dilma (2011/2014), admite que o governo exagerou em medidas anticíclicas que depois contribuíram para o agravamento da crise, como a desoneração da folha de pagamento, reduções de IPI para a indústria e uma montanha de recursos para o BNDES.

O exagero, segundo ele, poderia ter sido evitado se o governo tivesse "estatísticas de qualidade".

Como forma de tentar recuperar o equilíbrio fiscal, o ex-secretário, agora de volta ao trabalho na pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas (FGV), defende um programa de privatização que inclua a venda do braço comercial da Caixa Econômica Federal, dos Correios e da Casa da Moeda.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

O senhor está para publicar o livro 'Economia do Ajuste Fiscal - Porque o Brasil quebrou'. E por que o Brasil quebrou?

Porque o País vive uma incapacidade de fazer resultados fiscais que reduzam a relação dívida bruta/PIB ao nível de 2014, por exemplo, em torno de 53%, 55% do PIB. Há uma incapacidade de geração de superávit não só hoje, mas no próximo ano e muito provavelmente em 2018 e 2019.

Por quê?

Porque ocorreu um colapso nas despesas públicas nos últimos anos. Mantidas as condições atuais de gastos e a estrutura de benefícios, não podemos mais apostar em uma recuperação da economia que leve a um aumento de arrecadação que cubra os gastos. Veja as despesas previdenciárias. Ficaram estáveis em 1% do PIB até 2014. De repente entraram numa escalada de crescimento. Já é previsto 2,5% de déficit da Previdência em 2017.

O governo fez escolhas equivocadas de políticas econômicas?

Algumas medidas anticíclicas que adotamos e que acabaram contribuindo para o agravamento da crise não precisariam ter sido tomadas se tivéssemos estatísticas de qualidade. Passamos quatro anos no escuro, achando que os investimentos no País estavam caindo porque as estatísticas do IBGE apontavam para taxas inferiores a 20% do PIB para todo o período que estivemos no governo. Só depois descobrimos que os investimentos superavam os 20% do PIB. Mas já tínhamos adotado medidas anticíclicas fortes que não precisariam ser feitas. A culpa não são dos técnicos do IBGE, que aliás são de uma extrema competência. O problema é que, no Brasil, o governo vê as estatísticas como se fosse uma coisa secundária e não libera os recursos necessários para o IBGE fazer bem o seu trabalho.

A Nova Matriz Macroeconômica foi um erro?

A adoção da nova matriz macroeconômica virou a principal explicação para a crise atual. Foi uma combinação da necessidade de ter de se corrigir o câmbio, fazendo intervenções para desvalorizar a moeda, com a adoção das desonerações porque se achava que a economia crescia pouco. O IBGE anunciava uma taxa de crescimento muito menor que a anunciada em março do ano passado. O Brasil estava tendo um PIB em torno de 1% em 2012. Parecia que ia se repetir em 2013. Acabamos descobrindo depois que o Brasil cresceu 3,9% e, em seguida, 2,7%.

Por isso as medidas?

O governo estava muito preocupado com aqueles números. Queria manter a economia aquecida e promoveu as desonerações. O que aconteceu é que de 2013 para 2014 a economia desaba e vai para zero. 2015 e 2016 nós já conhecemos. Eu acho que culpar só as desonerações e a redução da Selic (o BC derrubou a Selic a 7,25% ao ano) não é muito correto.

Há muitas críticas às interferências do governo e do Ministério da Fazenda na economia.

Claro, mas o que inicia uma queda do humor são as intervenções em taxas. Tanto que, quando foram feitas as concessões, discutimos por mais de um ano se tabelaríamos ou não a TIR (Taxa de Retorno Interno). Depois que o assunto foi para a Fazenda, houve efetivamente a ruptura desse paradigma e nós até fizemos bons leilões. Mas discussão de taxas nesse nível gera desconforto do setor privado.

Então o senhor admite que o governo interferiu demais na economia?

É que a expressão interferir demais é forte. Eu acho que o governo se comunicava muito pouco com o mercado quando fazia essas coisas. A nossa comunicação foi muito ruim. Acho esse que foi um dos maiores erros do governo Dilma Rousseff. Quando se está discutindo concessões, é preciso debater com o setor, ouvir propostas e entender o planejamento de longo prazo das empresas. Agora, é preciso explicar também que outros eventos contribuíram para a tragédia que estamos vivendo. Um deles tem a ver com corrupção.

Houve ou não pedaladas no governo Dilma?

O problema de qualquer contabilidade criativa, pedalada ou qualquer termo assim é a qualidade do dado a ser analisado para saber qual é efetivamente o esforço fiscal do Estado brasileiro. Enquanto estive no governo eu via o problema da mesma forma que os economistas-chefes dos bancos viam, com as estatísticas agregadas nacionais. Eu não tinha controle nenhum do caixa do governo para avaliar a qualidade daquela execução orçamentária ou programa com esse ou aquele fundo. Cada programa do Tesouro Nacional com a Caixa Econômica, com o BNDES ou com qualquer outro banco ou fundo não era a minha área que olhava. Era a Secretaria do Tesouro que olhava isso. Portanto, cabe a ela responder a isso com transparência.

O que vai ficar depois da Lava Jato?

Os bons negócios virão. Sobre governança, gostaria de destacar que, no Estado brasileiro, ainda há uma série de empresas estatais que não têm mais muito sentido de existir e têm uma governança muito ruim.

Está falando de privatização?

Acho que o termo privatizar deve ser reforçado e reusado sem preconceitos. Infelizmente, por causa do histórico ideológico ruim, esse termo foi demonizado. Cometo a coragem de citar alguns nomes de empresas. Por exemplo, a Caixa Econômica Federal tem um braço comercial muito forte que não faz o menor sentido ser 100% controlado pelo Tesouro. É um negócio non sense na situação brasileira e o Estado arrecadará R$ 30 bilhões ou mais com um negócio desse. Os Correios não têm nenhuma aliança estratégica no Brasil. O faturamento dos Correios é muito alto e provavelmente não tem nem lucro adequado. É um negócio sem sentido para o Estado. Eu citaria também a Casa da Moeda. Não faz sentido nenhum.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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