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Operadoras e governo não chegam a acordo sobre celulares

Telefônicas e autoridades tentam se eximir da responsabilidade de impedir que celulares sejam usados em presídios

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 15 de fevereiro de 2013 às 17h15.

A ordem partiu de um telefone celular, venceu os muros de uma penitenciária transportada por uma rede de telefonia e chegou à outra ponta da linha sob as vistas do governo. Foi com o serviço das operadoras e a falta de vigilância do Estado que presidiários, membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), segundo a polícia, orquestraram uma série de ataques que causaram a morte de 115 pessoas em três dias. Não é a primeira vez que se vêem presos organizando crimes cometidos fora das grades, mas a dimensão deste movimento - que chegou aos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná - serviu para mostrar a falta de sintonia entre aqueles que deveriam vigiar as prisões e os que deveriam vigiar as linhas telefônicas.

Tanto o governo quanto as operadoras sabem que há modos de impedir que presidiários usem os telefones. Sem contar o combate à corrupção de agentes penitenciários, que arranjam meios de entregar aparelhos aos detentos, é possível deter as conversas por meio de aparelhos conhecidos como bloqueadores ou da eliminação de antenas de telefonia celular que fiquem próximas às prisões. Os bloqueadores já estão presentes no Estado em algumas unidades prisionais, como a de Presidente Berrnardes, de regime fechado, mas não conseguem coibir a ação dos presos.

De acordo com especialistas, o motivo é a falta de atualização dos dispositivos, que não podem competir com a agilidade do surgimento de novas freqüências na telefonia celular. Hoje as operadores atuam em duas faixas: entre 800 e 900 megahertz e 1600 e 1900 megahertz, de acordo com os analistas. Se uma nova empresa entra no mercado e inaugura uma freqüência fora de uma dessas faixas, um presídio equipado com um bloqueador precisará automaticamente de atualização, e isso demanda recursos. "O que vemos é resultado da inércia do governo", diz João Antônio Zuffo, professor de Engenharia Eletrônica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Para ele, falta vontade política de destinar dinheiro para as unidades prisionais que já têm os bloqueadores e para as que ainda não estão preparadas para evitar a comunicação dos presos com o mundo exterior. "O preço dos aparelhos não justifica o que tivemos nestes dias em São Paulo", declara.

Solução à mão do governo

Nas contas de Luiz Carlos Kretly, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), com cerca de 150 000 reais é possível equipar uma penitenciária com bloqueadores. O professor de microeletrônica e circuitos de radiofrequência reforça o coro dos que acreditam que depende do governo, e não das operadoras, a contenção das ligações dos presos. "Dizer que é responsabilidade das operadoras é culpar as árvores pelo incêndio. Os ataques são um problema ligado à segurança pública." O gerente de uma fabricante nacional de bloqueadores, que preferiu não se identificar para evitar "represálias", é mais um que acusou o governo de estados, e especialmente o de São Paulo, de negligência na manutenção. Ele confirma que o serviço dos aparelhos não é 100% confiável, mas atribuiu as falhas justamente à falta de atualização. "Em algumas unidades foram instalados bloqueadores na época em que existiam apenas Vivo e BCP; hoje já temos 11, 12 operadoras no país", diz o executivo.

Procurada, a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo não comentou as críticas e alegações. Mas em entrevista nesta terça-feira (16/2), o ministro das Comunicações, Hélio Costa, confirmou que é dos governos estaduais a responsabilidade de controlar as tentativas de presos. "Só falta o responsável pela segurança nos presídios, ou seja, os governos estaduais, comprarem os equipamentos e implantarem os equipamentos", afirmou Costa.

Escaldadas pela repercussão da violência e do caos vividos pelos habitantes de São Paulo na segunda-feira (15/2), dia em que até empresas liberaram funcionários mais cedo com medo de um suposto toque de recolher, as operadoras de telefonia celular trataram de responder em conjunto aos questionamentos sobre as ligações feitas de dentro de presídios. Por meio da Associação Nacional dos Prestadores de Serviço Móvel Celular (Acel), afirmaram que não lhes compete bloquear as chamadas realizadas por presos, e sim ao governo. A declaração foi apoiada por nota emitida pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) que as exime - e também libera a própria agência - de qualquer responsabilidade sobre a instalação e operação dos dispositivos que impedem as ligações.

