Empresa que paga cursos pode exigir permanência do funcionário?
A empresa pode obrigar um funcionário a permanecer trabalhando enquanto as despesas de cursos não são compensadas? Entenda o que é a cláusula de permanência e como ela funciona
Da Redação
Publicado em 18 de outubro de 2021 às 14h13.
Última atualização em 19 de outubro de 2021 às 16h35.
Por Milena Guarda, sócia do escritório Romar, Massoni & Lobo Advogados
A cláusula de permanência, também denominada de pacto de permanência, como a própria denominação sugere, é a cláusula que obriga o empregado a permanecer na empresa por um determinado período, abstendo-se do direito de pedir demissão, quando se qualifica profissionalmente às custas do empregador.
É prática comum o empregador se propor a pagar os estudos de seu empregado e em troca esse deve permanecer no emprego, por um determinado período, ou deve reembolsar as despesas, em caso de demissão antes de transcorrido o período pactuado.
A legislação trabalhista brasileira é omissa a respeito da matéria, razão pela qual as empresas devem ter cautela ao adotarem este tipo de ajuste.
Com base nas decisões proferidas pelo Judiciário, a validade da cláusula está atrelada ao caso concreto. Os pontos a avaliar são:
- o benefício concedido ao empregado está proporcional e razoável ao período que será limitado ao poder rescindir o contrato de trabalho;
- trata-se de benefício concedido ao empregado para aprimorar seus conhecimentos, tanto no aspecto pessoal como profissional;
- foi observado o princípio da dignidade da pessoa humana e os princípios gerais do direito.
O artigo 8º da CLT autoriza a Justiça do Trabalho decidir de acordo com o direito comparado.
Como funciona nos outros países?
Espanha
O pacto de permanência previsto no Estatuto do Trabalhador Espanhol tem duração não superior a um período máximo fixado de dois anos.
Segundo a doutrina espanhola, exige-se uma formação superior ou mais difícil que a necessária para o desenvolvimento habitual da atividade, produzindo um enriquecimento do patrimônio ou valor profissional do trabalhador, facilmente perceptível.
A jurisprudência espanhola vem concretizando critérios gerais para a validade da cláusula, dentre os quais é relevante mencionar: especialização profissional a encargo do empregador, que justifica a permanência mínima, não é o de formação ordinária concedida em todo caso para cumprimento do contrato de trabalho, mas deve estar fundada em uma causa suficiente ou deve atender também determinados requisitos de proporcionalidade ou equilíbrio de interesses.
Em caso de controvérsia, cabe à empresa provar que a formação proporcionada ao empregado supõe uma autêntica especialização profissional, gerando um plus na qualificação do empregado em relação àquela habitualmente contratada, permitindo maior facilidade de recolocação no mercado de trabalho no futuro. A ruptura contratual antecipada pelo empregado ocasionará um verdadeiro prejuízo se o empregador não for ressarcido.
Portugal
A legislação do trabalho portuguesa prevê, expressamente, a cláusula de permanência no seu ordenamento jurídico. O trabalhador se obriga a não se desvincular durante um determinado período, não superior a três anos, como compensação das despesas extraordinárias comprovadamente realizadas em sua formação profissional.
França
No direito francês, é denominada como clause de dédit-formation, cuja validade depende de: o empregador investir em excesso, isto é, além de sua obrigação legal ou contratual; a compensação prevista ser compatível com os custos despendidos pelo empregador; não privar o empregado do seu direito de demitir-se; que seja celebrado acordo antes do início da qualificação, contendo data, natureza, duração da formação e o custo real para o empregador, bem como, o montante e as condições que deverão ser pagas pelo empregado.
Assim, observados os requisitos de validade do compromisso, o empregado que o descumpre e pede demissão da empresa, muitas vezes indo para uma concorrente, estará obrigado a ressarcir a empresa pelos gastos, ainda que de modo proporcional.
Como pode-se concluir, diante da ausência de uma legislação brasileira que dê segurança jurídica às empresas, recomendamos que o acordo seja elaborado por um advogado com conhecimento na área, para evitar a sua nulidade e, por consequência, prejuízo financeiro à empresa.
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