Economia

Embaixador japonês quer expansão de negócios entre Brasil e Japão

Empresas japonesas no território brasileiro aplicaram mais de US$ 800 milhões em investimentos no Brasil este ano

Akira Yamada: embaixador do Japão fala sobre relação do país com o Brasil (Embaixada do Japão no Brasil/Divulgação)

Akira Yamada: embaixador do Japão fala sobre relação do país com o Brasil (Embaixada do Japão no Brasil/Divulgação)

AB

Agência Brasil

Publicado em 28 de dezembro de 2018 às 07h31.

De janeiro a setembro deste ano, as 700 empresas japonesas com escritório ou fábricas no território brasileiro aplicaram cerca de US$ 800 milhões em investimentos no Brasil. Mas as relações entre Brasil e Japão não se resumem a negócios. Este ano, os dois países celebraram os 110 anos da imigração japonesa no Brasil, com centenas de eventos culturais, artísticos, esportivos e culinários que simbolizam a contribuição dos japoneses para a sociedade brasileira.

Do desenvolvimento do jiu-jitsu à expansão agrícola do cerrado brasileiro, da introdução da berinjela na culinária nacional ao judô, é difícil enumerar todas as contribuições que os imigrantes japoneses deram ao Brasil. Atualmente, os 2 milhões de descendentes japoneses que vivem hoje no Brasil constituem a maior comunidade de pessoas de origem japonesa fora do Japão.

Em entrevista à Agência Brasil, o embaixador do Japão, Akira Yamada, ressalta que os brasileiros também contribuíram para enriquecer a cultura e os costumes japoneses. Como exemplos, ele citou o jogador brasileiro Zico que foi importante para o desenvolvimento do futebol no Japão e a bossa nova, gênero musical brasileiro dos anos 60 que até hoje é muito apreciada pelos japoneses.

O embaixador observou ainda que os 200 mil trabalhadores brasileiros que vivem hoje no Japão são responsáveis pela disseminação do gosto pelo churrasco e pelo samba.

Para Yamada, os investimentos e a transferência de tecnologia do Japão podem aumentar em direção ao Brasil, mas observou que é importante que o "ambiente de negócios no Brasil" melhore.

Veja os principais trechos da entrevista do embaixador Akira Yamada:

Os brasileiros aprenderam muito com a imigração japonesa que incentivou o cultivo de diversos produtos agrícolas antes desconhecidos, como o pepino e a berinjela. Além disso, os imigrantes criaram um modelo de abastecimento em torno das grandes cidades que melhorou a vida dos brasileiros. Em sentido contrário, o que os japoneses aprenderam com o Brasil e exportaram para o Japão?

Akira Yamada: Este ano marca os 110 anos da imigração japonesa no Brasil. Os japoneses e os seus descendentes trouxeram e implementaram muitas coisas ao longo destes anos. Já o Japão também teve muito a aprender do Brasil: enquanto os descendentes japoneses contribuíram de forma significativa na agricultura brasileira, os consumidores japoneses tradicionalmente se beneficiam pelas importações de café brasileiro de alta qualidade e de produtos como frutas tropicais nestes últimos anos, por exemplo.

Além disso, antes da criação da J-League (Liga nacional de futebol do Japão), os jogadores brasileiros como George Yonashiro e Sérgio Echigo contribuíram para o futebol do Japão. Os craques brasileiros tais como Zico e Dunga também fizeram contribuições significativas para aumentar o nível do futebol do Japão. De fato, antes de estes jogadores ingressarem na J-League, o Japão não havia participado de Copa do Mundo.

Porém o Japão esteve presente nestas últimas seis Copas. A bossa nova também ganhou a sua popularidade no Japão. Dizem que os CDs deste gênero são mais comprados no Japão do que no Brasil e a bossa nova vem enriquecendo os nossos corações. No Japão, há atualmente cerca de 200 mil trabalhadores brasileiros, e eles têm desempenhado papéis para a difusão da cultura brasileira como o samba e o churrasco lá no Japão. Isso faz com que aumente o número de jovens japoneses interessados na cultura brasileira. Aproveitando o ano comemorativo da imigração japonesa e se baseando no slogan "Do Rio para Tóquio", gostaria de fortalecer ainda mais os nossos laços entre o Brasil e o Japão.

Na década de 1970, havia uma demanda muito grande do Japão por grãos - particularmente por grãos proteicos, como a soja. Essa necessidade deu origem a um acordo entre os governos japonês e brasileiro para desenvolver a produção de grãos no Centro-Oeste do Brasil. A partir daí, a produção de soja, milho e algodão explodiu no Cerrado, que se tornou o principal polo agropecuário do país. Parceiros de longa data, japoneses e brasileiros agora estão trabalhando em conjunto além de suas fronteiras. O desafio é viabilizar o corredor agrícola de Nacala, em Moçambique. Quais são as perspectivas desse projeto para o Brasil e Japão?

Yamada: Entre os anos de 1979 a 2001, executamos o Programa de Cooperação Nipo-Brasileiro para o Desenvolvimento Agrícola dos Cerrados (Prodecer) constituído de cooperação financeira e de cooperação técnica, para transformar umas das terras mais estéreis do Brasil por ter um solo ácido, em terras cultiváveis na região do cerrado. Esse programa aumentou a produção de alimentos, melhorou as variedades e transferiu a tecnologia agrícola tropical sustentável para o Brasil.

