Revista Exame

A euforia voltou ás bolsas dos Estados Unidos

Os investidores deixaram de lado a obsessão por ações boas de dividendos e agora estão mais tolerantes ao risco. Especulação ou sinal de recuperação da economia?

Sede do Dropbox, na Califórnia: um dos IPOs mais aguardados de 2014 (Bruce Damonte/EXAME)

Sede do Dropbox, na Califórnia: um dos IPOs mais aguardados de 2014 (Bruce Damonte/EXAME)

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Da Redação

Publicado em 14 de maio de 2014 às 09h13.

São Paulo - Uma fonte contínua de debate entre os economistas é se as oscilações nos mercados de ações são ou não racionais. Para um grupo, bolsa é sinônimo de especulação. Para outra parte dos economistas, o preço das ações representa a avaliação racional do valor da empresa e de suas perspectivas de lucro.

Mais recentemente, um terceiro grupo, liderado pelo vencedor do Prêmio Nobel Daniel Kahneman, sugeriu uma conciliação entre as duas visões: segundo ele, as pessoas tomam decisões de investimento com base em fatos objetivos, mas são influenciadas por suas emoções e crenças.

Por trás desse debate estão as perguntas: os mercados de ações refletem a situação da economia real? Seus sinais são um indicador confiável do que está por vir?

São questões centrais na discussão sobre a economia dos Estados Unidos, num momento em que as bolsas americanas são, mais uma vez, palco de demonstrações de euforia. Mês após mês, o S&P 500, principal índice de ações do país, bate recorde de alta.

Em um ano, avançou quase 20%. Nos primeiros três meses de 2014, cerca de 70 ofertas públicas foram realizadas — o maior número desde 2000. Essas aberturas de capital levantaram 11,6 bilhões de dólares, um dos melhores resultados desde a crise de 2008.

Segundo um levantamento da consultoria americana Renaissance, há 122 companhias com emissões registradas e prestes a colocar suas ações no mercado.

“Este ano começou muito forte. Tudo indica que vai ser de recorde em estreias na bolsa”, afirma Jacqueline Kelley, líder para as Américas da área de abertura de capital da consultoria Ernst&Young.

É tudo especulação financeira? São sinais de uma recuperação sólida? Ou, na linha sugerida por Kahneman, uma combinação das duas coisas?

Até onde a vista alcança, parece haver mais razão do que emoção. A mudança de humor na bolsa tem como pano de fundo a recuperação da economia.

De acordo com o último relatório do Federal Reserve, o banco central americano, o PIB deverá crescer de 2,8% a 3% neste ano — em 2013, a alta foi de 1,7%. Para 2015, a estimativa gira entre 3% e 3,2%.

Os dados do mercado de trabalho também indicam uma melhora. O desemprego deverá fechar o ano entre 6,1% e 6,3% — o menor patamar desde outubro de 2008.

Tomando as aberturas de capital nas bolsas como um termômetro, os setores mais promissores da economia americana são energia, saúde e tecnologia, nessa ordem. São eles os que têm captado mais dinheiro dos investidores.

“O mercado está deixando de lado as empresas boas de dividendos e aceitando tomar mais riscos”, afirma Mary Ann Deignan, diretora de mercado de capitais do Bank of America Merril Lynch. No caso das companhias de energia, existem fundamentos consistentes para justificar o sucesso na bolsa de Nova York.


A exploração do petróleo e do gás de xisto nos Estados Unidos deu um salto na última década. No ano 2000, o país extraía 200 000 barris por dia de petróleo de xisto, número que subiu recentemente para 2,2 milhões.

No mesmo período, a produção de gás de xisto aumentou mais de 30 vezes. Foi com essas justificativas que a Rice Energy, companhia fundada em 2007, conseguiu levantar 924 milhões de dólares em janeiro. 

No setor de saúde, o destaque tem sido as startups ligadas à criação de medicamentos, aparelhos e serviços. Boa parte delas seguiu a cartilha das empresas novatas. Recebeu dinheiro de fundos de private equity, cresceu e lançou ações na bolsa para viabilizar a saída dos primeiros investidores.

A Castlight Health, fundada em 2008, fez exatamente isso. A companhia de São Francisco, dona de uma plataforma de comparação de custos e benefícios de planos de saúde, faturou apenas 13 milhões de dólares em 2013, mas chegou a 1,4 bilhão de dólares em valor de mercado em março.

O interesse por companhias do setor é fruto de mudanças demográficas. Estima-se que quase 20% dos americanos terão mais de 65 anos em 2030 (hoje, o percentual é 13%). Outro fator digno de nota é o possível aumento da demanda por causa do “ObamaCare”, a reforma do governo americano que ampliou a cobertura de planos de saúde. 

À espera de Alibaba

Embora tenha ficado em terceiro lugar até agora em termos de captação, o setor de tecnologia é considerado a grande promessa para o restante do ano. Está prevista a abertura do capital das provedoras de computação em nuvem Dropbox  e da gigante chinesa de e-commerce Alibaba, que possivelmente será o maior evento desde o lançamento do Facebook na bolsa.

Todo esse entusiasmo é visto com certa precaução por parte dos analistas. “Algumas empresas de tecnologia estão sendo avaliadas num patamar muito alto de preço e, por isso, exigem cautela”, diz Kathleen Smith, diretora da consultoria Renaissance.

Exageros à parte, parece claro que a economia americana, mais uma vez, está conseguindo se reinventar. O que mais tem impressionado nos últimos tempos é o ritmo das transformações. Em 1920, a permanência média de uma companhia no índice S&P 500 era de 67 anos. Agora, é 15 anos.

“Em duas décadas, teremos uma renovação total das empresas do S&P 500 como fruto do impacto das novas tecnologias na economia real”, diz Richard Foster, professor de administração na Universidade Yale. Empresas centenárias, é verdade, tropeçaram feio na última crise. Mas toda uma nova leva de empreendedores mostra para onde vai a maior economia do planeta.

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