Saneamento no foco das eleições municipais de 2024: uma corrida contra o tempo
OPINIÃO | Como eleitores, devemos nos atentar para que optemos por governantes que estejam comprometidos com esses objetivos
Redação Exame
Publicado em 23 de julho de 2024 às 06h20.
Por Luana Pretto, Fernando Marcato, Isadora Cohen e Rodrigo Urrutia*
Em pleno 2024, 90 milhões de brasileiros não têm acesso ao tratamento de esgoto e cerca de 32 milhões não estão conectados às redes de abastecimento de água tratada [1].
Aprovado em 2020 e visando mudar esse cenário, o novo Marco Legal do Saneamento (Lei nº 14.026/2020)[2]trouxe uma série de mudanças estruturais e metas ambiciosas para a universalização dos serviços de saneamento básico. Visando a transparência, o marco estimulou a competição ao estabelecer a necessidade de processo licitatório para todas as futuras concorrências à delegação dos serviços; incentivou alternativas como PPPs e concessões e destacou a responsabilidade dos gestores municipais por universalizar os serviços de saneamento básico em seu território. Nesse particular, definiu que até 2033, 99% da população deverá ter acesso a água potável e 90% ao tratamento e coleta de esgoto.
Leia mais:No ritmo atual, universalização do sanaemento no Brasil só acontecerá em 2070, aponta estudo
A realidade, entretanto, é muito discrepante. Um estudo publicado pelo Instituto Trata Brasil no dia 15 de julho, data que marca o quarto ano de vigência do novo marco,[3]revelou que, no ritmo atual, a universalização do saneamento só acontecerá em 2070, representando um atraso de 37 anos em relação à data limite estabelecida.
Teríamos, contados de agora, pouco mais de 9 anos para acelerar o ritmo de implementação da universalização do saneamento básico e atingir a meta do novo Marco do Saneamento Básico.
Paralelamente, há uma corrida para as candidaturas do executivo e legislativo municipais, cujos ganhadores serão conhecidos em quatro meses. Inclusive, caso esses cumpram dois mandatos a partir de 2025, estarão no poder até um ano antes de quando o prazo do marco se encerrar em 2033.
Cartilha para candidatos
Pensando nisso, o Instituto Trata Brasil, em parceria com a ICO Consultoria, lançou a Cartilha de Orientação para os Candidatos às Eleições Municipais de 2024 , abordando a importância da universalização do saneamento básico até o ano de 2033. Trata-se de um manual acerca da responsabilidade e ferramentas que os futuros prefeitos e vereadores poderão utilizar para alcançar as metas estabelecidas no novo Marco Legal do Saneamento. Junto com a cartilha, também foi disponibilizado um material modelo com sugestões de propostas que os candidatos e candidatas podem abraçar em seus planos de governo.
Como definido no marco, os serviços de saneamento podem ser prestados por diferentes modelos, cada um com suas especificidades e desafios. A cartilha esclarece que, onde já existem contratos celebrados com companhias públicas, estes podem continuar desde que as estatais atendam aos níveis e indicadores estabelecidos pela legislação e apresentem capacidade econômico-financeira para, de fato, levar a cobertura necessária dos serviços à população.
Para os municípios que não possuem contratos vigentes ou cujas estatais não atendem aos padrões exigidos, as concessões e PPPs surgem como alternativas viáveis para aumento no volume de investimentos nessa infraestrutura. Este modelo tem sido adotado em diferentes localidades (como a região metropolitana do Rio de Janeiro - RJ, Cariacica - ES, Manaus - AM, Amapá, Alagoas, entre outros) com resultados positivos, contribuindo significativamente para a melhoria dos serviços de saneamento e a aceleração do cumprimento das metas.
A cartilha também aborda os desafios e oportunidades que os municípios enfrentam ao optar por concessões e PPPs e pela junção de municípios para a prestação de serviços (o que é chamado de regionalização). Embora esses modelos possam oferecer soluções inovadoras e eficientes, é crucial que os gestores públicos realizem processos transparentes e bem planejados, garantindo que os contratos estabelecidos atendam aos interesses da população e assegurem a prestação de serviços de qualidade.
É mais do que necessário, portanto, que os candidatos informem aos eleitores, em seus planos de governo, qual sua estratégia e como pretendem cumprir com a meta do Marco do Saneamento. Afinal, a omissão em garantir o atendimento das metas do Novo Marco pode gerar responsabilidade civil e até criminal aos gestores municipais.
Nós, como eleitores, devemos nos atentar para que optemos por governantes que estejam comprometidos com esses objetivos. É chegada a hora de qualificar o debate político com propostas concretas para assegurar que essa meta ambiciosa seja cumprida e que façamos a inclusão, de forma definitiva, dos milhões brasileiros ao ciclo de desenvolvimento que acompanha o acesso à água tratada e a coleta e tratamento dos esgotos. A implementação das diretrizes do Marco do Saneamento é um passo essencial para transformar essa visão em realidade, garantindo que o acesso ao saneamento básico deixe de ser um privilégio e se torne um direito universal.
*Luana Pretto é CEO do Instituto Trata Brasil
*Isadora Cohen – Sócia ICO Consultoria
*Fernando Marcato – Sócio ICO Consultoria
*Rodrigo Urrutia – Consultor ICO Consultoria
[1]Disponível em: https://tratabrasil.org.br/saneamento-basico-e-as-eleicoes/#. Acesso em 17 de julho de 2024.
[2]Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2020/Lei/L14026.htm. Acesso em 17 de julho de 2024.
[3]Disponível em: https://tratabrasil.org.br/avancos-do-novo-marco-legal-do-saneamento-basico-no-brasil-2024-snis-2022/. Acesso em 17 de julho de 2024.