Brasil 'reestreia' no mercado de fabricação de TV
Nos anos 1990, havia várias fabricantes nacionais, como Gradiente, Sharp, Cineral, que acabaram deixando a produção de TVs
Estadão Conteúdo
Publicado em 21 de junho de 2021 às 11h06.
Última atualização em 21 de junho de 2021 às 11h10.
Empresas brasileiras estão de volta à produção de televisores , depois de um longo período no qual a fabricação no País praticamente ficou nas mãos de companhias asiáticas - coreanas, chinesas e japonesas.
Nos anos 1990, havia várias fabricantes nacionais, como Gradiente, Sharp, Cineral, que acabaram deixando a produção de TVs. Agora o movimento de volta das nacionais é capitaneado por três indústrias com tradição na fabricação de eletroportáteis e eletrônicos: Mondial, Britânia e Multilaser.
Apesar de o porte das brasileiras ser muito menor do que o das gigantes coreanas que dominam o mercado, a chegada das novatas deve incomodar as multinacionais. E quem deve sair ganhando é o consumidor.
Especialistas veem para os próximos meses uma guerra de preços de TVs, mesmo considerando a alta de custos dos componentes cotados em dólar. A intenção das novas fabricantes é conquistar uma fatia das vendas de televisores no varejo, que chegam a movimentar cerca de R$ 30 bilhões por ano.
O isolamento social imposto pela pandemia aumentou a importância do entretenimento dentro de casa. As vendas de aparelhos no varejo no ano passado registraram crescimento ante 2019 e somaram 12,147 milhões de unidades, segundo a consultoria GFK.
Também a crise econômica explica parte do interesse dos novos fabricantes. Mesmo com o bolso mais apertado, o brasileiro manteve o desejo de ter uma TV conectada de tela grande.
"O consumidor passou a racionalizar a compra: procura hoje uma TV premium, mas com custo benefício maior", explica o diretor de Varejo da GFK, Fernando Baialuna.
Essa reação abriu espaço para que outras empresas começassem a explorar um novo filão de mercado que vinha se desenhando e foi acelerado pela pandemia.
Na opinião de José Jorge do Nascimento, presidente da Eletros, que reúne os fabricantes de eletroeletrônicos, o amadurecimento do produto reduziu o custo dos investimentos em tecnologia. E isso facilitou o acesso de empresas nacionais, normalmente menos capitalizadas do que as multinacionais, à produção de televisores.
Ele lembra também que, em setembro passado, a japonesa Sony deixou uma lacuna no mercado de TVs ao anunciar a saída definitiva do País.
Aceleração
A Mondial, líder em eletroportáteis, comprou a fábrica da Sony em Manaus (AM). Com isso, encurtou o plano de produzir TVs, previsto para três anos. A companhia começa a produzir TVs em outubro, e a perspectiva é que os aparelhos cheguem ao mercado em novembro.
Na avaliação de Giovanni Marins Cardoso, sócio fundador, as companhias nacionais estão vendo mais oportunidades no mercado brasileiro do que problemas e têm mais ímpeto para investir do que as multinacionais.
O empresário não revela quanto vai aplicar no novo negócio e diz que as metas de produção estão ainda em definição. A intenção é aproveitar a sinergia da marca e a capilaridade da distribuição dos eletroportáteis para vender televisores.
A Britânia é outra que pegou carona nos eletroportáteis para avançar no mercado de televisores. "Fizemos uma pesquisa e descobrimos que já estávamos presente com a marca Britânia em 98% dos lares com eletroportáteis", diz Heloísa Freitas, gerente de marketing.
A empresa, que já produz TVs com a marca Philco, começou a fabricar smart TVs de 32, 42, 50 e 55 polegadas com a marca Britânia em fevereiro, na unidade de Manaus (AM).
Desde o mês passado os produtos chegam ao varejo. "Queremos pegar a fatia de empresas que saíram do mercado e aproveitar o aumento do consumo e do entretenimento que veio com a pandemia", afirma Heloísa.
Também sem revelar investimentos e metas de vendas, ela diz que a intenção é atuar como a marca Britânia numa faixa de preço intermediário, entre R$ 200 a R$ 300 mais barato do que a concorrência, dependendo do modelo do aparelho e da loja.
Já a marca Philco, desde 2007 com a companhia, se mantém como marca de televisores com mais tecnologia e inovação. A gerente frisa que não há risco de canibalismo entre as duas marcas.
