Negros, mulheres e política reinam em videoclipes indicados ao Grammy
Todos os candidatos para a categoria "melhor videoclipe" são negros e a metade é composta por mulheres
AFP
Publicado em 9 de fevereiro de 2019 às 11h55.
Última atualização em 9 de fevereiro de 2019 às 11h56.
Os prêmios Grammy são regularmente acusados de promover artistas homens e brancos. Mas este ano devem escapar dessas críticas graças à categoria "Melhor Videoclipe", em que todos os candidatos são negros e a metade é de mulheres.
Os cinco vídeos selecionados pelos organizadores da cerimônia, que será realizada no domingo em Los Angeles , também têm muito a dizer por suas reivindicações sociais e políticas.
"É o ano de Trump. Há uma necessidade incontrolável de se expressar", analisa Carol Vernallis, acadêmica especializada em música da Universidade de Stanford. "Imagino que os artistas negros dos Estados Unidos querem estar na linha de frente", continua.
Childish Gambino, alter ego musical do talentoso comediante, roteirista e diretor Donald Glover ("Atlanta"), estourou na Internet na primavera passada como seu hino politicamente incendiário, "This is America".
Em seu vídeo provocador, ele denuncia o domínio das armas e do racismo no país com um retrato da vida de muitos negros americanos, entre tiroteios sangrentos e reminiscências da escravidão em um contexto de alegres ritmos afrobeat e gospel.
Já Beyoncé e Jay-Z deram o que falar ao usar o Museu do Louvre, em Paris, como cenário do clipe barroco e exuberante de "APESHIT". No vídeo, o casal usa as obras clássicas do Velho Mundo para criar uma estética eminentemente moderna e negra.
Janelle Monae, por sua vez, explora sem pudor novos caminhos gráficos no clipe "Pynk", uma ode electropop à bissexualidade. A cantora aparece rodeada de mulheres jovens, vestindo calças amplas que lembram vulvas.
Assim como Childish Gambino, o vídeo "I'm Not Racist", de Joyner Lucas, atraiu milhões de espectadores na Internet com seu rap puro e poderoso em um Estados Unidos dividido.
O vídeo perturbador começa com um homem de barba branca e gorro vermelho de "Make America Great Again", símbolo dos partidários do presidente Donald Trump, fazendo eco a slogans racistas. Mas "eu não sou um racista", defende-se o homem. "O namorado da minha irmã é negro".
Um jovem negro com cabelo rasta responde: "É difícil progredir quando este país está dirigido por brancos/que me julgam pela cor da minha pele".
Mais da metade da transmissão mundial
Em "Mumbo Jumbo", a rapper Tierra Whack cria um mundo da fantasia surrealista e inquietante, o prelúdio de um álbum composto por quinze canções de um minuto cada, chamado "Whack World", parte de um projeto de vanguarda e também um álbum de hip hop.
Os Grammy premiam videoclipes desde 1984, ano em que a MTV começou a fazer um programa, graças a pioneiros como Michael Jackson e Madonna, que revolucionaram e exploraram o potencial deste formato.
Tornou-se um gênero completo, graças à Internet: os videoclipes representam em duração mais da metade da demanda mundial de streaming.
Com as repercussões potenciais de centenas de milhões de reproduções, produzir um vídeo atraente se tornou mais importante do que nunca para a indústria da música, permitindo aos artistas comunicar melhor mensagem, diz Robert Thompson, que leciona cultura televisiva e popular na Universidade de Syracuse.
"Um videoclipe define a identidade visual de uma canção, não posso imaginar 'This Is America' com outro vídeo, lhe dá uma dimensão completamente diferente", explica.
Para Carol Vernallis, o vídeo tem sobretudo o mérito de instaurar "um diálogo" entre a música e a imagem: "Enriquece a canção e amplia seu horizonte, e é excelente para abordar certos problemas".
Esto é especialmente certo para os temas sociais, diz Robert Thompson. "De todas as partes vemos surgir mensagens políticas expressas por músicos negros. E é nesta categoria dos Grammy que parecem gozar de um reconhecimento especial", observa o pesquisador.
"O que é triste é quatro de cada cinco vão perder" na noite de domingo, lamenta.