Leila Jansen, da Chem4u: Ela recebeu consultoria jurídica, contábil, de RH e de marketing (Fabiano Accorsi)
Da Redação
Publicado em 24 de dezembro de 2012 às 05h00.
São Paulo - O paulista Paulo Rogério Vieira, de 40 anos, começou como muitos empreendedores — apenas com uma ideia na cabeça e um papel na mão. Comprador compulsivo de lojas online (definição que Vieira deu a si próprio), ele sentia falta de um serviço que permitisse fazer compras em mais de uma loja sem ter de mudar de site.
Assim nasceu o Ningo, uma plataforma que permite adquirir produtos de diferentes lojas usando o mesmo carrinho. Vieira encontrou no Cietec, incubadora ligada à Universidade de São Paulo, apoio para estruturar o negócio. Os coordenadores do Cietec o ajudaram a contratar funcionários e a adaptar o serviço para tablets e TV digital.
"Por três anos, o Ningo era uma salinha onde só cabiam mesa e computador", diz Vieira. "O lugar era pequeno, mas a ajuda foi grande." Em 2011, o Ningo não era mais um bebezinho. O site estava no ar e as primeiras parcerias tinham sido fechadas. "Era hora de dar o segundo passo e ganhar mais clientes", diz Vieira.
Para isso, ele precisava de capital, mas não era fácil obtê-lo apenas por meio do Cietec. "Pedi ajuda a uma aceleradora", diz. Lá, Vieira se preparou para negociar com investidores. No início do ano conseguiu um aporte de um fundo de investimento — hoje o site dá acesso a grandes clientes, como Livraria Saraiva e Ricardo Eletro.
Empresas que começam em incubadoras não são exatamente uma novidade — no Brasil existem cerca de 380 delas, de acordo com a Anprotec, associação que reúne essas instituições. Casos como o de Vieira — cuja empresa começou dentro de uma incubadora e foi "promovida" a aceleradora — são mais recentes.
As aceleradoras — um tipo de instituição de apoio a novos negócios que já deram os primeiros passos — são comuns nos Estados Unidos. No Brasil, elas começaram a surgir de dois anos para cá, geralmente fundadas por empreendedores mais experientes ou investidores.
É provável que histórias como as de Vieira se tornem muito mais frequentes daqui por diante. Não param de surgir novas aceleradoras no país. “Não existe uma contagem oficial, mas estima-se que já existam umas 20”, diz Rafael Duton, fundador da 21212, aceleradora com sede no Rio de Janeiro que apoia negócios que usam a internet como base de operação.
Criadas na década de 90 nos Estados Unidos, as aceleradoras chegaram ao Brasil atraídas pela recente explosão de negócios inovadores que está acontecendo no país. "Estamos formando uma estrutura de apoio a empresas iniciantes parecida com a que existe nos Estados Unidos", diz Anthony Eigier, diretor da aceleradora paulista Tree Labs.
O dilema de quem empreende é saber quando e qual dos dois tipos de instituição de apoio procurar. “De modo geral, as aceleradoras exigem pelo menos um demo do produto ou serviço a ser aperfeiçoado enquanto a empresa está sendo acelerada”, diz Duton. As incubadoras costumam ser mais flexíveis.
Na maioria delas, não é necessário apresentar de imediato um plano muito claro de como a ideia será transformada em negócio. "Acolhemos tanto o jovem estudante que não sabe por onde começar quanto o executivo que detectou uma oportunidade, abandonou a carreira e quis abrir o próprio negócio do zero", diz Sérgio Risola, diretor do Cietec.
Do lado do empreendedor, o que interessa é saber se a instituição disposta a recebê-lo tem condições de ajudar a empresa no estágio de crescimento em que está. Nas aceleradoras, investidores, executivos e empreendedores trabalham voluntariamente como mentores.
"Eles sugerem mudanças pontuais para dar a um produto ou serviço o apelo de vendas necessário", diz Júlia Zardo, gerente do Instituto Gênesis, incubadora ligada à Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. "Os profissionais das incubadoras estão mais concentrados em aspectos básicos de gestão, como controle financeiro e desenvolvimento de campanhas de marketing."
Era esse apoio inicial que a engenheira Leila Jansen, de 54 anos, precisava para colocar de pé a Chem4u, pequena empresa do setor químico instalada no Cietec. Leila tinha uma carreira em empresas desse mercado, como Saint-Gobain e Rhodia. Em 2008, ela e o marido, José Ulisses Jansen, também engenheiro químico, decidiram transformar uma tese de doutorado dele em produto.
O casal foi aceito pela incubadora da USP. "Recebemos consultoria jurídica, contábil, de recursos humanos e de marketing", diz Leila. "É uma ajuda fundamental para quem vem da área técnica e não tem experiência nenhuma em gestão."