Parceria
A Multilaser, uma das principais fabricantes de itens de informática e telefonia, fechou neste ano parceria com o grupo chinês Hisense, que detém os direitos da marca Toshiba, para usar essa bandeira, que tem forte presença na memória dos brasileiros, em televisores voltados para o segmento premium.
Durante décadas a marca Toshiba esteve presente no mercado brasileiro nas TVs fabricadas pela Semp. Mas a parceria acabou em 2018. A empresa também tem TVs com a marca Multilaser, voltada para aparelhos de menor valor.
Lançados no mês passado, os aparelhos da Toshiba serão produzidos nas unidades da companhia em Manaus (AM) e Extrema (MG).
A meta é fabricar 1 milhão de televisores por ano em cinco anos, diz o vice-presidente de produto, André Poroger. Segundo ele, com a parceria, a empresa obtém tecnologia e consegue preços competitivos de igual para igual com as fabricantes coreanas.
Um dos fatores que levaram a companhia apostar no mercado de TVs foi a mudança no uso dos aparelhos: "A televisão se transformou numa plataforma de acesso à internet."
Poroger argumenta que a empresa é forte em informática, líder em tablets, por exemplo. E, com a mudança no uso da TV, houve uma convergência entre os segmentos de informática e de vídeo.
Na Multilaser, parcerias para abrir caminhos
Há mais de 30 anos no mercado, a Multilaser é uma empresa familiar, comandada desde 2003 por Alexandre Ostrowiecki, filho do fundador. A empresa começou fabricando cartuchos para impressora e avançou para outros segmentos.
Foi uma das primeiras a lançarem o tablet no País. Hoje, é uma das principais fabricantes de eletroeletrônicos.
São cerca de 5 mil produtos nos segmentos de informática, telecomunicações, esportes, itens automotivos e brinquedos distribuídos por 20 marcas e expostos em 40 mil pontos de venda no País.
Uma das estratégias da empresa tem sido firmar parcerias para chancelar os produtos com grandes marcas, como ocorreu recentemente com a Toshiba para os novos televisores. A companhia tem parceria também com HMD, que detém a marca Nokia para celulares, entre outras.
Com duas fábricas, uma na Zona Franca de Manaus (AM) e outra em Extrema (MG), e um laboratório de tecnologia e engenharia na China, a companhia emprega 3 mil pessoas e fatura R$ 3 bilhões por ano.
Britânia foi da cozinha para a sala
Fundada em 1956, em São José dos Pinhais, Região Metropolitana de Curitiba(PR), a Britânia é uma empresa familiar, de capital fechado, que começou produzindo fogareiros, fogões e móveis metálicos. Na década de 1980 ingressou em eletroportáteis e, em meados dos anos 1990, em ventilação.
Em 2002, avançou para categorias de maior porte, como batedeiras e, posteriormente, refrigeradores, fornos de micro-ondas, aparelhos de ar condicionado, por exemplo.
São mais de 1.500 produtos, e atualmente a companhia é dedicada à fabricação de eletroportáteis e eletroeletrônicos. E o velho fogareiro, dos primórdios da empresa, virou hoje o moderno cooktop.
Com fábricas em Manaus (AM), Joinville (SC), onde também tem um centro de distribuição, e escritórios em Curitiba (PR) e na China, a empresa emprega diretamente mais de 5 mil pessoas.
A companhia não revela o faturamento nem os investimentos realizados nos últimos anos. Mas a grande aposta neste momento é explorar a marca Britânia, indo da cozinha para a sala, com as TVs.
Com fábrica da Sony, Mondial acelerou meta
A Mondial, empresa de capital fechado e líder no mercado de eletroportáteis, começou em 2000 em Sorocaba(SP) com ventiladores e liquidificadores. Dois anos depois inaugurou e uma fábrica em Camaçari (BA), posteriormente transferida para uma unidade três vezes maior em Conceição de Jacuípe (BA).
Em 2005, iniciou atividades na China. Primeiro com escritório em Ningbo e, depois, com uma base em Guangzhou.
Nesse período foram agregados novos produtos, como batedeira, processador e secador, entre outros. Hoje são 401 produtos.
O grande salto ocorreu em 2020, com a compra da fábrica da Sony em Manaus (AM), uma unidade quase sete vezes maior do que a companhia operava desde 2014 na Zona Franca.
De lá já estão saindo caixas acústicas, aparelhos de som. Mas o avanço ocorre a partir de setembro e outubro, quando começa a produzir de forno de micro-ondas e TVs, seguidos pelos aparelhos de aparelhos de ar condicionado.
A companhia emprega diretamente 4,3 mil trabalhadores e fechou 2020 com faturamento de R$ 3 bilhões.
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