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Como a Suzano vai reagir à fusão VCP-Aracruz

A empresa já tem prontos os projetos para investir mais de US$ 4 bilhões e reduzir a distância que a separa da rival

EXAME.com (EXAME.com)
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Da Redação

Publicado em 10 de outubro de 2010 às 04h11.

No começo deste ano, a união entre Votorantim Celulose e Papel (VCP) e Aracruz criou a maior empresa de celulose de eucalipto do mundo. Para a maior rival brasileira da nova empresa, a Suzano Papel e Celulose, a conclusão do acordo só poderia ser frustrante. Primeiro porque a Suzano também tinha interesse em comprar a Aracruz e chegou a contratar o banco de investimentos Lazard para assessorá-la. O preço aceito pela VCP para a aquisição, no entanto, enterrou esses planos.

A conclusão do negócio com a rival, no entanto, também gerou no mercado a impressão de que a Suzano, de uma hora para outra, ficou pequena. A empresa deve produzir 1,75 milhão de toneladas de celulose neste ano -- ou pouco menos de um terço das 5,8 milhões de toneladas da VCP-Aracruz.

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Como não existem outras empresas de celulose com o mesmo porte e a mesma competitividade da Aracruz à venda em todo o planeta, um observador distante poderia acreditar que o clima seria de depressão generalizada nos corredores da sede da Suzano, em São Paulo. Mas não é isso que transparece do discurso de seus executivos.

A empresa já tem prontos os projetos que lhe permitirão aumentar a capacidade de produção de celulose para 6 milhões de toneladas anuais. É verdade que isso leva tempo. Um eucalipto demora cerca de sete anos para crescer antes de ser cortado e utilizado na produção de celulose - e, em geral, é esse o tempo gasto para que um projeto de celulose saia do papel. A Suzano, no entanto, prepara a instalação de duas novas fábricas e tem um terceiro projeto pronto para sair do forno.

Segundo Felipe Reis, analista de papel e celulose da corretora do Santander, a debilidade financeira da VCP-Aracruz dará à Suzano o tempo necessário para desenvolver esses projetos e atender ao crescimento de demanda nos próximos anos. "A VCP-Aracruz ainda não está com a musculatura financeira totalmente fortalecida para voltar a investir, Primeiro, ela terá que equacionar uma dívida relativamente alta. Por isso, vários projetos de investimento que as duas tinham quando eram empresas separadas foram, no mínimo, postergados", afirma.

A VCP-Aracruz terminou o primeiro semestre com uma dívida líquida superior a 13 bilhões de reais. Além das perdas com derivativos que quase quebraram a Aracruz no ano passado, a VCP aceitou pagar um preço alto para a aquisição da rival. As famílias Safra e Lorentzen receberam da VCP, cada uma, 2,7 bilhões de reais pela venda de suas participações na Aracruz. O valor pode ser considerado salgado porque foi acertado entre julho e agosto do ano passado, antes que a Aracruz registrasse o prejuízo bilionário com derivativos.

A empresa terá de usar o caixa futuro para reduzir esse endividamento. "Será difícil para a empresa ter uma geração de caixa bastante positiva descontando os custos de produção, o pagamento mínimo de dividendos e as parcelas da dívida", diz Reis, do Santander. Por esse motivo, o mercado tem dúvidas se a VCP-Aracruz conseguirá cumprir a meta de produzir 9,3 milhões de toneladas de celulose por ano até 2020. (Continua)


A Suzano, por sua vez, tem uma dívida de 4,5 bilhões de reais, que também não pode ser considerada baixa. A empresa, no entanto, deve gerar caixa suficiente para reduzir significativamente esse endividamento nos próximos trimestres. Além disso, se precisar de recursos para investir, a família Feffer, que controla a Suzano, dispõe de capital para injetar na empresa porque vendeu sua petroquímica para a Petrobras e ainda não gastou os recursos. Por último, a empresa também poderia ir ao mercado de capitais para levantar recursos. O diretor de Relações com Investidores da Suzano, André Dorf, diz, no entanto, que essa opção está descartada ao menos até 2011, quando a fábrica no Maranhão começará a ser construída.

A opção de não fazer uma captação agora faz sentido para a própria Suzano. Segundo Dorf, quando a empresa construiu sua última fábrica, em Mucuri (BA), o valor dessa nova unidade só puxou para cima as cotações das ações da empresa dois anos antes dela entrar em operação. Baseado nessa experiência, o diretor diz que até o momento a inauguração da fábrica no Maranhão ainda não está "precificada" nos papéis da empresa.

Os projetos

Com a inauguração dos três novos projetos, a Suzano pretende manter o custo de produção de celulose de fibra curta em190 dólares por tonelada, um dos menores do mundo. As projeções para o custo de produção da VCP-Aracruz apontam para 240 dólares por tonelada. No hemisfério norte, onde estão localizados os dois maiores produtores mundiais de celulose e papel, o custo de produção está acima de 500 dólares a tonelada, o que os obriga a trabalhar com margens de lucro apertadíssimas neste momento.