A Chem4u faz uso de pesquisas de nanotecnologia para desenvolver vernizes antibactericidas, que podem ser usados para imunizar locais de fácil contaminação, como superfícies de madeira e paredes de hospital. "Em 2013, vamos iniciar a comercialização dos primeiros produtos", diz Leila.
A infraestrutura oferecida por incubadoras e aceleradoras também é um ponto importante de análise. Numa aceleradora, normalmente o espaço físico parece um centro de convivência. "O dia costuma ser preenchido com palestras, workshops e reuniões relâmpago", diz Carlos Pessoa, diretor da Wayra, aceleradora mantida em 12 países pelo grupo Telefônica/Vivo.
As incubadoras costumam manter convênio com laboratórios de universidades — algo fundamental para negócios que demandam pesquisas, como os das áreas de biotecnologia, medicina e saúde, meio ambiente e eletroeletrônica.
A duração do apoio também pesa na escolha entre os dois formatos. Numa incubadora a ajuda pode se estender por até quatro anos. “É um prazo bom para negócios que dependem de criar novas tecnologias ou da regularização de documentos e licenças governamentais que demoram meses para sair”, diz Risola.
Nas aceleradoras, o prazo costuma variar de três a seis meses, no máximo. "Trabalhamos contra o tempo", diz Pessoa, da Wayra. No escritório da Wayra de São Paulo, há dez startups. Pendurado no teto, há um relógio com contagem regressiva — quanto falta para a turma se "formar" e continuar os negócios por conta própria.
As incubadoras cobram aluguel pelo uso do espaço e pelas assessorias prestadas — os valores são, em média, 40% abaixo dos de mercado. Depois que saem da incubadora, os empreendedores precisam colaborar com os que entram. "Empresas que conquistam independência passam a contribuir com uma taxa que geralmente varia de 1% a 3% do faturamento", diz Júlia, do Instituto Gênesis. "O subsídio deve ser pago por um período idêntico ao que a empresa ficou incubada."
A dinâmica das aceleradoras é outra. Elas se tornam sócias do empreendimento que apoiam e ficam com uma participação acionária, que costuma variar de 5% a 20%. Se a empresa de fato acelerar, elas fazem um aporte (ou ajudam a encontrar quem o faça). Se a empresa não for para a frente, a aceleradora que assumiu o risco não cobra nada pela estrutura nem pelas consultorias.
Quem tentar se filiar a uma incubadora ou a uma aceleradora pode descobrir que, às vezes, elas não obedecem a 100% das características descritas até aqui. Há incubadoras que podem aceitar, por algum tempo, uma empresa mais desenvolvida e aceleradoras que abraçam negócios menos maduros do que o ideal.
No caso de donos de empresas já incubadas, a hora de mudar de "escola" também não é resultado de um cálculo exato. Depende de uma junção de fatores — se o produto está pronto para ir ao mercado, a eficiência da gestão e a necessidade de capitalização do negócio. O normal é que um desses indicadores se sobreponha.
No caso de Vieira, do Ningo, foi a necessidade de buscar investidores. Para outros, o fator preponderante pode ser o grau de desenvolvimento do produto. Em comum, são negócios que não estão mais na fase zero.
"Eu não imaginava minha empresa dentro de uma incubadora porque já tenho um produto quase pronto", afirma Maurício de Almeida, de 35 anos, fundador do site Recruto, que ajuda profissionais de RH a administrar e a divulgar vagas de emprego. "O que eu mais precisava era de bons contatos para me apresentar a investidores e conseguir marcar reuniões com possíveis clientes."
O sistema da Recruto concentra numa única tela o recebimento de currículos vindos de vários canais — LinkedIn, anúncios, cartazes em universidades. Em julho deste ano, Almeida passou no processo seletivo da primeira turma da aceleradora Tree Labs, que selecionou cinco empresas iniciantes para trabalharem juntas por seis meses num sobrado do bairro de Higienópolis, em São Paulo. Cada uma recebeu um primeiro aporte de 11.000 reais, suficientes para pagar algumas contas.
Almeida acredita que as conversas com outros empreendedores e o contato intenso com os mentores são um dos pontos mais atrativos de uma aceleradora. "Foi por indicação de um mentor que busquei headhunters para oferecer minha ferramenta", diz Almeida. "Antes eu só procurava multinacionais."
A Recruto ainda não gera receitas, mas 30 possíveis clientes estão testando a ferramenta. O estágio de Almeida na Tree Labs acaba neste mês. "Estou ansioso para saber o que vai acontecer depois", diz Almeida. O último dia do programa está reservado ao demo-day ("dia da demonstração final", em português), evento em que todos apresentam os resultados obtidos. A plateia não poderia ser mais adequada: investidores que querem colocar dinheiro em negócios promissores.