Economia

Arminio Fraga diz que Brasil corre o risco de "desembocar em grande fiasco" com o arcabouço fiscal

Ex-presidente do BC afirma que "aritmética não fecha" na nova política para as contas públicas e defende o antigo teto de gastos

Fraga também afirmou que 2023 é o ano da economia e que há um risco de o país "desembocar em um grande fiasco" (Edilson Rodrigues/Agência Senado/Divulgação)

Fraga também afirmou que 2023 é o ano da economia e que há um risco de o país "desembocar em um grande fiasco" (Edilson Rodrigues/Agência Senado/Divulgação)

Agência o Globo
Agência o Globo

Agência de notícias

Publicado em 27 de abril de 2023 às 13h34.

Última atualização em 28 de abril de 2023 às 11h07.

O ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, um dos economistas mais respeitados do país, criticou duramente o arcabouço fiscal proposto pelo governo federal, em audiência no Senado nesta quinta-feira.

Ele afirmou que a aritmética da proposta não fecha. Durante o debate sobre juros, Fraga também afirmou que 2023 é o ano da economia e que há um risco de o país "desembocar em um grande fiasco".

"A aritmética não fecha. Não é suficiente zerar o primário. Porque zerando o [déficit público] primário significa que você está tomando dinheiro emprestado para pagar os juros. E o juro é esse que a gente conhece. É fundamental caminhar na direção de um saldo ́primário maior. A aritmética simplesmente não fecha", disse ele, ao lado do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

O governo Lula prevê zerar o rombo nas contas públicas em 2024 e gerar um superávit primário (ou seja, sem contar o pagamento de juros) de 1% do PIB em 2025. As metas fazem parte da proposta do arcabouço fiscal.

A nova política apresentada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, irá substituir o teto de gastos, que impede o crescimento das despesas acima da inflação, e que foi criado pelo ex-presidente Michel Temer em 2016.

O arcabouço fiscal permitirá o crescimento dos gastos acima do índice de preços, mas isso dependerá do comportamento das receitas. O aumento real das despesas será equivalente a 70% do incremento das receitas acima da inflação. E haverá ainda uma faixa para essa expansão de receitas, que vai variar de 0,6% a 2,5% ao ano.

Fraga defendeu o teto de gastos e criticou a ênfase nas receitas dada pelo novo arcabouço.

"Outro ponto que eu gostaria de comentar é a ênfase no lado da receita. Tudo bem, mas até onde isso vai? A sociedade já sentiu que não dá para ir muito mais longe e falta espaço", disse.

Previdência e folha de pagamentos

O economista também afirmou que é preciso revisitar as prioridades no gasto público, completando que o ajuste necessário é maior do que está sendo proposto.

"O ajuste necessário é muito maior que um primário de 3% do PIB. O ajuste necessário é maior que o ajuste fiscal. E o fiscal puramente voltado para a solvência do Estado é maior do que está sendo proposto", disse. "Quase 80% do gasto público vai para a folha de pagamentos do governo e para a Previdência, e esse é um número completamente fora de qualquer curva do Brasil. É fundamental iniciar já um repensar da nossa Previdência."

Fraga terminou a sua fala dizendo que 2022 foi marcado pela mobilização em defesa da democracia — ele assinou a "Carta pela Democracia" da USP e declarou apoio a Lula contra Bolsonaro nas eleições. E alertou que o Brasil agora corre risco de "desembocar em um grande fiasco".

"O ano de 2022 foi um ano de mobilização em apoio a nossa democracia. Foi um ano dificílimo. Foi bom, deu certo. Porém, as coisas agora chamam a atenção do lado econômico. Se o ano passado foi o ano da democracia, este é o ano da economia. Eu digo isso porque, na minha avaliação, do jeito que as coisas andam, nós estamos arriscados a desembocar em um grande fiasco e já daqui a pouco abrirmos outra vez a discussão sobre a nossa democracia. Vossas excelências têm poder de virar esse jogo", afirmou, se dirigindo aos senadores e ministros.

Ele participou participa de audiência pública no Senado Federal, para discutir taxa de juros e inflação. O convite partiu do presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também participa, ao lado do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a ministra do Planejamento, Simone Tebet.

Febraban: juros é anomalia estrutural

O presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney, disse que o problema dos juros altos no país é uma "anomalia" estrutural, argumenta que o Brasil vem “patinando” em crescimento econômico, e também defende um voto de confiança na atual gestão do Banco Central.

"O crescimento econômico não vem com geração espontânea, é importante que as condições para crescer sejam postas. Juros altos são claros sinais de que temos uma anomalia estrutural na economia. Todos reconhecemos que a Selic está em um patamar bastante elevado, mas convém, mesmo que a contragosto, que nós déssemos um voto de confiança ao Banco Central", avalia.

O representante do setor bancário menciona que a autoridade monetária tem modelagens técnica e um quadro pessoal “altamente qualificado”. Sidney também disse reconhecer o esforço da equipe econômica do governo Lula com a estruturação do arcabouço fiscal e sugere mudança no regramento:

"É importante que o Congresso aprimore o arcabouço fiscal e faça uma específica de plano real das contas públicas e possamos ter efetivamente um equilíbrio duradouro do orçamento", pondera

Acompanhe tudo sobre:Armínio FragaBanco CentralJurosInflaçãoSenadoNovo arcabouço fiscal

Mais de Economia

Oi recebe proposta de empresa de tecnologia para venda de ativos de TV por assinatura

Em discurso de despedida, Pacheco diz não ter planos de ser ministro de Lula em 2025

Economia com pacote fiscal caiu até R$ 20 bilhões, estima Maílson da Nóbrega

Reforma tributária beneficia indústria, mas exceções e Custo Brasil limitam impacto, avalia o setor