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Funcionário manipula aves abatidas não infectadas em uma planta de tratamento como parte de medidas preventivas contra a gripe aviária H7N9, em Guangzhou, na província de Guangdong (Reprodução/Reuters)
Repórter de Agro
Publicado em 2 de junho de 2023 às 16h07.
Última atualização em 2 de junho de 2023 às 17h59.
A Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA) tem discutido sobre a vacinação de aves para o controle global da influenza aviária de alta patogenicidade (IAAP). O vírus H5N1, que espalha a chamada gripe aviária ou gripe do frango, está se alastrando por diferentes regiões do mundo por causa do comportamento de migração de aves silvestres e aquáticas.
O ponto de discussão do setor avícola é que a medida pode mexer nos custos de produção e na dinâmica das exportações da indústria. Espécies silvestres e aquáticas migratórias são de difícil controle sanitário, o que significa ser complicado vaciná-las. Então, a recomendação recai principalmente para a cadeia avícola, que tem se mostrado reativa.
No Brasil, houve a confirmação de oito aves silvestres contaminadas pela influenza aviária ao longo do mês de maio, nos estados do Espírito Santo e Rio de Janeiro, segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). “A primeira corrente migratória aconteceu nos países ligados ao Pacífico, com aves migratórias, leões marinhos e outras espécies. Agora, no Brasil, a gente está vivenciando uma corrente migratória do Atlântico”, diz Nelva Grando, médica veterinária especialista em saúde animal e biosseguridade na cadeia avícola.
De acordo com Ricardo Santin, presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), a vacinação não resolve o problema da infestação da influenza, pois o maior potencial de contaminação do vírus está nas aves fora da criação industrial.
“Temos uma operação de guerra para evitar que a doença entre nos aviários, protocolos rigorosos como o uso de EPIs [equipamentos de proteção individual]. Quando se fala na vacinação, não resolve todo o problema, além de ter um custo adicional das vacinas, veterinários, logística”, diz.
O Brasil nunca tinha vivenciado uma situação de a gripe aviária estar tão presente em território nacional, segundo Nelva Grando. Mesmo assim, ela explica, a vacinação das aves não impede a proliferação do vírus, ainda que reduza os sinais clínicos e a mortalidade. “A vacinação pode, inclusive, disfarçar o aparecimento de sinais [da influenza aviária] por agentes secundários, mas não vai impedir na totalidade que o vírus se multiplique”, diz.
Não é de hoje que os vírus da influenza aviária são assunto no mundo. Nelva conta que o México é endêmico desde 1995 e a Itália teve alta de casos em 2001. “Entre 2004 e 2005, [o vírus] acometeu o continente asiático, e as exportações da Indonésia que eram significativas mudaram para zero da noite para o dia”, afirma. Foi nesta época que acendeu o alerta no Brasil para precauções. Desde 2006 o país se prepara para impedir casos de influenza aviária.
Após um grande surto nos Estados Unidos, em 2012, o vírus H5N1 sofreu algumas mutações na América do Norte, mudou suas características e começou a se disseminar pelas aves migratórias. “Além de se multiplicar com agilidade, o potencial dele de disseminação aumentou”, diz Nelva, que também é especialista em planos estratégicos para prevenção de influenza aviária.
No último relatório da OMSA – referente ao período de 21 de abril a 4 de maio – foram encontrados 12 novos casos em aves na Argentina, Canadá, República Tcheca, Dinamarca, Hungria, Itália e África do Sul. E mais: entre 2005 e 2019, 76 países foram afetados por 18,62 mil casos de contaminação em aves.A epidemia atual é a maior já observada na Europa, segundo a organização, com 6.614 casos detectados entre outubro de 2021 e setembro de 2022, em 37 países europeus.
Com isso, cerca de 50 milhões de aves foram abatidas nas fazendas afetadas, de acordo com a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar.
Dentro deste contexto global, a discussão sobre vacinação também esbarra no comércio internacional. Uma das deliberações da Organização Mundial de Saúde Animal é que os países não imponham barreiras a quem utilizar a vacina. Cada país é autônomo e pode decidir se adere ou não à profilaxia. No entanto, uma pesquisa realizada pela organização revelou que apenas 25% dos países membros estariam dispostos a aceitar a importação de produtos de aves vacinadas contra a IAAP.
Na teoria, países que passam a vacinar podem perder mercado e deixar de exportar. “É mais uma questão política de exportação e de requisito dos países importadores, do que realmente um problema”, afirma Nelva Grando.
Ricardo Santin, da ABPA, diz que há conversas em andamento com importadores para esclarecer os controles de biosseguridade, sem o risco de fechamento de mercados. Para ele, a vacinação é importante, desde que haja estratégias, como por exemplo em focos do vírus em plantéis e regiões específicas.
Atualmente, a força-tarefa estruturada para evitar a doença ou detectá-la rapidamente conta com o uso de drones para monitorar qualquer suspeita. O monitoramento, inclusive, é feito em um raio a partir de três quilômetros, para medidas de proteção, e sete quilômetros para vigilância. A ave doente precisa ser sacrificada, porque não há cura pela alta patogenicidade.
“Temos aves silvestres contaminadas no território brasileiro, algo que nunca existiu. Se tiver qualquer percepção e sinal do vírus, isso deve ser comunicado como suspeita e fazer a investigação para eliminação do foco o quanto antes. O papel do setor público é de verificação e diagnóstico. Quem está à frente das granjas são os produtores e empresas, os verdadeiros guardiões dos plantéis”, diz Nelva Grando.