Trabalho aos domingo: entenda as principais regras para micro e pequenas empresas (Andre Coelho / Correspondente/Getty Images)
Da Redação
Publicado em 5 de julho de 2021 às 12h53.
Última atualização em 5 de julho de 2021 às 12h55.
Por Roberto Baronian, sócio do escritório Granadeiro Guimarães Advogados
Compreender a regulamentação legal das relações trabalhistas é um desafio para micro e pequenas empresas, que são as que mais empregam em nosso país. No primeiro trimestre de 2021, pequenos negócios geraram 70% dos empregos com carteira assinada – três vezes mais postos de trabalho que os médios e grandes negócios.
Neste emaranhado de regras impositivas, dúvidas surgem: pode o pequeno empreendedor exigir o trabalho de empregados em domingos e feriados?
As regras aplicadas às micro e pequenas empresas são as mesmas previstas para todo e qualquer empregador. Este, aliás, é um desafio em termos trabalhistas, já que, regra geral, o Direito do Trabalho brasileiro não faz nenhuma diferenciação em relação ao porte das empresas. Se, sob o ponto de vista do trabalhador, a adoção de “classes” com diferentes níveis de proteção é passível de críticas, não podemos ignorar, de outro lado, a necessidade de mais flexibilidade, simplicidade e uma certa dose de proteção no âmbito da livre iniciativa e da liberdade econômica aos pequenos empreendedores.
A Constituição Federal assegura o direito a um descanso semanal remunerado, de forma que nenhum empregado pode trabalhar por mais de seis dias consecutivos. Ainda segundo a Constituição, o repouso semanal deve ocorrer preferencialmente aos domingos, ficando a regulamentação desta questão para a legislação ordinária.
Pela sistemática ainda vigente em nossa legislação trabalhista, o trabalho em domingos e feriados constitui uma exceção. Sua ocorrência depende de “permissão prévia da autoridade competente em matéria de trabalho”, a qual é concedida a título permanente nas atividades que, “por sua natureza ou pela conveniência pública, devam ser exercidas aos domingos”. Atribuiu-se ao Poder Executivo, então, o dever de definir e especificar, tanto quanto possível, as atividades empresariais autorizadas a funcionar em domingos e feriados.
O problema sempre consistiu na falta de atualização deste rol de atividades, que foi originariamente editado na década de 1940. Por se tratar de uma definição eminentemente técnica, relacionada a aspectos tecnológicos presentes no trabalho (a análise da “natureza das atividades”), assim como a fatores socioeconômicos que dele decorrem (as “razões de conveniência pública”), torna-se desnecessário dizer que esta relação de atividades de 1949 estava, há muito, obsoleta.
No processo de conversão da MP da Liberdade Econômica em lei, havido em 2019, o texto aprovado na Câmara acabava com as restrições para o trabalho em domingos e feriados, autorizando-o para qualquer atividade econômica. Entretanto, a incorporação de matérias de diversas no texto, conhecidas como “jabutis”, gerou críticas de parlamentares, havendo a preocupação de que isto contrariasse o posicionamento do Supremo Tribunal Federal a este respeito. A matéria foi excluída no Senado, com a sinalização de que deveria ser tratada em projeto de lei específico.
Ainda em 2019, outra MP (a 905), que instituía o “contrato de trabalho verde e amarelo” e alterava a legislação trabalhista em diversas matérias, eliminava a restrição. Entretanto, ela não foi convertida em lei pelo Congresso e perdeu vigência em abril de 2020.
O rol das atividades que contam com autorização permanente para o trabalho em domingos e feriados sofreu recentes atualizações pelo Ministério da Economia — uma em agosto de 2020 e uma segunda em fevereiro deste ano (Portaria nº 1.809, de 12 de fevereiro de 2021).
Segmentos econômicos relevantes para micro e pequenas empresas foram incluídos no rol, por exemplo
O rol completo de atividades está disponível no site.
No comércio, a autorização para o trabalho em domingos está prevista em lei específica (lei 10.101/00). Para o trabalho em feriados, ela prevê a necessidade de autorização em negociação coletiva sindical.
Para as atividades econômicas não contempladas na lista, a autorização para o trabalho em domingos e feriados há de ser obtida através de requerimento específico dirigido à autoridade governamental trabalhista local, o que é raro de se ver na prática em vista de seu caráter burocrático, ou mediante acordo coletivo de trabalho específico, firmado com o sindicato e registrado na Secretaria Especial de Trabalho e Previdência.
A negociação coletiva, a propósito, deveria ser privilegiada como instrumento eficaz e legitimo para regulamentar a questão, em seu papel fundamental de trazer soluções específicas e adequadas às diferentes realidades vivenciadas em cada setor econômico e região do País — a chamada “adequação setorial negociada”.
Aqui, porém, reside outro desafio de relações trabalhistas, já que o sistema sindical ainda vigente em nosso país, carente de plena liberdade sindical, não permite a constituição de sindicatos para representar e defender os interesses de micros e pequenas empresas e de seus respectivos empregados.
Leis municipais também podem dispor sobre o funcionamento de atividades econômicas, especialmente do comércio, em domingos e feriados, o que há de ser verificado.
Para as atividades autorizadas a funcionar sem interrupção, uma escala há de ser estabelecida, de forma que o repouso semanal remunerado do empregado recaia aos domingos com determinada frequência.
Na lei que trata dos comerciários (10.101/00), há definição no sentido de que o descanso semanal deve coincidir com os domingos pelo menos uma vez no período máximo de três semanas.
Aos demais setores autorizados a trabalhar aos domingos, há uma portaria antiga do extinto Ministério do Trabalho dispondo sobre a coincidência com o domingo pelo menos a cada sete semanas. Na Justiça do Trabalho, no entanto, existem decisões que consideram que a regra dos comerciários há de ser aplicada a todos, por analogia.
Quanto à remuneração, regra geral, o trabalho em domingos por si só não gera direito ao pagamento em dobro, desde que assegurado o obrigatório descanso semanal remunerado em outro dia da semana, conforme a escala estabelecida.
Já o trabalho em feriados gera ao empregado o direito de receber a remuneração em dobro, salvo se outro dia de folga for concedido, em compensação. A exceção fica para os empregados que atuam na escala 12x36, onde, segundo a lei, a remuneração mensal pactuada já abrange os pagamentos devidos pelo descanso em feriados.
Por fim, vale lembrar, mais uma vez, que normas coletivas podem tratar destas questões, o que há de ser sempre verificado.
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