As três novas fábricas da Suzano vão demandar investimentos de 570 milhões de dólares na área florestal e 3,6 bilhões de dólares nas novas unidades. A primeira será inaugurada no Maranhão e deve acontecer em 2013. A base florestal inclui uma área adquirida da Vale e outras terras que estão em processo de aquisição. O início das obras está programado para 2011. O único ponto que ainda está em estudo é a forma de escoamento da produção. Uma opção é utilizar o porto de Itaqui (MA) por meio da ferrovia da Vale que liga Carajás ao terminal marítimo. A outra prevê conseguir outro porto próximo a São Luís (MA).

A segunda planta será erguida no Piauí e ficará pronta em 2014. As terras estão em processo de aquisição e a forma de escoamento - por Pecém (CE) ou Itaqui (MA) - também segue em aberto. "A grande vantagem é que nesses dois estados as terras chegam a custar um décimo do preço pago em outras regiões produtoras de eucalipto", afirma Dorf, da Suzano. O local onde será erguida a terceira planta e o prazo para a ampliação da unidade de Mucuri (BA) ainda não foram definidos.

Super eucalipto

Apesar do clima extremamente seco em estados como Maranhão e Piauí, a expectativa da Suzano é obter uma produtividade média muito próxima das demais florestas plantadas em outros estados. A empresa tem utilizado mudas de eucalipto adaptadas ao semi-árido desenvolvidas por meio de projetos de aprimoramento genético. A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) utilizou o cruzamento genético para desenvolver um eucalipto tropical. Segundo o pesquisador Dario Grattapaglia, da Embrapa, essa espécie possui um maior índice de crescimento e adaptabilidade ao clima seco.

As pesquisas realizadas pela Embrapa e pelas empresas brasileiras de celulose permitiram que a produtividade de eucalipto no país alcançasse 45 a 50 metros cúbicos por hectare por ano - muito superior a dos Estados Unidos, por exemplo, que é de 15 a 20 metros cúbicos. "O Brasil é um país único nesse segmento no mundo. É aqui que estão 85% dos planos de expansão em celulose no mundo. Os custos de produção das empresas escandinavas e canadenses praticamente se igualam aos preços do próprio produto. A tendência é a produção mundial de celulose migrar do hemisfério norte para o hemisfério sul, principalmente América do Sul e Brasil", afirma Reis, do Santander. (Continua)


Além do menor custo de produção, a competitividade do Brasil também se baseia em sustentabilidade. "Atualmente, 100% da produção de celulose e papel têm como matéria-prima árvores provenientes de florestas plantadas. Isso ajudou as empresas brasileiras a se tornar referência em relação às práticas internacionais de manejo florestal", afirma a presidente-executiva da Bracelpa, Elizabeth de Carvalhaes.

Além disso, as florestas brasileiras são certificadas por órgãos reconhecidos internacionalmente, tais como o Forest Stewardship Council (FSC) e o Programa Nacional de Certificação Florestal (Cerflor). "No futuro, cada vez mais redes varejistas, como o Wal-Mart e o Carrefour, vão exigir que aquela resma de papel na gôndola seja certificada. O consumidor norte-americano e o europeu só irão comprar se conhecerem a procedência da mercadoria", afirma Reis, do Santander.

Cenário atual

Apesar das vantagens competitivas, Elizabeth, da Bracelpa, vê com preocupação o atual cenário para as empresas. A principal preocupação é o câmbio. Quando o real se aprecia, os grandes exportadores arrecadam menos reais com as mesmas vendas em dólar, comprimindo as margens operacionais no curto prazo. "O faturamento das empresas neste ano vai depender de um aumento das vendas neste semestre, de melhores preços e do impacto da valorização do real [frente ao dólar]", diz.

Com a crise, cerca de 8 milhões de toneladas de celulose deixaram de ser produzidas no primeiro semestre em todo o mundo. Por suas vantagens competitivas, o Brasil escapou praticamente intacto. A empresas instaladas no país produziram 6,32 milhões de toneladas, ou praticamente o mesmo volume do ano passado.

O fechamento de fábricas de celulose e papel na Escandinávia e a forte demanda das fabricantes chinesas de papel ajudaram as exportações brasileiras, que cresceram 18% em volume no primeiro semestre. Devido à queda dos preços no mercado internacional, no entanto, a receita com os embarques caiu 17,1% no período, para 2,3 bilhões de dólares. Com a crise, os preços da celulose, que vinham em uma trajetória ascendente e chegaram a bater 850 dólares a tonelada, despencaram para 400 dólares a tonelada. Atualmente, estão em cerca de 500 dólares.

Apesar de todas as dificuldades do cenário atual, não há dúvidas sobre o futuro promissor das empresas brasileiras de celulose. Com margens de lucro elevadas, uma logística de distribuição adequada, clientes cativos e linhas de produção com escala suficiente, as empresas brasileiras tendem a dominar cada vez mais o mercado internacional. No curto prazo, a maioria dos analistas de mercado aposta que a Suzano será a empresa melhor posicionada para crescer. Daqui a alguns anos, no entanto, a VCP-Aracruz já terá reduzido sua dívida e estará pronta para retomar projetos de expansão. "Daqui a 15 ou 20 anos, a VCP-Aracruz não vai ter competidor não só no Brasil mas também no mundo", afirma Reis, do Santander. Manter-se bem próxima desse gigante é hoje o objetivo da Suzano.

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