Executamos esse projeto-piloto em uma área de 350 mil hectares e investimos um total de 68,4 bilhões de ienes. Atualmente 50% da produção de grãos no Brasil são produzidos na região do Cerrado e o Brasil tornou-se um grande país produtor de grãos. O sucesso do Prodecer tem um impacto notável a ser observado na história da cooperação econômica do Japão e é um projeto digno de deixar o seu registro na história agrícola do mundo.

Por meio deste projeto, vários especialistas brasileiros obtiveram conhecimentos sobre agricultura tropical sustentável e, atualmente, por meio da cooperação japonesa, vários especialistas brasileiros estão atuando em países em desenvolvimento. Em Moçambique, onde há semelhanças nas terras agrícolas tropicais do Brasil, especialistas brasileiros estão ativos no campo junto com os especialistas japoneses.

Moçambique está em um ambiente muito diferente do Brasil, mas esperamos que o Japão e o Brasil cooperem para contribuir com a solução de problemas alimentares na África e que essa cooperação triangular entre Brasil-Japão-Moçambique continue progredindo.

A parceria que existiu na agricultura entre o Brasil e o Japão pode também ocorrer no plano industrial? Quais os campos em que o Japão pode colaborar com o Brasil para que a tecnologia brasileira ganhe escala global?

Yamada: Até agora, o Projeto Usiminas sobre a produção de aço e o Projeto Amazon Aluminium sobre produção de alumínio têm sido implementados como um projeto nacional cooperado pelos setores público e privado do Brasil e do Japão no campo industrial. A cooperação público-privada japonesa contribuiu muito para o desenvolvimento do campo industrial brasileiro. Atualmente, cerca de 700 empresas japonesas estão atuando no Brasil. Esperamos que o investimento japonês se expanda e que a transferência de tecnologia para o Brasil possa acompanhar o progresso, porém, é importante melhorar o ambiente de negócios no Brasil. Também esperamos aproveitar a Reunião de Cooperação em Infraestrutura Brasil-Japão, resultado da reunião de cúpula Brasil-Japão realizado em 2016, para desenvolver as relações de cooperação em vários campos industriais, com as tecnologias da informação e comunicação.

O Brasil é um grande exportador de matérias-primas e gostaria de adicionar valor à sua produção e exportar produtos de maior valor agregado. Já o Japão é um país que precisa de alimentos processados de alta qualidade, com rastreabilidade e certificação. Há espaço para o desenvolvimento de negócios que interessariam aos dois países na área da indústria de alimentos?

Yamada: Produtos agrícolas brasileiros de alta qualidade já são exportados para o Japão, sob as condições sanitárias acordadas entre Brasil Japão, como a manga brasileira e a carne suína do estado de Santa Catarina. Para que os produtos agrícolas e processados brasileiros tenham sucesso no mercado japonês, é muito importante pesquisar cuidadosamente o mercado, incluindo a preferência dos consumidores japoneses, e fornecer produtos de boa qualidade inclusive no saneamento e segurança.

Empresas japonesas estão desenvolvendo tecnologias na área energética - solar, hidrogênio e eólica. São tecnologias facilmente aproveitáveis no Brasil. De um lado o Brasil tem o que comprar dos japoneses - a tecnologia, a inovação; do outro, tem o que vender, como alimentos processados e agroenergia. O senhor acredita que as relações Brasil-Japão seguem nessa direção?

Yamada: O Brasil é um dos principais exportadores agropecuários do mundo e é um fornecedor de alimentos tradicional e confiável para o Japão, que depende da importação de muitos alimentos. De fato, o Japão importa do Brasil uma grande proporção de produtos da agropecuária para consumo interno tais como frango, café, suco de laranja. No Japão, por outro lado, a pesquisa e o desenvolvimento da energia renovável e a conservação da energia estão progredindo e espero que esses resultados sejam proveitosos para o Brasil e benéficos para os cidadãos brasileiros. Implementamos várias cooperações econômicas entre o Brasil e Japão, como o diálogo sobre agricultura e alimentos e realizamos grupo de trabalho sobre energia por meio da Reunião de Cooperação em Infraestrutura Brasil-Japão, no qual os participantes dos setores público e privado de ambos os países engajaram no diálogo. A Embaixada do Japão também irá se esforçar para tornar mais próximas as relações econômicas entre os dois países, revitalizando esses diálogos.

Como o Japão vê o atual contexto da disputa comercial entre a China e os EUA e de que forma isso pode afetar as relações comerciais japonesas?

Yamada: Quanto às questões relacionadas com a disputa comercial entre os Estados Unidos e a China, o governo japonês espera que sejam discutidas firmemente dentro da Organização Mundial do Comércio (OMC), e continuaremos observando as mudanças nas circunstâncias e as influências aos outros países, incluindo o Japão.

Acompanhe tudo sobre:CulturaDiplomaciaEmpresasJapão

Mais de Economia

Reforma tributária: videocast debate os efeitos da regulamentação para o agronegócio

Análise: O pacote fiscal passou. Mas ficou o mal-estar

Amazon, Huawei, Samsung: quais são as 10 empresas que mais investem em política industrial no mundo?

Economia de baixa altitude: China lidera com inovação