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Uma carta-bomba piora ainda mais o ano do Uber

Revelações de um ex-funcionário indicam que a companhia tinha uma equipe especializada em roubar segredos dos concorrentes

Travis Kalanick, do Uber: um ano pra lá de complicado fez a empresa perder cerca de 30% de seu valor, segundo oferta recente do Softbank (Qilai Shen/Bloomberg)

Travis Kalanick, do Uber: um ano pra lá de complicado fez a empresa perder cerca de 30% de seu valor, segundo oferta recente do Softbank (Qilai Shen/Bloomberg)

DR

Da Redação

Publicado em 28 de novembro de 2017 às 21h23.

Última atualização em 28 de novembro de 2017 às 21h25.

Para um grande número de companhias – de automóveis e de tecnologia – o carro autônomo representa um futuro promissor. Para o Uber, trata-se cada vez mais de um passado comprometedor.

Isso ficou claro hoje, dia 28, com o testemunho de um ex-funcionário do Uber, Richard Jacobs, perante a corte encarregada de julgar uma ação de roubo de patentes.

A acusação é de que a divisão encarregada de criar carros autônomos para o Uber basicamente roubou segredos da Waymo – uma subsidiária da Alphabet, holding que controla o Google.

Jacobs, que trabalhou num grupo de serviços estratégicos do Uber, afirmou que a equipe de análise de mercado da empresa tinha um único objetivo: encontrar, e talvez roubar, segredos comerciais de outras companhias.

Essa revelação estava numa carta que o advogado de Jacobs escreveu há seis meses para um advogado do Uber. A carta, supunha-se, continha alegações de que o Uber praticava espionagem industrial. O Uber não a apresentou à corte, o que o juiz do caso, William Alsup, considerou uma obstrução de justiça, por recusar acesso a evidências do caso.

Foi por isso que Alsup convocou Jacobs. E seu testemunho foi desastroso para o Uber. O julgamento, que estava marcado para começar no próximo dia 4, foi adiado. O novo prazo dará mais tempo à Waymo para recolher novas evidências a seu favor. Sem contar que o humor da corte não está lá essas coisas para o Uber.

De quem é a autonomia?

A ação judicial começou em fevereiro, e foi mais um dos escândalos que contribuíram para que a startup de tecnologia mais valorizada do mundo entrasse em crise e fosse obrigada a afastar seu co-fundador e CEO, Travis Kalanick.

No livro The Upstarts, sobre o Uber e a Airbnb, o jornalista Brad Stone narra o início do conflito, quando o Google ainda fazia parte do conselho de administração do Uber. Numa reunião informal, um executivo do Google comentou que a empresa apostava na tecnologia de carros sem motorista e Kalanick se deu conta de que aquele era o futuro do mercado de transportes. E que, se dominasse essa tecnologia, o Google não precisaria da parceria com o Uber.

Foi então que Kalanick decidiu investir nessa tecnologia (e romper com o Google, que perdeu o direito de assistir às reuniões do conselho).

O que Stone não narra no livro, porque esses fatos só vieram à tona este ano, foi o modo agressivo com que Kalanick entrou na disputa pelo carro autônomo.

Aparentemente, suas conversas com Anthony Levandowski, um dos engenheiros seniores do projeto do Google (que mais tarde se tornaria uma divisão independente, a Waymo), cruzaram alguns limites. Para todos os efeitos, Levandowski pediu demissão do Google para formar sua própria empresa, a Otto. E esta foi comprada pelo Uber, num caso de acqui-hire (contratação por aquisição).

Algumas investigações apontam, porém, que Levandowski e Kalanick andaram conversando sobre sua parceria antes de Levandowski sair do Google. E, pior: ao esvaziar sua mesa de trabalho, ele teria levado 14.000 documentos sigilosos da empresa.

Disputas de patentes são uma das atividades mais comuns no mundo da tecnologia. E as brigas costumam ficar feias.

O Uber nega veementemente que tenha se aproveitado de segredos da Waymo. Mas Levandowski recorreu à quinta emenda da Constituição americana (basicamente, seu direito de ficar calado para não testemunhar contra si próprio). E o projeto de carro autônomo do Uber também entrou numa espécie de período de silêncio.

Um tombo de 30%

O novo CEO do Uber, Dara Khosrowshahi, assumiu o posto em agosto prometendo limpar a companhia de sua mentalidade agressiva, de crescimento a qualquer custo – o que incluiu espionagem de autoridades e concorrentes, confrontos com os motoristas que formam sua frota, uma cultura de assédio sexual e moral.

Não à toa, a empresa está negociando uma nova rodada de investimentos que pode indicar uma queda de 30% em seu valor. É sempre mais difícil apontar quanto vale uma empresa fechada, mas em geral faz-se uma conta multiplicando-se a fatia vendida em rodadas de investimento pela quantidade de dinheiro recebida. Por esse método, o Uber valia 69 bilhões de dólares.

Porém, se chegar a termo a atual negociação do grupo japonês Softbank e alguns parceiros, para injetar 6 bilhões de dólares no Uber, o mesmo método indicará um valor de 48 bilhões para a companhia. Seria um tombo simbólico, já que faria o Uber perder o posto de startup mais valiosa do mundo para a chinesa Didi, que domina o mercado de transportes por aplicativo no país, e vale 50 bilhões de dólares.

Faz sentido que o Uber tenha perdido valor neste ano tão repleto de turbulências – em que seu principal rival, o Lyft, não só ganhou participação de mercado como anunciou, no final de setembro, que está trabalhando com a Ford e a GM para desenvolver sua futura frota de carros autônomos.

Juntando todas as dificuldades – reconstrução cultural, resolução de impasses regulatórios com inúmeras cidades pelo mundo, a ameaça de uma multa e um severo baque à aspiração de uma frota de carros autônomos – o mínimo que se pode dizer é que o Uber, o unicórnio que mais rápido corria no Vale do Silício, arrisca ficar empacado num baita de um congestionamento.

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