"Voamos com os pés no chão", diz Efromovitch, da Avianca
À frente da companhia aérea Avianca, o empresário José Efromovich expandiu as receitas, ganhou a simpatia dos passageiros, e a empresa pode terminar 2013 sem perder dinheiro. Num setor tão complicado, não é pouco
Da Redação
Publicado em 29 de dezembro de 2013 às 16h27.
São Paulo - O empresário José Efromovich é uma figura. Quando Exame PME ouviu-o para esta seção, perguntou, como sempre, quantos anos ele tem. "Tenho 23", disse.
Como se vê na foto, obviamente é muito mais. Mas pode-se considerar que sua idade emocional é mesmo 23. Pilotando a companhia aérea Avianca num setor que vive (mais) um momento complicadíssimo, ele não perde a chance de fazer graça, mesmo que não dê para entender a piada direito.
No meio da entrevista, ele falou: "Há malas que não vão para Belém", um trocadilho com o dito "Há males que vêm para o bem". Então tá. Efromovich anda contente porque os passageiros parecem satisfeitos — num estudo recente sobre a qualidade do serviço de diversas empresas, publicado pela revista Exame, a Avianca foi a que melhor se saiu em seu setor.
"Atendimento é tudo", disse. Nesta reportagem, Efromovich conta como ele e seu irmão German chegaram até aqui. E sua real idade? "Vou fazer 59, então tenho 58", disse.
"Eu tinha 12 anos quando ganhei meu primeiro dinheirinho. Sabe aqueles jogos de futebol de botão?Eram fáceis de fazer. Bastava comprarumas tampinhas transparentes, pintá-las por dentro e vender.Anos mais tarde, quando estudavaengenharia civil no Mackenzie,em São Paulo, comecei a dar aulasparticulares de matemática, físicae química.
Era só para pagar o cinema, tomar chope e colocar gasolina no meu Fusca. Fui juntando mais e mais alunos, até que eu e meu irmão German fundamos um cursinho de aulas particulares.
Depois, em 1973, montamos um curso de madureza em São Bernardo do Campo. Chegamos a ter 2.000 alunos — um deles foi o Lula. Ele já era totalmente diferenciado. No terceiro ano da faculdade, eu estava indo muito mal, com o sério risco de repetir.
O cursinho e o vaivém para São Bernardo tomavam todo o meu tempo. Quase não dava para estudar. Por isso, em 1974, decidimos vender a escola. Depois que me formei, um amigo me chamou para ser o engenheiro responsável na construtora dele. Fiquei lá por um ano, mas as coisas não deram tão certo como eu queria.
Então montei com meu irmão, que na época trabalhava numa multinacional de engenharia, uma empresa de inspeção e controle de qualidade. Nos anos 80, passamos a prestar serviço de controle de qualidade para o setor de petróleo. Um dos clientes era uma firma de engenharia que tinha dois aviões.
O dono propôs pagar o serviço com um turboélice para seis passageiros. Ele disse que não tinha dinheiro. Achamos melhor aceitar — o que fazer com aquilo nós absolutamente não sabíamos. Acabamos ficando com o outro avião também e começamos a usá-los para levar nossas equipes para Macaé, no estado do Rio de Janeiro.
Muita gente que, como nós, prestava serviços para o setor de petróleo naquela região começou a pedir carona. Seis meses depois, tínhamos montado um táxi-aéreo com esses dois aviões, que também transportavam malotes. Um dia, aconteceu uma desgraça.
Tínhamos um malote de valores para entregar no Banco do Brasil. Nove senhores "simpáticos" invadiram o aeroporto de Campos, no Rio de Janeiro, e metralharam o avião para assaltá-lo. Por sorte, o piloto e o copiloto não se feriram. O avião virou queijo suíço e procuramos outro para substituí-lo.
Compramos quatro aviões Brasília e criamos uma pequena companhia aérea regional, a Ocean Air. Em 2004, adquirimos a Avianca, empresa aérea colombiana que estava em processo de recuperação judicial. A companhia tinha então 39 aeronaves e quase 6.000 funcionários.
