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A tática diversionista de Temer

Sem se defender das denúncias, presidente tenta deslegitimar Janot, os procuradores da República e os sócios da JBS

MICHEL TEMER: presidente atacou o procurador-geral da República em pronunciamento / Ueslei Marcelino Reuter (Ueslei Marcelino/Reuters/Reuters)

Raphael Martins

Publicado em 27 de junho de 2017 às 18h44.

Última atualização em 28 de junho de 2017 às 14h50.

Mais uma vez, os olhos do país voltam-se à Brasília. Nesta terça, oposicionistas foram aos microfones ressaltar o peso da denúncia contra o presidente Michel Temer, acusado de ser o destinatário final de 500.000 reais em dinheiro vivo no caso da J&F pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Por outro lado, a estratégia do do Palácio do Planalto é aglutinar a base para arquivar a denúncia o quanto antes.

No meio tempo, a tática diversionista do governo é deslegitimar Janot, os procuradores e a JBS. Na tarde desta terça-feira, Temer fez um pronunciamento atacou o procurador-geral, dizendo se tratar de uma acusação baseada em “ilações”, abrindo um precedente “perigosíssimo ao nosso Direito”. “Não me impressiono com falta de fundamentos jurídicos. Sei quando há fundamentação”, disse. “Onde estão as provas de recebimento desses valores? Inexistem”.

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No discurso, o presidente ignora as ações controladas da Polícia Federal e como foi ligado ao recebimento do dinheiro: seu fiel escudeiro, o ex-deputado federal Rodrigo Rocha Loures, foi gravado correndo com a famosa mala. Em seu discurso, Temer despreza as conclusões do relatório da PF que indicam que o áudio gravado por Joesley Batista não apresenta edição nos diálogos. Temer voltou a dizer que a escuta é “ilícita” e possui cortes, conforme teria apontado sua perícia particular.

Rocha Loures não foi citado diretamente no discurso. Ele foi apontado indiretamente apenas para fazer uma correlação entre os ganhos do escritório de advocacia — que defende a J&F — em que trabalha o ex-procurador Marcelo Miller. O presidente insinuou que o dinheiro seria repassado a Janot. Chamou a narrativa do procurador-geral de “ficção de novela”.  “Fatiam a denúncia para tentar parar o país”. Até a publicação desta reportagem, o MPF não havia se manifestado sobre o discurso.

Em outro momento de sua fala, Temer diz defender a “instituição da Presidência da República”. “A minha disposição não diminuirá com ataques irresponsáveis à instituição Presidência da República, não quero ataques a ela, e muito menos ao homem Michel Temer”, diz . A defesa de Temer acontece, é bom lembrar, ao mesmo tempo em que ataca outras instituições da República: a Procuradoria-Geral da República, o Ministério Público Federal e a PF.

O artigo 86 da Constituição, que dispõe sobre o afastamento do presidente, parece uma blindagem protegendo-o de todos os males. “A barreira se faz porque o julgamento de um presidente da República não é apenas jurídico, mas político. Precisa-se de freios e contrapesos para garantir estabilidade”, diz Gustavo Badaró, professor de Direito Penal da USP. “Isso é um dificultador em relação ao cidadão comum? Claro que sim, mas o dispositivo de proteção não é o problema. É nosso sistema político que faz com que o Legislativo dependa fortemente do Executivo”.

Para Flávio de Leão Bastos Pereira, professor de Direito Constitucional da Universidade Presbiteriana Mackenzie, a tendência é a mesma: “A percepção é que o dispositivo para proteger a função de presidente passa a proteger a pessoa. O instituto está sendo distorcido, mas é mais uma pauta para entrar em uma reforma política, para que seja usado adequadamente”.

O quórum de 342 votos, dois terços da Câmara, necessário para enviar a denúncia ao Supremo parece inatingível. Durante os melhores momentos, Michel Temer teve 70% de apoio na Câmara. Foi durante os dois turnos de votação da PEC do teto de gastos entre outubro e novembro de 2016. Para ter menos do que 171 votos, a situação de Temer terá que se deteriorar ainda mais.

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