Economia

Dubai é um alerta para quem investiu demais, diz ex-diretor do BC

Para Carlos Thadeu de Freitas, no entanto, o Brasil pode aproveitar a crise para recomprar títulos públicos com deságio

Thadeu: Brasil está mais sólido para enfrentar a crise de Dubai (--- [])

Thadeu: Brasil está mais sólido para enfrentar a crise de Dubai (--- [])

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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h11.

A crise da moratória de Dubai, que eclodiu nesta semana, pode significar uma oportunidade de bons negócios para o Brasil. Além de não sofrer fortes impactos, o país poderia aproveitar o nervosismo dos investidores internacionais e recomprar, com deságio, títulos da dívida brasileira. Seria uma forma de enxugar um pouco a entrada de dólares, conter o câmbio e lucrar com a turbulência proveniente dos Emirados Árabes. A avaliação é do economista Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central e atual chefe da divisão de Economia da Confederação Nacional do Comércio. Veja, a seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Portal EXAME:

Portal EXAME - Qual será o impacto da crise de Dubai no Brasil?
Carlos Thadeu de Freitas -
Eu não acredito que haja um forte impacto. O contexto brasileiro mudou radicalmente na última década. Quando o Brasil tinha um déficit enorme em conta corrente, uma crise dessas nos afetava muito. Lembre-se de que, em 1998, a crise russa foi detonada também por uma renegociação de dívidas, como Dubai está fazendo. E veja o quanto ela nos afetou naquela época. Agora, o Brasil está muito solvente. Estamos até evitando a entrada de dólares, para conter a valorização do real. A taxação com o IOF é um exemplo disso.

Portal EXAME - O megainvestidor americano Mark Mobius afirmou que Dubai pode levar a uma desvalorização de até 20% das bolsas de todo o mundo. Seremos tão afetados assim?
Thadeu -
É natural que ocorra uma turbulência no curto prazo, mas não acho que veremos uma fuga de capitais do Brasil. Dubai afetará o mercado de capitais de países com fundamentos piores, com desequilíbrios fiscais e grandes déficits. Ainda haverá volatilidade da Bovespa nas próximas semanas, mas não acho que será algo preocupante.

Portal EXAME - Há uma grande discussão sobre o surgimento de uma nova bolha de ativos, sobretudo nos países emergentes e na Ásia. A moratória de Dubai é um aviso de que os investidores podem estar muito eufóricos?
Thadeu -
Primeiro, não vejo uma bolha nos ativos brasileiros. Não estamos superalavancados em imóveis, por exemplo. As próprias medidas recentes do governo tentam inibir a entrada de capitais. Embora o IOF tenha um efeito limitado, a taxação ajudou a esvaziar um pouco o que seria uma bolha. Sem o IOF, é possível que o dólar já estivesse em 1,60 real. É claro que a tendência do dólar é de queda, mas essas medidas ajudam a freá-la. Dubai é um alerta para quem foi excessivamente otimista, e investiu demais. O governo de Dubai superestimou seu potencial, e a moratória ainda é um efeito retardado da crise que eclodiu no ano passado (Continua...).


Portal EXAME - Mas isso não pode gerar um efeito-dominó e atingir todos os mercados?
Thadeu -
O mercado mais atingido por uma moratória sempre é o de títulos, tanto públicos quanto privados. O investidor fica mais cauteloso, e os prêmios de todos os papéis sofrem. Mas essa dificuldade será passageira para o Brasil. O país não está precisando de recursos. Temos grandes reservas internacionais. No caso dos títulos privados, também pode haver um momento de mais dificuldade para captar dinheiro, mas não acho que será grave. Isso pode até ajudar o Brasil. Se os investidores resolverem vender seus papéis, o país poderia ter a oportunidade de recomprá-los com deságios. Seria um bom negócio e, além disso, ajudaria a retirar um pouco de dólares do país e segurar o câmbio.

Portal EXAME - A crise de Dubai foi gerada pelo seu fundo soberano, o Dubai World. Que lições o Brasil pode tirar desse episódio, agora que discutimos a criação de nosso próprio fundo?
Thadeu -
Eu acho natural que, daqui uns anos, o país crie um fundo soberano. Quando a produção do pré-sal começar, será necessário criar um meio de isolar os dólares oriundos da exportação, para que não inundem a economia. O que Dubai nos ensina, nesse caso, é que um fundo soberano não pode trabalhar alavancado. O Dubai World foi constituído com recursos de investidores estrangeiros, e não com reservados daquele país. Além disso, foram muito otimistas em seus projetos. Um fundo soberano não pode captar recursos. Ele tem de se limitar a aplicar recursos gerados por outros meios. No nosso caso, aqueles que virão do pré-sal e do crescente interesse dos investidores por nosso país.

Portal EXAME - O Brasil pode sair favorecido desse episódio? É mais uma chance de mostrar que nossos fundamentos são diferentes?
Thadeu -
Com certeza isso vai facilitar o processo de diferenciação. Os investidores em títulos ficarão retraídos por algum tempo, mas papéis de países com bons fundamentos sempre terão demanda. E o Brasil pode se destacar nisso.

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