Jovem de 15 anos revoluciona o combate ao câncer de pâncreas
Projeto vencedor da maior feira de ciências do mundo abre caminho para o diagnóstico precoce de um dos tipos mais letais de câncer
Da Redação
Publicado em 4 de junho de 2012 às 18h33.
São Paulo - Jack Andraka é um garoto americano de 15 anos que adora o seriado de TV Glee. Filho de pai polonês e mãe inglesa, mora com a família em Maryland, na vizinhança da capital Washington, onde cursa o primeiro ano do High School (equivalente ao segundo grau no Brasil) no North County High School, um cólegio normal. Gosta de remar em seu caiaque e fazer origamis. A princípio, não há nada que o destaque dos demais rapazes de sua idade. Jack, porém, é um gênio. No dia 18 de maio, venceu a Feira Internacional de Ciência e Engenharia da Intel, a maior do mundo para pré-universitários. Levou 100.000 dólares para casa, 75.000 pelo prêmio principal, 25.000 em prêmios especiais.
Seu feito: desenvolver um teste simples e barato para fazer o diagnóstico precoce de três tipos de câncer , incluido o do pâncreas, um dos mais letais. O custo é de três centavos de dólar e o resultado é obtido em menos de cinco minutos. Segundo o site da Intel, o teste que Jack criou é 28 vezes mais barato e 100 vezes mais sensível do que o conjunto de técnicas atualmente utilizado para o diagnóstico. A comparação com o teste ELISA, o mais difundido método de detecção atual, é ainda mais impactante: o método de Jack se mostra 26.667 vezes mais barato e 400 vezes mais sensível.
Jack é persistente. Depois que o tio morreu de câncer do pâncreas, passou meses pensando em formas de atacar a doença. Cerca de 95% dos pacientes morrem em até cinco anos se o tumor no pâncreas não é descoberto cedo. Segundo a Organização Mundial de Saúde, todos os anos são registrados quase 145.000 novos casos de câncer de pâncreas e cerca de 139.000 mortes. Steve Jobs, cofundador da Apple, foi uma das vítimas da doença.
Jack teve seu momento eureka durante uma aula de biologia em 2011. Andraka já havia estudado os nanotubos de carbono, estruturas artificiais com a espessura de um átomo hoje usadas na indústria farmacêutica, e marcadores biológicos, substâncias presentes no organismo que podem indicar a existência de uma doença. Ele juntou as duas coisas e começou a projetar um teste que usasse os nanotubos para detectar o marcardor biológico do câncer de pâncreas, com o objetivo de fazer isso de forma mais simples e mais barata que o teste ELISA.
"O que fiz foi criar um sensor de papel: um nanotubo de carbono de parede simples combinado com anticorpos e um marcador biológico do câncer chamado mesotelina. Os anticorpos são moléculas que se grudam em outras moléculas específicas. Meu sensor, em um estudo cego, fez o diagnóstico certo do câncer de pâncreas em 100% dos casos. Ele pode diagnosticar o câncer antes que ele se torne invasivo." Uma gota de sangue basta para fazer o teste.
Para validar sua ideia, Jack escreveu um projeto de pesquisa prevendo os materiais necessários, o tempo de utilização do laboratório, o custo e os resultados almejados. Enviou o projeto por e-mail para 200 profissionais nos Estados Unidos. Recebeu 197 'nãos'. Duas respostas nunca chegaram. "Quando estava prestes a desistir, recebi a última resposta", diz Jack em entrevista ao site de VEJA.
A resposta positiva veio do laboratório do médico Anirban Maitra, especialista em câncer do pâncreas. Maitra trabalha há 12 anos na respeitada Universidade John Hopkins, que tem uma das melhores faculdades de medicina do mundo e investe alto no tratamento do câncer. "O projeto estava tão bem elaborado, tão bem escrito e representava uma ideia tão inovadora, que foi impossível recusá-lo", diz Maitra. "Jack é um rapaz brilhante." E esforçado. Na segunda metade de 2011, Jack começou o trabalho que duraria sete meses. O médico conta que o garoto aparecia no laboratório todos os dias, após a escola — uma viagem de 70 quilômetros. "Vinha até nos feriados e por vezes saía tarde da noite do laboratório."
