Economia

Em ano eleitoral, casas sobre rodas refletem a economia dos EUA

Especialistas consideram as vendas dos famosos "motorhomes" um termômetro da economia

Casas sobre rodas: jovens têm ajudado a revitalizar uma indústria dominada por gente mais velha (Stanislaw Pytel/Getty Images)

Casas sobre rodas: jovens têm ajudado a revitalizar uma indústria dominada por gente mais velha (Stanislaw Pytel/Getty Images)

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AFP

Publicado em 30 de janeiro de 2020 às 10h09.

Última atualização em 30 de janeiro de 2020 às 10h11.

São Paulo — As seis ou sete unidades que saem todos os dias da linha de montagem da fábrica de Riverside, no estado de Indiana, Estados Unidos, se parecem mais com uma casa do que com um carro, com teto de madeira, isolamento em fibra de vidro e pintura branca brilhante.

Durante décadas, os VR, veículos recreativos, ou 'casas sobre rodas' (RV na sigla em inglês) são ícones das estradas americanas.

São equipados com camas, chuveiro, cozinha e televisão, além de oferecer às famílias a liberdade de se deslocar por todo o país.

Em ano de eleição, os VR também contam histórias. Especialistas os consideram um termômetro da economia, compra sonhada pelos americanos que abrem a carteira par gastar dezenas de milhares de dólares apenas para se sentirem confortáveis.

Com a temporada eleitoral logo na esquina, uma equipe da AFP viajou de Washington a Iowa, estado do meio-oeste onde em 3 de fevereiro será dado o pontapé inicial das eleições primárias, com a intenção de analisar o cenário político e econômico do país.

Na região nordeste do estado de Indiana, o veredito da indústria das casas móveis parece ser que a economia, um fator que será decisivo para a continuidade ou não de Donald Trump na Casa Branca, parece forte, mesmo que recentemente tenha baixado um pouco a atividade.

"Muita gente pensa que os VR são um indicador da economia e de muitas maneiras são, porque um veículo recreativo não é algo que a pessoa tem que ter, é algo que quer ter", diz Don Clark, diretor executivo da Grand Design, empresa que fabrica veículos recreativos de alta tecnologia.

Segundo ele, as tarifas que Trump impôs sobre o aço, o alumínio e outros materiais fundamentais para esse negócio têm sido um "incômodo e tiveram impacto", mas a indústria se viu fortalecida por um ano que está entre os quatro melhores dos que se tem registro.

Bem, mas sem recordes

No museu do Salão da Fama dos VR, que tem em seu acervo um Ford Modelo T de 1913 com mesa retrátil descrito como o primeiro da história, Sherman Goldenberg diz que espera uma queda de 6% nas entregas de 2019 com relação a 2018.

Para esse veterano da indústria e diretor da empresa que publica a revista especializada RVBusiness, o mercado desse tipo de veículo teve uma grande alta após a recessão do final dos anos 2000, mas após oito anos consecutivos de crescimento, parou, "como acontece com todas as coisas".

"Caiu? Foi a pique? Não, não acredito nisso", disse. "Não é um cenário ruim, mas não, não estamos quebrando recordes". O especialista estima que foram entregues 400.000 unidades de veículos recreativos em 2019.

Os jovens, segundo Goldenberg, têm ajudado a revitalizar uma indústria dominada por gente mais velha, com contribuições como a invenção do termo 'glamping', para descrever a experiência de acampamento com luxo, conforto e estilo.

Para Goldenberg, a produção foi reduzida após a experiência de anos anteriores, quando se fabricou mais unidades do que se podia chegar a vender.

Eric Sims, economista da Universidade de Notre Dame, próximo a South Bend, concorda que a produção excedente foi um problema no passado, mas é um fator que pode ter sido exagerado pela própria indústria.

"Algo disso está acontecendo, mas acredito que também existe na economia uma desaceleração geral da demanda por esse tipo de veículo", diz Sims.

"Eu descreveria a indústria do VR como aquela que ainda está indo bem", acrescenta. "Em comparação como estavam as coisas há três ou quatro anos, esfriou um pouco".

Mão de obra amish

Nas fábricas que montam veículos recreativos, os turnos começam antes do amanhecer para não interferir na rotina de produção agrícola das comunidades amish, de onde vem boa parte dos funcionários.

Os amish, comunidade protestante conhecida por suas regras morais estritas, austeridade e recusa da modernidade, não permite a seus membros dirigir veículos motorizados, mas não há restrições para o trabalho na fabricação.

Homens barbudos com suspensórios e mulheres com vestidos longos e touca marcam o ponto de saída no relógio da fábrica. Alguns pegam suas bicicletas.

Mervin Lehman, gerente-geral da fábrica onde cerca de 80% dos trabalhadores são amish, diz que a empresa está encantada com seus funcionários e são bons com trabalhos manuais".

"Esse tipo de cultura é o que os atraem", explicou.

"Por outro lado, é um trabalho muito bom, lucrativo. Apenas com educação primárias, não há outro lugar aonde podem ir e ganhar o dinheiro que essa comunidade ganha", disse, citando a tradição amish de tirar seus filhos do sistema escolar tradicional quando chegam à adolescência.

Se entre os amish é proibido tanto dirigir quando comprar um veículo recreativo, para o americano médio o principal obstáculo é o preço desses veículos.

Keith Hess, de Wisconsin, que visitou o Salão da Fama dos VRs junto a esposa com quem está casado há 38 anos, disse que espera poder cumprir seu velho desejo de comprar um modelo de 100.000 dólares dentro de cinco anos.

"Gostaria de tirar um mês ou dois para percorrer a costa oeste até o Alasca, mas tendo a possibilidade de ser autossuficiente enquanto viajamos, parar e comer ou estacionar e usar o banheiro", disse.

"Na América do Norte somos muito afortunados por poder dirigir para muitos lugares", disse. "Você pode ver muitos lugares bonitos que Deus criou para nós".

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