A Ocean Air cresceu e, em 2007, vimos que a empresa não teria mais do que seis meses pela frente. O problema estava na diversidade da frota, de 34 aviões. Eram seis modelos diferentes, o que requeria seis equipes diferentes de pilotos, comandantes, mecânicos, comissários.
Eram seis atividades diversificadas — sendo que nenhuma delas tinha escala. Vendemos o que era nosso, devolvemos o que era leasing e ficamos com o 14 Fokker MK28. Todo mundo me pergunta: "Mas não é o Fokker 100?" Se você pegar o manual do Fokker 100, verá escrito assim: "Fokker MK 28/F100".Quisemos chamá-lo de MK 28, ok?
Recomeçamos no ano seguinte, com esses 14 aviões. O Ebitda estava em -55% em relação ao faturamento. Das 36 cidades em que operávamos, ficamos em cerca de 20. Nosso serviço era muito ruim. Achamos melhor nos concentrar em poucas cidades e oferecer um serviço melhor.
Num mercado em que a tendência é tirar a comida das pessoas, passamos a servir uma pequena refeição quente em todos os voos. Em junho tem até comida caipira. É claro que a comida aumenta o custo, mas isso tem sido compensado com mais receitas. Temos o maior índice médio de ocupação do setor, de 81% — a média da indústria é 77% (este depoimento foi colhido em meados de outubro).
A Ocean Air adotou o nome Avianca em 2010. Hoje, operamos 38 aeronaves para atender o mercado, que está muito feliz com o serviço prestado. No ano passado, ainda tive mos prejuízo. Neste, prevemos equilibrar as contas. E, no próximo — se não houver nenhum desastre e o combustível não aumentar exageradamente —, poderemos ter resultado operacional positivo.
Atendimento é tudo. O avião tem televisãozinha individual. Tem entrada USB para fazer um textinho, uma planilhazinha. Todas as filas têm duas tomadas. E não é tomada de acendedor de cigarro, não. É tomada normal. O call center é uma parte da casa. São aproximadamente 260 funcionários próprios.
Só contratamos pessoas que estejam no mínimo cursando nível superior. O call center é o maior provedor de talentos para as outras áreas da empresa. É comum um funcionário do call center ser promovido a atendente ou a um cargo de supervisão no aeroporto.
Quem cursa economia ou administração tem chance de ser transferido para uma posição administrativa. Damos muita oportunidade ao pessoal do atendimento porque ele está em contato direto com o cliente e conhece suas necessidades.
Os funcionários do call center precisam se sentir como se estivessem no lugar do passageiro. Algum tempo atrás, descobrimos que muitos funcionários nunca tinham viajado de avião. Incluímos no treinamento a experiência de ser passageiro.
O funcionário que está sendo treinado pega o cartão de embarque e vai para a fila, como todos os outros passageiros, faz o check-in, despacha as malas. Foi uma coisa simples que deu muito bom resultado. E a ideia nem foi minha, foi da gerente do setor.
Uma parte do crescimento da Avianca depende de aspectos externos, como infraestrutura e controle do tráfego aéreo. Internamente, o grande desafio é preservar a cultura de colocar a felicidade do cliente em primeiro lugar. Não vamos perder esse aspecto de nossa identidade.
Não importa se isso fcar mais difícil à medida que a companhia crescer. Temos de conseguir fazer e pronto. Nossa meta de crescimento é uma combinação daquilo que o mercado permitir com a possibilidade de continuar atendendo bem o cliente.
Não vamos dar um passo maior do que as pernas. O passado já nos mostrou que isso não dá certo. Eu sempre digo: "Nós voamos com os pés no chão".
Não tenho planos de me aposentar, muito pelo contrário. Trabalho em média 14 horas por dia e gostaria de ter muita saúde para continuar assim. Gosto de trabalhar. Faço tudo com paixão. Acho que, para um empreendedor, paixão é o começo de tudo.