Da feira de ciências para o doutorado - O teste de Jack é um projeto de feira de ciências, mas equipara-se a uma tese de doutorado. Promissora, a ideia ainda é muito jovem, e precisará passar pelo rigor e escrutínio da comunidade científica antes de chegar aos pacientes. Quando o estudo for publicado, na forma de um artigo para periódicos científicos, terá o jovem Jack como "chefe da pesquisa". "Ele já está escrevendo. Vamos enviar o artigo em breve", diz Maitra.
Jack já patenteou a técnica e começou a ser assediado por empresas que querem transformá-la em produto. Os 100.000 dólares que recebeu pela descoberta, ao vencer a feira de ciências da Intel, serão usados para financiar sua promissora carreira como patologista. "Ele já venceu outras feiras de ciência menores, sempre com projetos sensíveis às necessidades da sociedade", conta Maitra. "Sua sagacidade está sempre apontada para problemas reais da população." O médico diz que teria orgulho em tê-lo como aluno na Universidade John Hopkins, mas sabe que ele será disputado por outros gigantes da pesquisa. "Pessoas como ele construíram o Google ou a IBM", diz. "Ele tem condições de criar sua própria empresa de biotecnologia." Mas Jack ainda não pensa onde trabalhar. No primeiro ano do ensino médio, o que ele quer é disputar a próxima feira de ciências da Intel. E não perder o próximo episódio de Glee.
Diagnóstico rápido e barato
Jack Andraka, 15 anos, vencedor da Feira Internacional de Ciência e Engenharia da Intel
Veja.com - Como teve a ideia de desenvolver um teste para diagnosticar o câncer do pâncreas?
Jack Andraka - A única forma de saber se alguém tem câncer de pâncreas é realizar exames periódicos de sangue. Desenvolvi um sensor que identifica uma proteína encontrada no sangue e na urina. Em grandes quantidades, ela indica que o indivíduo tem câncer de pâncreas, de ovário ou de pulmão. Trata-se então de um sensor genérico para esses três tipos de câncer.
Veja.com - Quanto tempo levou para trabalhar a ideia?
J.A. - Levei dois meses para pensar em como montar o sensor, quais reagentes usar e planejar quanto tempo eu precisaria em um laboratório. Disparei 200 e-mails para instituições como o Instituto Nacional de Saúde e fui rejeitado 197 vezes. Duas mensagens nunca chegaram. Finalmente fui aceito pelo Dr. Maitra, na Universidade John Hopkins.
Veja.com - Você já está trabalhando em outro projeto?
J.A. - No momento estou me esforçando para comercializar o novo sensor. Várias empresas já entraram em contato comigo, e registrei um pedido de patente, que aguarda aprovação.
Veja.com - Como o sensor funciona?
J.A. - Trata-se de uma pequena tira de papel com reagentes. O melhor método diagnóstico para o câncer de pâncreas requer três sensores e leva horas. Meu teste não precisa de treinamento nem equipamento especial. Uma gota de sangue basta para seis tipos de testes diferentes em cinco minutos. Além disso, ele pode ser aplicado em outras formas de câncer, monitorar medicamentos e ser adaptado para detectar outras doenças infecciosas, como salmonela, E. coli, rotavírus, aids, e doenças sexualmente transmissíveis. A ideia é fazer o teste realmente simples, para que todos os pacientes possam realizar uma vez por semana, a um custo de três centavos de dólar por teste, de modo que o plano de saúde possa cobrir.
Veja.com - Você se considera à frente da sua geração?
J.A. Eu me considero à frente da minha geração, mas acho que a inteligência natural é superestimada pelas pessoas. Não acho isso seja o fator principal. O mais importante é o quanto cada um se dedica àquilo que gosta de fazer.
Veja.com - O que espera conquistar nos próximos 15 anos da sua vida?
J.A. - Espero poder continuar minha pesquisa. Quero ser um patologista e talvez funde a minha própria empresa de biotecnologia. Mas ainda tenho muito tempo para pensar nisso, certo?
J.A. - O que você diria para jovens que desejam começar uma carreira de cientista? O mais importante é encontrar aquilo que te apaixona. Todo mundo tem a chance de se tornar um grande cientista. É apenas uma questão de encontrar sua paixão e fazer as perguntas certas. Se isso acontecer, continue fazendo as perguntas, deixe a curiosidade fluir e trabalhe duro. Sempre valerá a pena.
