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Do Brexit a Trump, o fiasco da globalização

Embora a riqueza aumente a cada ano (o PIB mundial cresceu 3,1% em 2015), sua distribuição é cada vez mais desigual

Trump: "Há várias formas de responder ao aumento das desigualdades, e uma delas é, infelizmente, o retrocesso nacional ou a xenofobia" (Chris Keane / Reuters)
DR

Da Redação

Publicado em 6 de julho de 2016 às 14h57.

Do Brexit ao fenômeno Donald Trump , passando pelo auge da ultradireita na Áustria, os eleitores desafiaram as elites impondo um "retrocesso nacional" diante das desigualdades crescentes provocadas pela globalização, explicaram à AFP economistas e personalidades.

"Há várias formas de responder ao aumento das desigualdades, e uma delas é, infelizmente, o retrocesso nacional ou a xenofobia", explica à AFP o economista francês de esquerda Thomas Piketty, autor do best-seller internacional "O capital no século XXI".

"Essa é a via encarnada pelo Brexit no Reino Unido, e que também é forte na França, com a Frente Nacional, e nos Estados Unidos, com Donald Trump, que critica os mexicanos e o Islã. São adotadas diferentes formas, de acordo com os países", constata Piketty.

Embora a riqueza aumente a cada ano (o PIB mundial cresceu 3,1% em 2015), sua distribuição é cada vez mais desigual.

Segundo a ONG britânica Oxfam, no ano passado o patrimônio acumulado do 1% mais rico do planeta superou o dos 99% restante, com um ano de antecedência sobre as previsões.

Já não se trata somente da desigualdade entre países ricos e pobres. As sociedades mais avançadas abrigam parte considerável dos pobres: criadores de gado vencidos pela concorrência internacional, operários demitidos da fábrica que mudou de país, funcionários expulsos das grandes cidades pela disparada dos preços das moradias, pessoas irritadas pela proximidade de um acampamento de refugiados.

Salários estagnados

"As desigualdades não deixam de aumentar na maior parte dos países da OCDE. Nos Estados Unidos estão alcançando níveis que não são vistos desde os anos vinte do século passado", explica à AFP Jennifer Blanke, economista-chefe do Fórum Econômico Mundial (WEF), que organiza todo ano na Suíça o encontro de Davos.

"Se o Brexit for analisado, o país aparece dividido entre as regiões que tiram proveito da globalização e aquelas onde as pessoas não têm a impressão de estarem se beneficiando do crescimento", destaca a economista.

Um diagnóstico similar ao do ex-ministro francês conservador e ex-comissário europeu Michel Barnier.

"O verdadeiro problema é: de onde vem esse sofrimento social? De onde vem esse desemprego, esse sentimento de exclusão e de abandono? Certamente, as consequências da globalização estão sendo questionadas", reconhece.

Segundo ele, "muita gente que manifesta sua cólera, sua frustração e seu sofrimento social" votou no Brexit.

A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) segue a mesma linha.

"As desigualdades em termos de renda, patrimônio, bem-estar e oportunidades aumentaram na maioria dos países-membros", destacou a OCDE em junho, apontando a preponderância das finanças sobre outros setores da economia, em um fenômeno de que a City londrina é o máximo exponente.

"O peso crescente das finanças na economia mundial pode ter desviado o investimento das atividades produtivas, e provocado uma concentração maior da riqueza, sobre a distribuição de renda", explicou a organização com sede em Paris.

"Depois da Segunda Guerra Mundial, e durante três décadas, pensávamos de verdade que a gente caminhava na direção em que a classe média compartilharia mais os benefícios da economia", lembra Blanke.

Hoje em dia, já não é mais o caso. "Os salários médios não aumentam há tempos".

Divisão entre grandes e pequenos

Para Frédéric Dabi, diretor-geral adjunto do instituto de pesquisa francês Ifop, "há uma divisão entre grandes e pequenos, os grandes que saem beneficiados com a UE e os pequenos que não tiram vantagem e se sentem esmagados. Está muito claro".

"O sentimento de que meu país perde mais do que ganha e de que, eu mesmo, pessoalmente, perco mais do ganho com a UE, é um motor forte do ceticismo em relação à Europa", destaca.

Para Piketty, resta o caminho "da chamada esquerda radical", representada nos Estados Unidos por Bernie Sanders e pelos partidos Syriza na Grécia e Podemos na Espanha.