Ninguém conquista o sucesso se não é feliz no que faz. Você se chateia e passa o dia inteiro pensando em estar em outro lugar. Está aí uma coisa que não dá certo. "
São Paulo - O empresário José Efromovich é uma figura. Quando Exame PME ouviu-o para esta seção, perguntou, como sempre, quantos anos ele tem. "Tenho 23", disse.
Como se vê na foto, obviamente é muito mais. Mas pode-se considerar que sua idade emocional é mesmo 23. Pilotando a companhia aérea Avianca num setor que vive (mais) um momento complicadíssimo, ele não perde a chance de fazer graça, mesmo que não dê para entender a piada direito.
No meio da entrevista, ele falou: "Há malas que não vão para Belém", um trocadilho com o dito "Há males que vêm para o bem". Então tá. Efromovich anda contente porque os passageiros parecem satisfeitos — num estudo recente sobre a qualidade do serviço de diversas empresas, publicado pela revista Exame, a Avianca foi a que melhor se saiu em seu setor.
"Atendimento é tudo", disse. Nesta reportagem, Efromovich conta como ele e seu irmão German chegaram até aqui. E sua real idade? "Vou fazer 59, então tenho 58", disse.
"Eu tinha 12 anos quando ganhei meu primeiro dinheirinho. Sabe aqueles jogos de futebol de botão?Eram fáceis de fazer. Bastava comprarumas tampinhas transparentes, pintá-las por dentro e vender.Anos mais tarde, quando estudavaengenharia civil no Mackenzie,em São Paulo, comecei a dar aulasparticulares de matemática, físicae química.
Era só para pagar o cinema, tomar chope e colocar gasolina no meu Fusca. Fui juntando mais e mais alunos, até que eu e meu irmão German fundamos um cursinho de aulas particulares.
Depois, em 1973, montamos um curso de madureza em São Bernardo do Campo. Chegamos a ter 2.000 alunos — um deles foi o Lula. Ele já era totalmente diferenciado. No terceiro ano da faculdade, eu estava indo muito mal, com o sério risco de repetir.
O cursinho e o vaivém para São Bernardo tomavam todo o meu tempo. Quase não dava para estudar. Por isso, em 1974, decidimos vender a escola. Depois que me formei, um amigo me chamou para ser o engenheiro responsável na construtora dele. Fiquei lá por um ano, mas as coisas não deram tão certo como eu queria.
Então montei com meu irmão, que na época trabalhava numa multinacional de engenharia, uma empresa de inspeção e controle de qualidade. Nos anos 80, passamos a prestar serviço de controle de qualidade para o setor de petróleo. Um dos clientes era uma firma de engenharia que tinha dois aviões.
O dono propôs pagar o serviço com um turboélice para seis passageiros. Ele disse que não tinha dinheiro. Achamos melhor aceitar — o que fazer com aquilo nós absolutamente não sabíamos. Acabamos ficando com o outro avião também e começamos a usá-los para levar nossas equipes para Macaé, no estado do Rio de Janeiro.
Muita gente que, como nós, prestava serviços para o setor de petróleo naquela região começou a pedir carona. Seis meses depois, tínhamos montado um táxi-aéreo com esses dois aviões, que também transportavam malotes. Um dia, aconteceu uma desgraça.
Tínhamos um malote de valores para entregar no Banco do Brasil. Nove senhores "simpáticos" invadiram o aeroporto de Campos, no Rio de Janeiro, e metralharam o avião para assaltá-lo. Por sorte, o piloto e o copiloto não se feriram. O avião virou queijo suíço e procuramos outro para substituí-lo.
Compramos quatro aviões Brasília e criamos uma pequena companhia aérea regional, a Ocean Air. Em 2004, adquirimos a Avianca, empresa aérea colombiana que estava em processo de recuperação judicial. A companhia tinha então 39 aeronaves e quase 6.000 funcionários.
