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Paul McCartney acena às novas gerações com "McCartney III Imagined"

O mesmo álbum que ele produziu solitariamente durante a pandemia, em 2020, tocando todos os instrumentos e fazendo todas as vozes, ressurge com tratamentos diferentes para cada uma das faixas

O ex-beatle em 2018 (Jim Dyson/Getty Images)
EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 7 de abril de 2021 às 09h31.

Última atualização em 7 de abril de 2021 às 09h35.

Um pouco mais de três meses depois de lançar seu mais recente álbum, McCartney III, Paul McCartney volta à cena com uma bem pensada ação fonográfica geracional. McCartney III Imagined parte de um princípio simples, mas pouco utilizado em grandes lançamentos feitos por artistas de sua geração. O mesmo álbum que ele produziu solitariamente durante a pandemia, em 2020, tocando todos os instrumentos e fazendo todas as vozes, ressurge com tratamentos diferentes para cada uma das faixas.

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McCartney, diz um texto enviado pela gravadora, escolheu ele mesmo os artistas aos quais entregaria cada uma das canções para que eles as arranjassem como bem quisessem. O resultado tem uma temperatura oscilante, mas a proposta, como escreveu a revista Rolling Stone dos Estados Unidos, pode ser, em muitos momentos, "um exemplo para todos nós”.

Como o reverso de sua versão original lançada em dezembro de 2020, feita com Paul em isolamento assim como foram feitos os antecessores da trilogia McCartney, de 1970, em um doloroso período de isolamento emocional pós-Beatles, e McCartney II, de 1980, depois do fim dos Wings, McCartney Imagined é o imaginário de um coletivo feito sem nenhum contato entre as partes.

A curadoria feita pelo próprio Paul traz Beck na abertura do disco, retrabalhando Find My Way. A original tem uma proposta eletrônica em sua base que Beck radicaliza, abaixando um tom e a tornando um pouco mais arrastada. Mas a mudança em The Kiss of Venus é mais profunda. O nome escolhido para seu remix é Dominic Fike - e agora começamos a entender parte da proposta do beatle, analisando quem é quem nesse jogo em que as duas partes podem sair ganhando.

Dominic Fike é um rapper norte-americano de 24 anos, descendente de filipinos e que iniciou sua ficha policial aos 21 ao agredir a um guarda nos Estados Unidos. Mas nada disso importou à gravadora Columbia Records, que percebeu o poder de mobilização do garoto e o contratou por uma soma de US$ 4 milhões. Paul McCartney não é bobo. Estar ao lado de Dominic Fike, por mais que as sutilezas de sua bela The Kiss of Venus apareçam reconfiguradas e sem as mesmas delicadezas, nesse momento, vale mais do que ter ao lado a colaboração de um contemporâneo. É preciso se conectar com as gerações que podem não saber quem foram os Beatles. E por mais que a ideia ainda pareça um absurdo sim, esse dia pode chegar em um futuro não distante.

Existe ainda mais coragem na faixa seguinte, Pretty Boys, ressurgida experimental, fantasiosa e livre mesmo das métricas rítmicas de Paul. É como se a canção fosse estilhaçada e refeita com alguns de seus cacos. Mas um artista só pode ter a intenção de ouvir algo distante de si mesmo quando pede um remix ao trio de rock norte-americano Khruangbin. O nome em tailandês significa avião, algo que passa a ideia de um som flutuante entre o psicodelismo, as culturas do Oriente Médio e o rock proposto por Laura Lee (baixo), Mark Speer (guitarra) e Donald DJ Johnson (bateria).

Paul inspirou-se em Johnny Cash para fazer Women and Wives, linda e dramática. A versão de agora aparece assinada pela cantora St. Vincent. Ela faz alguns contracantos, mas não altera a estrutura da canção. A voz de Paul conduz a música como se nada acontecesse a seu redor, transpassando sopros, guitarras e teclados que não mudam seu curso. É uma versão que não faz sentido, aprisionada ao excesso de respeito. Melhor seria revirar tudo, como fez Dominic, e trazer alguma informação sensorial nova além da original.

O cantor e compositor Devonté Hynes é um exemplo mais extremo de ousadia. Mais conhecido como Blood Orange, mas que também já foi Lightspeed Champion, é um produtor inglês que nasceu e foi criado em Ilford, a oeste de Londres, filho de mãe guianense e pai de Serra Leoa. Se foi Paul mesmo quem o escolheu, os sinais de suas antenas estão poderosos. Blood Orange desmonta a canção Deep Down e cria outra, sem muitas referências da original.

Seize the Day, uma das mais conhecidas do álbum de Paul, vem bem preservada na voz de Phoebe Bridgers, uma cantora e guitarrista de 26 anos de Pasadena, Califórnia. Phoebe é a ponte com as frentes teen, e seu último álbum, lançado em 2020, tem faixas interessantes como Kyoto e I Know the End. Ela é melancólica e sua voz tem tristeza e sofrimento. Ao cantar, então, faz quase que um cover de uma canção que já tinha suas belezas. Mas a Seize The Day de Phoebe se distancia da de Paul pela voz feminina. Na outra ponta geracional, Ed O’Brien, de 52 anos, guitarrista do Radiohead, e o produtor Paul Richard Epworth, de 46, colocam fúria na canção Slidin’.

O londrino Damon Albarn, de Blur e Gorillaz, não fez nada marcante com Long Tailed Winter Bird. O tema original, que já não era dos mais inspirados, desaparece nas interferências. Ao final das duas audições, nem Paul nem Damon dizem muito a que esse tema instrumental veio. Com Lavatory Lil, Josh Homme, guitarrista e vocalista do Queens of the Stone Age, segue as pistas de Paul sem se descolar da gravação original. A aventura de colabs termina com Anderson .Paak fazendo When Winter Comes e o projeto 3D, de Robert Del Naja, interferindo em Deep Deep Feeling. As conexões com o novo tempo não são tão simples assim.

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