"Quiseram humilhar o Syriza? Parabéns! Vocês tinham medo dos eleitores espanhóis? Magnífico! E agora? Agora se deparam com o Brexit", constata o economista francês.

"Cometeram um erro tremendo, e agora é preciso tentar resolvê-lo", conclui.

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Do Brexit ao fenômeno Donald Trump , passando pelo auge da ultradireita na Áustria, os eleitores desafiaram as elites impondo um "retrocesso nacional" diante das desigualdades crescentes provocadas pela globalização, explicaram à AFP economistas e personalidades.

"Há várias formas de responder ao aumento das desigualdades, e uma delas é, infelizmente, o retrocesso nacional ou a xenofobia", explica à AFP o economista francês de esquerda Thomas Piketty, autor do best-seller internacional "O capital no século XXI".

"Essa é a via encarnada pelo Brexit no Reino Unido, e que também é forte na França, com a Frente Nacional, e nos Estados Unidos, com Donald Trump, que critica os mexicanos e o Islã. São adotadas diferentes formas, de acordo com os países", constata Piketty.

Embora a riqueza aumente a cada ano (o PIB mundial cresceu 3,1% em 2015), sua distribuição é cada vez mais desigual.

Segundo a ONG britânica Oxfam, no ano passado o patrimônio acumulado do 1% mais rico do planeta superou o dos 99% restante, com um ano de antecedência sobre as previsões.

Já não se trata somente da desigualdade entre países ricos e pobres. As sociedades mais avançadas abrigam parte considerável dos pobres: criadores de gado vencidos pela concorrência internacional, operários demitidos da fábrica que mudou de país, funcionários expulsos das grandes cidades pela disparada dos preços das moradias, pessoas irritadas pela proximidade de um acampamento de refugiados.

Salários estagnados

"As desigualdades não deixam de aumentar na maior parte dos países da OCDE. Nos Estados Unidos estão alcançando níveis que não são vistos desde os anos vinte do século passado", explica à AFP Jennifer Blanke, economista-chefe do Fórum Econômico Mundial (WEF), que organiza todo ano na Suíça o encontro de Davos.

"Se o Brexit for analisado, o país aparece dividido entre as regiões que tiram proveito da globalização e aquelas onde as pessoas não têm a impressão de estarem se beneficiando do crescimento", destaca a economista.

Um diagnóstico similar ao do ex-ministro francês conservador e ex-comissário europeu Michel Barnier.

"O verdadeiro problema é: de onde vem esse sofrimento social? De onde vem esse desemprego, esse sentimento de exclusão e de abandono? Certamente, as consequências da globalização estão sendo questionadas", reconhece.

Segundo ele, "muita gente que manifesta sua cólera, sua frustração e seu sofrimento social" votou no Brexit.

A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) segue a mesma linha.

"As desigualdades em termos de renda, patrimônio, bem-estar e oportunidades aumentaram na maioria dos países-membros", destacou a OCDE em junho, apontando a preponderância das finanças sobre outros setores da economia, em um fenômeno de que a City londrina é o máximo exponente.

"O peso crescente das finanças na economia mundial pode ter desviado o investimento das atividades produtivas, e provocado uma concentração maior da riqueza, sobre a distribuição de renda", explicou a organização com sede em Paris.

"Depois da Segunda Guerra Mundial, e durante três décadas, pensávamos de verdade que a gente caminhava na direção em que a classe média compartilharia mais os benefícios da economia", lembra Blanke.

Hoje em dia, já não é mais o caso. "Os salários médios não aumentam há tempos".

Divisão entre grandes e pequenos

Para Frédéric Dabi, diretor-geral adjunto do instituto de pesquisa francês Ifop, "há uma divisão entre grandes e pequenos, os grandes que saem beneficiados com a UE e os pequenos que não tiram vantagem e se sentem esmagados. Está muito claro".

"O sentimento de que meu país perde mais do que ganha e de que, eu mesmo, pessoalmente, perco mais do ganho com a UE, é um motor forte do ceticismo em relação à Europa", destaca.

Para Piketty, resta o caminho "da chamada esquerda radical", representada nos Estados Unidos por Bernie Sanders e pelos partidos Syriza na Grécia e Podemos na Espanha.

"Quiseram humilhar o Syriza? Parabéns! Vocês tinham medo dos eleitores espanhóis? Magnífico! E agora? Agora se deparam com o Brexit", constata o economista francês.

"Cometeram um erro tremendo, e agora é preciso tentar resolvê-lo", conclui.

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