São Paulo - Jack Andraka é um garoto americano de 15 anos que adora o seriado de TV Glee. Filho de pai polonês e mãe inglesa, mora com a família em Maryland, na vizinhança da capital Washington, onde cursa o primeiro ano do High School (equivalente ao segundo grau no Brasil) no North County High School, um cólegio normal. Gosta de remar em seu caiaque e fazer origamis. A princípio, não há nada que o destaque dos demais rapazes de sua idade. Jack, porém, é um gênio. No dia 18 de maio, venceu a Feira Internacional de Ciência e Engenharia da Intel, a maior do mundo para pré-universitários. Levou 100.000 dólares para casa, 75.000 pelo prêmio principal, 25.000 em prêmios especiais.
Seu feito: desenvolver um teste simples e barato para fazer o diagnóstico precoce de três tipos de câncer , incluido o do pâncreas, um dos mais letais. O custo é de três centavos de dólar e o resultado é obtido em menos de cinco minutos. Segundo o site da Intel, o teste que Jack criou é 28 vezes mais barato e 100 vezes mais sensível do que o conjunto de técnicas atualmente utilizado para o diagnóstico. A comparação com o teste ELISA, o mais difundido método de detecção atual, é ainda mais impactante: o método de Jack se mostra 26.667 vezes mais barato e 400 vezes mais sensível.
Jack é persistente. Depois que o tio morreu de câncer do pâncreas, passou meses pensando em formas de atacar a doença. Cerca de 95% dos pacientes morrem em até cinco anos se o tumor no pâncreas não é descoberto cedo. Segundo a Organização Mundial de Saúde, todos os anos são registrados quase 145.000 novos casos de câncer de pâncreas e cerca de 139.000 mortes. Steve Jobs, cofundador da Apple, foi uma das vítimas da doença.
Jack teve seu momento eureka durante uma aula de biologia em 2011. Andraka já havia estudado os nanotubos de carbono, estruturas artificiais com a espessura de um átomo hoje usadas na indústria farmacêutica, e marcadores biológicos, substâncias presentes no organismo que podem indicar a existência de uma doença. Ele juntou as duas coisas e começou a projetar um teste que usasse os nanotubos para detectar o marcardor biológico do câncer de pâncreas, com o objetivo de fazer isso de forma mais simples e mais barata que o teste ELISA.
"O que fiz foi criar um sensor de papel: um nanotubo de carbono de parede simples combinado com anticorpos e um marcador biológico do câncer chamado mesotelina. Os anticorpos são moléculas que se grudam em outras moléculas específicas. Meu sensor, em um estudo cego, fez o diagnóstico certo do câncer de pâncreas em 100% dos casos. Ele pode diagnosticar o câncer antes que ele se torne invasivo." Uma gota de sangue basta para fazer o teste.
Para validar sua ideia, Jack escreveu um projeto de pesquisa prevendo os materiais necessários, o tempo de utilização do laboratório, o custo e os resultados almejados. Enviou o projeto por e-mail para 200 profissionais nos Estados Unidos. Recebeu 197 'nãos'. Duas respostas nunca chegaram. "Quando estava prestes a desistir, recebi a última resposta", diz Jack em entrevista ao site de VEJA.
A resposta positiva veio do laboratório do médico Anirban Maitra, especialista em câncer do pâncreas. Maitra trabalha há 12 anos na respeitada Universidade John Hopkins, que tem uma das melhores faculdades de medicina do mundo e investe alto no tratamento do câncer. "O projeto estava tão bem elaborado, tão bem escrito e representava uma ideia tão inovadora, que foi impossível recusá-lo", diz Maitra. "Jack é um rapaz brilhante." E esforçado. Na segunda metade de 2011, Jack começou o trabalho que duraria sete meses. O médico conta que o garoto aparecia no laboratório todos os dias, após a escola — uma viagem de 70 quilômetros. "Vinha até nos feriados e por vezes saía tarde da noite do laboratório."
