Economia

Aumento da AIDS na Grécia é econômico, mas não intencional

Relatório da OMS afirmava que gregos se infectavam deliberadamente para conseguir benefícios; erro foi corrigido, mas relação entre crise e HIV é real

EXAME.com (EXAME.com)

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João Pedro Caleiro

João Pedro Caleiro

Publicado em 28 de novembro de 2013 às 16h50.

São Paulo - A OMS (Organização Mundial de Saúde) causou um verdadeiro escândalo com um relatório de saúde na Europa que citava o aumento das infecções por HIV, o vírus causador da AIDS, na Grécia.

O texto foi divulgado em setembro, mas só essa semana começaram a aparecer as manchetes chamando a atenção para o seguinte trecho:

“A infecção por HIV e o uso de heroína aumentaram significativamente, com cerca de metade das novas infecções sendo auto-inflingidas para permitir que as pessoas recebam benefícios de 700 euros por mês e admissão mais rápida em programas de substituição de drogas."

Foi tudo culpa de um "erro crasso de edição", corrigiu a OMS na terça-feira. A informação correta era que cerca de metade das novas infecções são entre usuários de drogas injetáveis.

Casos de auto-infecção deliberada aconteceram, mas foram poucos, segundo a fonte original da informação, um estudo publicado na revista científica Lancet em 2011.

Apesar do equívoco, o que este e outros trabalhos mostram é que existe, de fato, uma relação entre a crise grega e o surto de HIV. 


O país ainda tem uma das menores incidências do vírus na Europa, mas ela tem aumentado de forma alarmante nos últimos anos, na direção contrária da tendência mundial de queda.

De acordo com o Centro Helênico para Prevenção e Controle de Doenças do país, a incidência de infectados entre 100 mil habitantes pulou de 5,8 em 2008 para 7,1 em 2011. 

Em 2012, um recorde de 1.180 novas infecções foram reportadas, elevando o total de gregos com HIV para 12.869.

Estudos mostram que o aumento do desemprego e de dificuldades financeiras estão diretamente relacionados com maiores taxas de suícidio e procura por substâncias ilegais.

Entre os usuários de drogas injetáveis, a taxa de infecção pelo HIV pulou absurdos 1.500% de 2010 para 2011.

Nas ruas, a crise econômica gerou aumento da prostituição e queda no preço das transações sexuais - uma combinação perfeita para a disseminação de doenças sexualmente transmissíveis.

O fenômeno tem sido explorado politicamente com a exposição pública e criminalização de trabalhadoras sexuais infectadas.


Enquanto isso, a austeridade no sistema de saúde - com corte de 40% no orçamento dos hospitais - tem significado menos programas de troca de seringas, menos programas de tratamento de viciados e menos disponibilidade para exames e consultas.

Desde o início da crise, cresceu também a porcentagem de pessoas que não vão ao médico apesar de avaliarem que é necessário.

Ainda assim, há razões para esperança. Houve uma reação do sistema de saúde e números preliminares indicam que 2013 pode ser o ano da virada, com uma queda de casos de HIV na Grécia pela primeira vez em uma década.  

Nos primeiros 10 meses deste ano, a porcentagem de usuários de drogas injetáveis nos novos casos caiu de 47% em 2012 para 29% em 2013.

A Grécia abriu no mês passado seu primeiro centro governamental para uso supervisionado de drogas injetáveis, uma prática já estabelecida na Austrália, Canadá e outros países europeus.

O colapso econômico, no entanto, continua a todo vapor: o desemprego é de 27,3% e a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) prevê que 2014 será o sétimo ano consecutivo de recessão na Grécia.

O PIB per capita do país já caiu mais de 20% desde o início da crise.

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