Polícia faz operação na casa de Ghosn em Tóquio e Turquia prende pilotos
Autoridades tentam esclarecer as circunstância da fuga do ex-CEO da aliança Renault-Nissan. Líbano recebeu ordem de prisão da Interpol
Agência O Globo
Publicado em 3 de janeiro de 2020 às 06h45.
TÓQUIO E ISTAMBUL — A polícia fez uma operação nesta quinta-feira na residência de Carlos Ghosn em Tóquio, ao mesmo tempo que as autoridades turcas anunciaram a detenção de várias pessoas na tentativa de elucidar as circunstâncias da fuga para o Líbano, via Istambul, do ex-titã da indústria automobilística.
Canais de TV japoneses exibiram nesta quinta-feira imagens de policiais entrando na casa de Tóquio na qual o ex-CEO da aliança Renault-Nissan estava em prisão domiciliar.
Já de acordo com a agência de notícias DHA, a polícia turca prendeu sete pessoas, incluindo quatro pilotos, sob suspeita de auxiliar Ghosn a viajar ao Líbano a partir de um aeroporto de Istambul, onde ele chegou em um voo procedente do Japão.
Também nesta quinta-feira, o governo do Líbano recebeu um mandado de prisão de Ghosn emitido pela Interpol, anunciou o ministro libanês da Justiça, Albert Sarhane.
A ordem, um alerta vermelho da Interpol que pede às autoridades para prender uma pessoa procurada, foi recebida pelas forças de segurança interna do Líbano, e ainda não foi encaminhada ao Judiciário, afirmou a fonte citada pela agência Reuters.
"O Ministério Público (...) recebeu um alerta vermelho da Interpol sobre o caso Carlos Ghosn", disse Sarhane, citado pela agência de notícias oficial ANI.
Ghosn desembarcou na segunda-feira em Beirute, onde publicou um comunicado à imprensa, onde afirmou que ' não fugiu da justiça, mas sim se libertou da injustiça e da perseguição política no Japão'. Sua equipe de comunicação confirmou à AFP que ele concederá uma entrevista coletiva nos próximos dias.
O executivo foi detido em Tóquio em novembro de 2018, acusado de fraude financeira, e deveria ser julgado no Japão a partir de abril de 2020. Depois de passar 130 dias na prisão, ele estava em detenção domiciliar.
O homem que chegou a ser o CEO mais bem pago do Japão enfrenta quatro acusações neste país: duas por renda diferida não declarada pela Nissan às autoridades da Bolsa e duas por abuso de confiança com agravante.
As circunstâncias de sua fuga, no entanto, permanecem muito confusas. De caixa de instrumento a voo secreto, são algumas das teorias sobre a fuga do ex-executivo.
De acordo com fontes, Carlos Ghosn decidiu fugir do Japão depois de saber que seu julgamento foi adiado para abril de 2021, e também porque não teve permissão de falar com a esposa, Carole, disseram fontes próximas do ex-chefe da Nissan nesta quinta-feira.
De acordo com fontes da investigação citadas pela imprensa japonesa, o Ministério Público de Tóquio está examinando as imagens das câmeras de segurança na entrada de sua residência e no bairro em que morava.
O governo da França indicou que Ghosn, que tem nacionalidades francesa, brasileira e libanesa, não será extraditado se entrar em território francês porque o país nunca extradita seus cidadãos. A afirmação foi feita pela secretária de Estado de Economia, Agnès Pannier-Runacher, ao canal BFMTV.
Além disso, uma fonte próxima ao caso confirmou nesta quinta-feira que Ghosn tinha dois passaportes franceses e um dos documentos estava com ele. A fonte entrevistada pela AFP indicou ainda que os advogados do executivo mantinham três passaportes de Ghosn (francês, libanês e brasileiro) guardados em um cofre.
Mas o empresário recebeu uma autorização excepcional de um tribunal para carregar um segundo passaporte francês, que levava dentro de uma espécie de estojo, que tinha um código secreto guardado por seus advogados.
Ghosn estava proibido de viajar ao exterior, mas se deslocava com relativa liberdade dentro do Japão, onde podia sair da capital com algumas restrições, um sistema aplicado a outros estrangeiros em prisão provisória.
Na eventualidade de um controle policial, ele precisava entrar em contato com o advogado que tinha o código para que este comparecesse ao local em que o executivo estivesse (o código não poderia ser comunicado por telefone à polícia), informou a mesma fonte.
Ghosn, no entanto, não teria utilizado este passaporte para fugir do país, e sim um "meio ilegal", informou o canal NHK, que também citou fontes próximas à investigação.
De acordo com a presidência libanesa, Ghosn entrou no país procedente da Turquia com um passaporte francês e um documento de identidade libanês.
Há suspeitas de que Ghosn teria utilizado um jato privado que decolou do aeroporto de Kansai, na região oeste do Japão.
Um avião deste tipo decolou em 29 de dezembro às 23h (horário do Japão) do aeroporto, administrado pelo grupo francês Vinci e o japonês Orix, com destino a Istambul, segundo a imprensa nipônica.
A fuga de Ghosn provocou grande consternação no Japão e seus advogados consideraram a atitude "indesculpável", embora tenham afirmado entender as razões de seu descontentamento com a justiça japonesa.
Segundo a porta-voz da polícia turca, além dos pilitos, os outros detidos são dois trabalhadores de solo de um aeroporto e um funcionário de transporte de carga, e os sete devem comparecer perante um tribunal nesta quinta-feira.
A imprensa informou que o Ministério do Interior da Turquia iniciou uma investigação sobre o trajeto de Ghosn. Pessoas familiarizadas com o assunto disseram à Reuters que Ghosn, um dos executivos mais conhecidos do mundo, chegou a Beirute em um jato particular que partiu de Istambul na segunda-feira.
O site de notícias Hurriyet, citando uma autoridade do Ministério do Interior, disse que a polícia de fronteira turca não foi notificada sobre a chegada de Ghosn e que nem sua entrada nem saída foram registradas.
Segundo o Hurriyet, o avião que levou Ghosn chegou às 5h30m da manhã de segunda-feira ao aeroporto de Ataturk, em Istambul, e os promotores ordenaram as prisões efetuadas nesta quinta-feira depois de ampliarem suas investigações.
Dados de rastreamento de voo sugerem que Ghosn usou dois aviões diferentes para voar para Istambul e depois para o Líbano.