Da feira de ciências para o doutorado - O teste de Jack é um projeto de feira de ciências, mas equipara-se a uma tese de doutorado. Promissora, a ideia ainda é muito jovem, e precisará passar pelo rigor e escrutínio da comunidade científica antes de chegar aos pacientes. Quando o estudo for publicado, na forma de um artigo para periódicos científicos, terá o jovem Jack como "chefe da pesquisa". "Ele já está escrevendo. Vamos enviar o artigo em breve", diz Maitra.
Jack já patenteou a técnica e começou a ser assediado por empresas que querem transformá-la em produto. Os 100.000 dólares que recebeu pela descoberta, ao vencer a feira de ciências da Intel, serão usados para financiar sua promissora carreira como patologista. "Ele já venceu outras feiras de ciência menores, sempre com projetos sensíveis às necessidades da sociedade", conta Maitra. "Sua sagacidade está sempre apontada para problemas reais da população." O médico diz que teria orgulho em tê-lo como aluno na Universidade John Hopkins, mas sabe que ele será disputado por outros gigantes da pesquisa. "Pessoas como ele construíram o Google ou a IBM", diz. "Ele tem condições de criar sua própria empresa de biotecnologia." Mas Jack ainda não pensa onde trabalhar. No primeiro ano do ensino médio, o que ele quer é disputar a próxima feira de ciências da Intel. E não perder o próximo episódio de Glee.
Diagnóstico rápido e barato
Jack Andraka, 15 anos, vencedor da Feira Internacional de Ciência e Engenharia da Intel
Veja.com - Como teve a ideia de desenvolver um teste para diagnosticar o câncer do pâncreas?
Jack Andraka - A única forma de saber se alguém tem câncer de pâncreas é realizar exames periódicos de sangue. Desenvolvi um sensor que identifica uma proteína encontrada no sangue e na urina. Em grandes quantidades, ela indica que o indivíduo tem câncer de pâncreas, de ovário ou de pulmão. Trata-se então de um sensor genérico para esses três tipos de câncer.
Veja.com - Quanto tempo levou para trabalhar a ideia?
J.A. - Levei dois meses para pensar em como montar o sensor, quais reagentes usar e planejar quanto tempo eu precisaria em um laboratório. Disparei 200 e-mails para instituições como o Instituto Nacional de Saúde e fui rejeitado 197 vezes. Duas mensagens nunca chegaram. Finalmente fui aceito pelo Dr. Maitra, na Universidade John Hopkins.
Veja.com - Você já está trabalhando em outro projeto?
J.A. - No momento estou me esforçando para comercializar o novo sensor. Várias empresas já entraram em contato comigo, e registrei um pedido de patente, que aguarda aprovação.
Veja.com - Como o sensor funciona?
J.A. - Trata-se de uma pequena tira de papel com reagentes. O melhor método diagnóstico para o câncer de pâncreas requer três sensores e leva horas. Meu teste não precisa de treinamento nem equipamento especial. Uma gota de sangue basta para seis tipos de testes diferentes em cinco minutos. Além disso, ele pode ser aplicado em outras formas de câncer, monitorar medicamentos e ser adaptado para detectar outras doenças infecciosas, como salmonela, E. coli, rotavírus, aids, e doenças sexualmente transmissíveis. A ideia é fazer o teste realmente simples, para que todos os pacientes possam realizar uma vez por semana, a um custo de três centavos de dólar por teste, de modo que o plano de saúde possa cobrir.
Veja.com - Você se considera à frente da sua geração?
J.A. Eu me considero à frente da minha geração, mas acho que a inteligência natural é superestimada pelas pessoas. Não acho isso seja o fator principal. O mais importante é o quanto cada um se dedica àquilo que gosta de fazer.
Veja.com - O que espera conquistar nos próximos 15 anos da sua vida?
J.A. - Espero poder continuar minha pesquisa. Quero ser um patologista e talvez funde a minha própria empresa de biotecnologia. Mas ainda tenho muito tempo para pensar nisso, certo?
J.A. - O que você diria para jovens que desejam começar uma carreira de cientista? O mais importante é encontrar aquilo que te apaixona. Todo mundo tem a chance de se tornar um grande cientista. É apenas uma questão de encontrar sua paixão e fazer as perguntas certas. Se isso acontecer, continue fazendo as perguntas, deixe a curiosidade fluir e trabalhe duro. Sempre valerá a pena.