5 gráficos para entender a recessão que virou depressão
"Nossa recessão começa a ganhar características de depressão. Não é uma contração típica: é ampla, profunda e prolongada", diz Alberto Ramos, do Goldman Sachs
João Pedro Caleiro
Publicado em 3 de março de 2016 às 13h14.
Última atualização em 13 de setembro de 2016 às 14h18.
São Paulo - Os números da economia brasileira divulgados hoje pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) pintam um cenário sombrio. Depois de ficar praticamente estagnado em 2014, o PIB (Produto Interno Bruto) recuou 3,8% em 2015, o pior resultado desde 1990. "Nossa recessão começa a adquirir características de depressão econômica, marcada por 2 anos ou mais de contração, ou por queda de 10% ou mais do PIB per capita. Não é uma contração típica: ela é ampla, profunda e prolongada", diz Alberto Ramos, diretor de pesquisa para a América Latina do Goldman Sachs. 2016 pode ser ainda pior mesmo com alguma melhora significativa no cenário político, uma das principais raízes da crise. O carregamento estatístico faz com que a recessão de 2016 já esteja contratada mesmo que a economia pare de cair. A última vez que o Brasil teve dois anos seguidos de recessão foi em 1930 e 1931, resultado do crash de 1929 e suas repercussões globais. "Não vemos muita luz no fim do túnel no curto e médio prazo. A incerteza está muito grande e os níveis de confiança estão muito baixos, tanto dos consumidores quanto dos empresários", diz Marcel Balassiano, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas. O último Boletim Focus prevê queda de 3,45% em 2016 e "recuperação" de 0,5% em 2017. A MB Associados espera algo no intervalo entre -3,8% e -4,9% este ano e o IBRE estima nova queda de 0,7% em 2017. Veja a seguir 5 gráficos que resumem os resultados do PIB divulgados hoje pelo IBGE:
O PIB per capita fechou 2015 em R$ 28.876, o que representa uma queda de 4,6% em relação a 2014, quando já havia recuado 0,8%. Ele costuma ficar cerca de um ponto percentual abaixo do crescimento econômico, já que leva em conta também o aumento da população. Veja a média de crescimento do PIB brasileiro por governo:
E por década:
Governo | Crescimento |
---|---|
FHC 1 | 2,5% |
FHC 2 | 2,2% |
Lula 1 | 3,5% |
Lula 2 | 4,7% |
Dilma I | 2,2% |
Década | Taxa média |
---|---|
1961-1970 | 6,2% |
1971-1980 | 8,6% |
1981-1990 | 1,6% |
1991-2000 | 2,5% |
2001-2010 | 3,7% |
2011-2015 | 1% |
"A única coisa que continua segurando alguma coisa do lado da oferta é a agropecuária, mas com um impacto relativamente pequeno e não suficiente para fazer um contrapeso a serviços", diz Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados. Indústria e comércio são os grandes afetados por uma combinação explosiva de falta de confiança, agravada pela crise política, com queda do crédito e da renda em um momento de desemprego e inflação em alta. "Por erros cometidos no passado de politica econômica, chegamos a esta recessão. As empresas não investem, o desemprego aumenta, daí as famílias consomem menos, afetando o comércio. Ao mesmo tempo, a inflação não está na meta desde 2009, o que corrói o poder de compra", diz Marcel. O governo havia deixado vários preços administrados (como luz e gasolina) congelados por muito tempo e se viu pressionado a liberar tudo de uma vez. Isso ajudou a levar a inflação em 2015 para 10,67%, maior nível desde 2002. Inflação e desemprego são os componentes da "infelicidade" da população, índice que está disparando por aqui. A previsão do IBRE/FGV é que o desemprego medido pela PNAD Contínua, que foi de 6,8% em 2014, pule para 11,8% em 2016 e 13,1% em 2017.
O investimento (FBCF, no gráfico) começou a ceder antes, mas eventualmente acabou batendo no consumo das famílias, que permaneciam positivos há mais de uma década. "A novidade em relação a outros momentos é o consumo das famílias e os serviços caírem nessa proporção. Eles costumam ser mais resilientes, como foi na recessão de 2009", diz Sérgio Vale. O consumo do governo, responsável por cerca de 20% do peso, já começou a contribuir negativamente para o PIB. A deterioração das contas públicas nos últimos anos comeu a margem que poderia ser usada agora para estimular a economia. Em outras palavras: o governo poderia ser parte da solução, mas como não se preparou, virou parte do problema. "Sempre que tem ajuste fiscal você tem queda do consumo do governo. O problema é que o fiscal é um dos elementos da crise. Você não tem espaço para fazer um estímulo - em 2008 o fiscal era elemento de auxilio, agora é de empecilho", diz Vale.
"Se não fosse a contribuição do setor externo, o PIB teria uma queda ainda maior. E essa contribuição ainda está muito calcada na queda abrupta das importações, causada mais pelo recuo do consumo e do investimento do que pelo efeito de maior preço com a mudança de patamar no câmbio", diz Ramos. O Brasil tem a economia mais fechada do G-20 e as exportações representam apenas 12% do nosso PIB, então o impacto disso é limitado. Além disso, a demanda do mundo não está em um de seus melhores momentos. Ainda assim, a contribuição do setor deve seguir positiva. A balança comercial brasileira teve superávit de US$ 3 bilhões de dólares em fevereiro, recorde para o mês, e a previsão de superávit no ano subiu para US$ 40 bilhões, segundo o Boletim Focus. Se não fosse por isso, a "sensação térmica" da crise seria ainda maior aqui dentro, disse recentemente Ilan Goldfajn, economista-chefe do Itaú Unibanco.
A formação bruta de capital fixo (o investimento) no Brasil é muito baixa como proporção do PIB na comparação com outros emergentes, e aumentar este número é central para turbinar nosso potencial de crescimento. É por isso que assustam os resultados divulgados hoje: o investimento cai há 10 trimestres consecutivos e no último trimestre de 2015 recuou 18,5% em relação ao mesmo período de 2014. "É algo extraordinário. A força de trabalho precisa de capital para ser produtiva. O estoque de capital está encolhendo, e isso vai afetar a produtividade e a capacidade da economia de responder quando a economia se estabilizar", diz Ramos. Em 2 anos, o investimento perdeu 2,7 pontos percentuais em relação ao PIB. Como 90% dos gastos do governo são engessados por lei, os investimentos são sempre as primeiras vítimas dos cortes orçamentários, o que só agrava esse processo.
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