(Ricardo Ceppi / Colaborador/Getty Images)
Reuters
Publicado em 31 de agosto de 2020 às 21h19.
Última atualização em 31 de agosto de 2020 às 21h35.
A Argentina informou nesta segunda-feira que obteve amplo apoio dos credores para sua oferta de reestruturação da dívida externa.
Após meses de tensas negociações desenvolvidas em meio à pandemia do coronavírus, o país — que atravessa uma grave crise econômica — chegou a um resultado que implica uma reestruturação de cerca de 99% do valor total dos instrumentos, segundo o governo.
"Agora há outros desafios, o primeiro deles é reativar o mercado interno", disse o presidente de centro-esquerda Alberto Fernández ao fazer o anúncio sobre o resultado da troca.
Um sólido acordo era fundamental para a Argentina, terceira maior economia da América Latina e um dos mais importantes produtores de grãos do mundo, sair da inadimplência em que caiu neste ano após uma recessão iniciada em 2018. Analistas preveem que a economia do país vai contrair cerca de 12,5% em 2020.
"A Argentina terá um alívio da dívida na próxima década de 37,7 bilhões de dólares e a taxa de juros média cai de 7% para 3,07%", disse o ministro da Economia, Martín Guzmán, durante o anúncio em que acompanhou o presidente Fernández.
Anuncios sobre el canje: "El 99% de la deuda pública ha quedado reestructurada" dijo @Martin_M_Guzman. pic.twitter.com/n3znjaXwjS
— Televisión Pública (@TV_Publica) August 31, 2020
Guzmán afirmou que se espera reduzir o déficit fiscal do país --que cresceu neste ano devido aos amplos gastos públicos para fazer frente aos efeitos da pandemia-- para 4,5% do PIB em 2021. A estimativa fará parte do projeto de Orçamento a ser enviado ao Congresso em setembro.
O forte apoio e as poucas possíveis resistências a esse swap contrastam com a reestruturação da dívida da Argentina de 2005, na qual credores com cerca de um quarto dos títulos rejeitaram um acordo, levando a mais de uma década de batalhas jurídicas.
Com a aceitação da troca de um valor total de 99% da dívida, Guzmán disse aos jornalistas que "faremos progressos na resolução do 1% restante; não consideramos isso um problema".
A Reuters informou na sexta-feira, quando o prazo para o acordo se encerrou, que o governo estava contando com forte apoio dos credores para um acordo.
Em um período de 45 dias, entre abril e maio de 2018, o peso argentino se desvalorizou 20% apesar de diversas intervenções do Banco Central, que elevou a taxa de juros para 40% ao ano, vendeu reservas internacionais e injetou mais de 10 bilhões de dólares na economia para sustentar a moeda.
Em 20 de junho de 2018, o FMI aprovou um empréstimo de 50 bilhões de dólares para atacar o déficit fiscal e a desvalorização da moeda. Em troca, o governo de Mauricio Macri se comprometeu com um severo programa de austeridade.
Em 26 de setembro de 2018, o FMI aumenta sua ajuda para US$ 57 bilhões.
A Argentina encerrou 2018 com inflação de 47,6%, a maior desde 1991. O peso perdeu metade de seu valor no ano.
Em 11 de agosto de 2019, o peronista de centro-esquerda Alberto Fernández obtém 48% dos votos no primeiro turno e se torna o favorito para as eleições presidenciais.
Ao longo dessa semana, o peso argentino se desvaloriza 20% e a taxa de juros chega a 80% ao ano.
Em 1º de setembro de 2019, é estabelecido um controle cambial que limita a aquisição de moeda estrangeira para pessoas físicas a 10.000 dólares por mês e restringe transferências de empresas para o exterior.
Em 27 de outubro de 2019, Alberto Fernández vence as eleições presidenciais.
Em 26 de novembro de 2019, o presidente eleito anuncia que não pedirá o desembolso da última parcela do empréstimo do FMI, que permanece em US$ 44 bilhões.
Em 10 de dezembro de 2019, ao assumir a presidência, Fernández insiste que a Argentina "tem vontade de pagar" sua dívida externa, mas não tem os recursos.
Em meados de dezembro de 2019, com uma dívida pública de 324 bilhões de dólares (90% do PIB), o novo governo anunciou medidas emergenciais, incluindo um imposto de 30% sobre compras e despesas em moeda estrangeira.
Em 6 de abril de 2020, a Argentina postergou até 2021 o pagamento de juros e amortizações de capital da dívida pública em dólares emitida no país (9,8 bilhões de dólares), em função do coronavírus.
Em 16 de abril de 2020, o Ministro da Economia, Martín Guzmán, anunciou uma oferta de swap de cerca de 66 bilhões de dólares em títulos a credores privados no exterior, com a qual o país pagaria 39 dólares para cada 100 de dívida, e com carência de três anos sem pagamentos, até 2023. Os credores rejeitam a proposta.
Em 22 de maio, a Argentina deixa de pagar 500 milhões de dólares em juros sobre três dos títulos sujeitos a swap e fica inadimplente pela segunda vez neste século.
Na última semana de julho, somam-se os juros de 600 milhões de dólares dos outros dois títulos.
No dia 4 de agosto, poucas horas após o término do prazo de adesão ao câmbio, o governo Fernández anunciou que chegou a um acordo com seus credores, que eleva a taxa de recuperação dos títulos a 54,8 dólares por 100, por meio do adiantamento do datas de pagamento.
No dia 31 de agosto, o governo anuncia o resultado do swap. Com a adesão de 93,55% dos credores, a dívida é reestruturada para 99% graças às cláusulas de ação coletiva que estendem a decisão da maioria aos restantes.
As mesmas condições se aplicarão à dívida emitida em dólares nos termos da legislação nacional, da ordem de 41,7 bilhões de dólares.