A cobrança maior sobre as operadoras, no entanto, é para que cortem os sinais de antenas próximas a penitenciárias. Elas reclamam que isso representaria eliminar também o fornecimento de serviço àqueles que vivem nas proximidades, o que pode significar até mesmo o desabastecimento de toda a população de cidades pequenas, dependendo do raio de cada antena de transmissão, ou estação radiobase, como são chamadas no jargão técnico.Esse, no entanto, parece ser o caminho escolhido pelo governo para acalmar as reivindicações da sociedade de providências contra as ligações nos presídios. Nenhuma operadora comenta individualmente a possibilidade, mas na segunda-feira elas se reuniram com o governo do Estado de São Paulo para chegar a um acordo sobre a atuação em regiões próximas a unidades prisionais. No mesmo dia, a Anatel também discutiu o assunto - a agência não divulga, mas comenta-se que se chegou à conclusão de que a saída seria obrigar as operadoras a cortarem o sinal de algumas antenas no caso de um pedido formal do governo ou de decisão do Judiciário nesse sentido.

Controle no mundo

De acordo com o professor Zuffo, da Poli, controlar as ligações de celulares é algo tão simples que é procedimento comum em países como Estados Unidos e Israel. "Os bloqueadores são usados em penitenciárias e na proteção de embaixadas, instalações militares, até carros, com sistemas portáteis", diz.

Nos Estados Unidos, os celulares também se tornaram objeto de estudo obrigatório para muitas centrais de segurança depois dos atentados terroristas de 2001. Mas em solo americano, a ordem não é impedir as chamadas, e sim espioná-las. A prática foi referendada pelo presidente George W. Bush, que autorizou que a NSA (National Security Agency) ouça ligações internacionais de suspeitos com a aprovação da Justiça do país.

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A ordem partiu de um telefone celular, venceu os muros de uma penitenciária transportada por uma rede de telefonia e chegou à outra ponta da linha sob as vistas do governo. Foi com o serviço das operadoras e a falta de vigilância do Estado que presidiários, membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), segundo a polícia, orquestraram uma série de ataques que causaram a morte de 115 pessoas em três dias. Não é a primeira vez que se vêem presos organizando crimes cometidos fora das grades, mas a dimensão deste movimento - que chegou aos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Paraná - serviu para mostrar a falta de sintonia entre aqueles que deveriam vigiar as prisões e os que deveriam vigiar as linhas telefônicas.

Tanto o governo quanto as operadoras sabem que há modos de impedir que presidiários usem os telefones. Sem contar o combate à corrupção de agentes penitenciários, que arranjam meios de entregar aparelhos aos detentos, é possível deter as conversas por meio de aparelhos conhecidos como bloqueadores ou da eliminação de antenas de telefonia celular que fiquem próximas às prisões. Os bloqueadores já estão presentes no Estado em algumas unidades prisionais, como a de Presidente Berrnardes, de regime fechado, mas não conseguem coibir a ação dos presos.

De acordo com especialistas, o motivo é a falta de atualização dos dispositivos, que não podem competir com a agilidade do surgimento de novas freqüências na telefonia celular. Hoje as operadores atuam em duas faixas: entre 800 e 900 megahertz e 1600 e 1900 megahertz, de acordo com os analistas. Se uma nova empresa entra no mercado e inaugura uma freqüência fora de uma dessas faixas, um presídio equipado com um bloqueador precisará automaticamente de atualização, e isso demanda recursos. "O que vemos é resultado da inércia do governo", diz João Antônio Zuffo, professor de Engenharia Eletrônica da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Para ele, falta vontade política de destinar dinheiro para as unidades prisionais que já têm os bloqueadores e para as que ainda não estão preparadas para evitar a comunicação dos presos com o mundo exterior. "O preço dos aparelhos não justifica o que tivemos nestes dias em São Paulo", declara.

