Como a Avell deu a volta por cima e teve o 'melhor ano de sua história'
A empresa de Santa Catarina, que fez sucesso com produtos para gamers, cresceu rápido demais em 2020 e quase não conseguiu se manter. Foi necessário "arrumar a casa" e até trocar de CEO
Repórter
Publicado em 27 de novembro de 2024 às 14h32.
Última atualização em 27 de novembro de 2024 às 16h03.
Comemorando duas décadas em 2024, a catarinense Avell precisou revisar toda a sua operação e estratégia de mercado.
A empresa , conhecida por notebooks para gamers e profissionais, nunca esteve no pódio entre os grandes nomes da tecnologia — e nunca quis estar. Mas, após um 'boom' de vendas inesperado em 2020, a Avell percebeu que precisaria reavaliar tudo para continuar crescendo.
Agora, um novo capítulo começou na tímida competidora de marcas como as brasileiras Multilaser e Positivo, e as internacionais Dell, Lenovo, HP e Asus.
O fundador Emerson Salomão acaba de passar o comando da empresa para Vladimir Rissardi. O executivo começou prestando consultoria para a Avell no início da “arrumação da casa”, e nunca mais saiu.
Salomão, por sua vez, decidiu ficar somente no conselho, onde busca atuar de forma mais estratégica e menos operacional.
Quase dois anos após o começo da "faxina",a empresa de notebooks projeta um faturamento de R$ 210 milhões em 2024, um crescimento de 50% em relação a 2023.
Mas, segundo os dois, ainda há muito o que fazer.
Primeira fase
Originalmente de Joinville, Emerson Salomão fundou a empresa em 1997, então sob o nome de Notebook Century (ou "século do notebook").
A empresa começou revendendo notebooks de outras marcas. Após vários formatos de negócio, a hoje chamada Avell se consolidou quando decidiu vender notebooks de alto desempenho em 2004.
Enquanto marcas internacionais dominavam o mercado, a 'jovem' catarinense se posicionava como uma alternativa nacional para gamers e profissionais de arquitetura, edição de vídeo e até medicina. Estes profissionais costumam instalar aplicativos pesados, que demandam um processador maior.
Mas, embora entregasse produtos de qualidade, a empresa nunca alcançou grande escala. Os custos de fabricação, dependência de componentes importados e um mercado altamente competitivo tornaram o crescimento difícil.
" Nós nos acomodamos no nicho, e isso nos deixou longe dos holofotes, mas também atrasados em algumas inovações", admite Salomão.
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Como muitas empresas de tecnologia, a Avell viu um crescimento expressivo durante a pandemia de 2020.
A necessidade de equipamentos para trabalho remoto e entretenimento impulsionou a demanda por notebooks.
O faturamento da Avell praticamente dobrou, atingindo a marca de R$ 120 milhões— ante R$ 65 milhões em 2019 e R$ 58 milhões em 2018.
A empresa fechou o ano com recordes de vendas, mas os bastidores mostravam outra realidade. O boom de 2020 revelou uma estrutura interna insuficiente para lidar com o crescimento.
"Foi o caos. Crescemos rápido demais e, ao mesmo tempo, desorganizadamente.Havia problemas com logística, entregas atrasadas e clientes frustrados. Isso quase comprometeu a operação inteira", diz Salomão.
Logo após a alta demanda, a Avell passou por 2021 e 2022 com problemas operacionais que quase minaram o negócio.
Segundo Salomão, a empresa também enfrentou desafios financeiros "em termos de EBITDA e lucro". Os faturamentos foram R$ 203,5 milhões e R$ 163,4 milhões, respectivamente.
Parando para recomeçar
No final de 2022, Salomão sabia que era hora de desacelerar. O hoje presidente Vladimir Rissardi foi contratado como consultor para diagnosticar os problemas e propor uma reestruturação.
Esse trabalho de três meses revelou a necessidade de mudanças radicais, como reposicionar o portfólio, implementar controles mais rígidos etrocar praticamente todo o time de liderança.
Rissardi assumiu como diretor de operações em janeiro de 2023 e começou uma nova etapa no plano de reestruturação da Avell. O executivo detalha que foi necessário reorganizar os processos internos e criar mais governança.
Foram feitos cortes de processos ineficientes, investimentos em melhorias na produção e ajustes no portfólio da marca. No fim do ano, um faturamento de R$ 138,3 milhões.
O número representa uma queda em comparação ao ano anterior, mas ainda acima do resultado do ano em que a pandemia estourou. O foco não era crescer, e sim estabilizar.
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Com a casa mais organizada, a Avell conseguiu, em 2024, apresentar números animadores. A empresa projeta faturar R$ 210 milhões, um crescimento de 50% em relação a 2023.
É o melhor ano da história da companhia, mas, segundo Rissardi, não há espaço para triunfalismo.
"Estamos em uma posição melhor, mas o mercado está mais competitivo do que nunca. Precisamos provar que podemos escalar de verdade."
Os desafios para avançar
A grande aposta agora é a entrada no mercado de inteligência artificial .
Em julho, a Avell lançou sua primeira linha de notebooks com processadores otimizados para IA, uma aposta para um futuro próximo.
Segundo a plataforma de análise AltIndex,60% dos PCs e notebooks terão recursos de IA embarcados até 2026.
“Estamos falando de um mercado bilionário em crescimento, e, se não agirmos agora, podemos perder o timing ", diz Rissardi.
O paradoxo da Patagonia: de 'tudo pelo planeta' a cortes nas operaçõesMesmo com números melhores, a Avell não esconde que o caminho é cheio de obstáculos. Escalar a produção sem perder qualidade é um deles, assim como aumentar a base de clientes.
Além disso, a dependência de componentes importados e as oscilações do dólar seguem como riscos para o futuro.
A nova linha de notebooks voltada para IA é parte da estratégia de expansão, mas tanto Salomão quanto Rissardi sabem que os produtos não vão alavancar até a inteligência artificial se tornar necessária para o dia a dia de grande parte do público.
Uma lição sobre adaptação
Para Salomão, o maior aprendizado desses 20 anos foi entender que uma empresa precisa se reinventar constantemente.
"Por muito tempo ficamos confortáveis. Não éramos inovadores, apenas fazíamos o necessário. Agora sabemos que o mercado exige mais."
Com um novo comando, a Avell tenta provar que pode acompanhar as mudanças tecnológicas enquanto supera as limitações que travaram seu crescimento no passado.
O que está por vir depende de sua capacidade de se adaptar a um mercado cada vez mais exigente e competitivo.
" Queremos ser mais que sobreviventes. Nosso objetivo agora é ser relevantes em um mercado que muda a cada dia", conclui Rissardi.