A Ocean Air cresceu e, em 2007, vimos que a empresa não teria mais do que seis meses pela frente. O problema estava na diversidade da frota, de 34 aviões. Eram seis modelos diferentes, o que requeria seis equipes diferentes de pilotos, comandantes, mecânicos, comissários.
Eram seis atividades diversificadas — sendo que nenhuma delas tinha escala. Vendemos o que era nosso, devolvemos o que era leasing e ficamos com o 14 Fokker MK28. Todo mundo me pergunta: "Mas não é o Fokker 100?" Se você pegar o manual do Fokker 100, verá escrito assim: "Fokker MK 28/F100".Quisemos chamá-lo de MK 28, ok?
Recomeçamos no ano seguinte, com esses 14 aviões. O Ebitda estava em -55% em relação ao faturamento. Das 36 cidades em que operávamos, ficamos em cerca de 20. Nosso serviço era muito ruim. Achamos melhor nos concentrar em poucas cidades e oferecer um serviço melhor.
Num mercado em que a tendência é tirar a comida das pessoas, passamos a servir uma pequena refeição quente em todos os voos. Em junho tem até comida caipira. É claro que a comida aumenta o custo, mas isso tem sido compensado com mais receitas. Temos o maior índice médio de ocupação do setor, de 81% — a média da indústria é 77% (este depoimento foi colhido em meados de outubro).
A Ocean Air adotou o nome Avianca em 2010. Hoje, operamos 38 aeronaves para atender o mercado, que está muito feliz com o serviço prestado. No ano passado, ainda tive mos prejuízo. Neste, prevemos equilibrar as contas. E, no próximo — se não houver nenhum desastre e o combustível não aumentar exageradamente —, poderemos ter resultado operacional positivo.
Atendimento é tudo. O avião tem televisãozinha individual. Tem entrada USB para fazer um textinho, uma planilhazinha. Todas as filas têm duas tomadas. E não é tomada de acendedor de cigarro, não. É tomada normal. O call center é uma parte da casa. São aproximadamente 260 funcionários próprios.
Só contratamos pessoas que estejam no mínimo cursando nível superior. O call center é o maior provedor de talentos para as outras áreas da empresa. É comum um funcionário do call center ser promovido a atendente ou a um cargo de supervisão no aeroporto.
Quem cursa economia ou administração tem chance de ser transferido para uma posição administrativa. Damos muita oportunidade ao pessoal do atendimento porque ele está em contato direto com o cliente e conhece suas necessidades.
Os funcionários do call center precisam se sentir como se estivessem no lugar do passageiro. Algum tempo atrás, descobrimos que muitos funcionários nunca tinham viajado de avião. Incluímos no treinamento a experiência de ser passageiro.
O funcionário que está sendo treinado pega o cartão de embarque e vai para a fila, como todos os outros passageiros, faz o check-in, despacha as malas. Foi uma coisa simples que deu muito bom resultado. E a ideia nem foi minha, foi da gerente do setor.
Uma parte do crescimento da Avianca depende de aspectos externos, como infraestrutura e controle do tráfego aéreo. Internamente, o grande desafio é preservar a cultura de colocar a felicidade do cliente em primeiro lugar. Não vamos perder esse aspecto de nossa identidade.
Não importa se isso fcar mais difícil à medida que a companhia crescer. Temos de conseguir fazer e pronto. Nossa meta de crescimento é uma combinação daquilo que o mercado permitir com a possibilidade de continuar atendendo bem o cliente.
Não vamos dar um passo maior do que as pernas. O passado já nos mostrou que isso não dá certo. Eu sempre digo: "Nós voamos com os pés no chão".
Não tenho planos de me aposentar, muito pelo contrário. Trabalho em média 14 horas por dia e gostaria de ter muita saúde para continuar assim. Gosto de trabalhar. Faço tudo com paixão. Acho que, para um empreendedor, paixão é o começo de tudo.
Ninguém conquista o sucesso se não é feliz no que faz. Você se chateia e passa o dia inteiro pensando em estar em outro lugar. Está aí uma coisa que não dá certo. "