Solução à mão do governo

Nas contas de Luiz Carlos Kretly, da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), com cerca de 150 000 reais é possível equipar uma penitenciária com bloqueadores. O professor de microeletrônica e circuitos de radiofrequência reforça o coro dos que acreditam que depende do governo, e não das operadoras, a contenção das ligações dos presos. "Dizer que é responsabilidade das operadoras é culpar as árvores pelo incêndio. Os ataques são um problema ligado à segurança pública." O gerente de uma fabricante nacional de bloqueadores, que preferiu não se identificar para evitar "represálias", é mais um que acusou o governo de estados, e especialmente o de São Paulo, de negligência na manutenção. Ele confirma que o serviço dos aparelhos não é 100% confiável, mas atribuiu as falhas justamente à falta de atualização. "Em algumas unidades foram instalados bloqueadores na época em que existiam apenas Vivo e BCP; hoje já temos 11, 12 operadoras no país", diz o executivo.

Procurada, a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo não comentou as críticas e alegações. Mas em entrevista nesta terça-feira (16/2), o ministro das Comunicações, Hélio Costa, confirmou que é dos governos estaduais a responsabilidade de controlar as tentativas de presos. "Só falta o responsável pela segurança nos presídios, ou seja, os governos estaduais, comprarem os equipamentos e implantarem os equipamentos", afirmou Costa.

Escaldadas pela repercussão da violência e do caos vividos pelos habitantes de São Paulo na segunda-feira (15/2), dia em que até empresas liberaram funcionários mais cedo com medo de um suposto toque de recolher, as operadoras de telefonia celular trataram de responder em conjunto aos questionamentos sobre as ligações feitas de dentro de presídios. Por meio da Associação Nacional dos Prestadores de Serviço Móvel Celular (Acel), afirmaram que não lhes compete bloquear as chamadas realizadas por presos, e sim ao governo. A declaração foi apoiada por nota emitida pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) que as exime - e também libera a própria agência - de qualquer responsabilidade sobre a instalação e operação dos dispositivos que impedem as ligações.

A cobrança maior sobre as operadoras, no entanto, é para que cortem os sinais de antenas próximas a penitenciárias. Elas reclamam que isso representaria eliminar também o fornecimento de serviço àqueles que vivem nas proximidades, o que pode significar até mesmo o desabastecimento de toda a população de cidades pequenas, dependendo do raio de cada antena de transmissão, ou estação radiobase, como são chamadas no jargão técnico.Esse, no entanto, parece ser o caminho escolhido pelo governo para acalmar as reivindicações da sociedade de providências contra as ligações nos presídios. Nenhuma operadora comenta individualmente a possibilidade, mas na segunda-feira elas se reuniram com o governo do Estado de São Paulo para chegar a um acordo sobre a atuação em regiões próximas a unidades prisionais. No mesmo dia, a Anatel também discutiu o assunto - a agência não divulga, mas comenta-se que se chegou à conclusão de que a saída seria obrigar as operadoras a cortarem o sinal de algumas antenas no caso de um pedido formal do governo ou de decisão do Judiciário nesse sentido.

Controle no mundo

De acordo com o professor Zuffo, da Poli, controlar as ligações de celulares é algo tão simples que é procedimento comum em países como Estados Unidos e Israel. "Os bloqueadores são usados em penitenciárias e na proteção de embaixadas, instalações militares, até carros, com sistemas portáteis", diz.

Nos Estados Unidos, os celulares também se tornaram objeto de estudo obrigatório para muitas centrais de segurança depois dos atentados terroristas de 2001. Mas em solo americano, a ordem não é impedir as chamadas, e sim espioná-las. A prática foi referendada pelo presidente George W. Bush, que autorizou que a NSA (National Security Agency) ouça ligações internacionais de suspeitos com a aprovação da Justiça do país.

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