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Com o BNDES ficou mais fácil para o laticínio Bom Gosto

Há três anos, o laticínio foi escolhido pelo banco público para ser um dos consolidadores brasileiros do mercado de leite. Hoje é a empresa do setor que mais cresce no país

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DR

Da Redação

Publicado em 10 de março de 2011 às 20h06.

Poucos acompanharam com tanta atenção a primeira etapa da Fórmula Indy de 2010, realizada em São Paulo no dia 14 de março, como o gaúcho Wilson Zanatta. Fundador e presidente do laticínio Bom Gosto, ele saiu de Tapejara, no Rio Grande do Sul, só para assistir à corrida de perto, juntamente com a mulher e os dois filhos - para facilitar o transporte, fretou um avião, que saiu da cidade vizinha Passo Fundo, no dia do evento.

O grande momento para Zanatta estaria no pódio, onde o vencedor - no caso, o australiano Will Power - ergueria a caixinha azul e branca de longa vida da Bom Gosto no tradicional brinde com leite feito pelos vencedores da competição. O gesto, transmitido ao vivo para todo o país, foi a primeira exposição nacional da marca e o resultado mais visível do investimento de marketing de 15 milhões de reais previsto para este ano. "Para ele e também para mim, era o leite da vitória", afirma Zanatta.

Com uma série de oito aquisições desde 2007 - seis empresas e duas fábricas, a da Parmalat, em Pernambuco, e a da Nestlé, no Rio de Janeiro -, o Bom Gosto cresceu como nenhuma outra empresa de seu setor nos últimos três anos. As receitas multiplicaram por 8, de 214 milhões de reais, em 2006, para 1,6 bilhão, no ano passado (veja quadro).

A companhia, que nem aparecia entre as dez maio res compradoras de leite de produtores no país, hoje é a quarta maior, atrás de Nestlé, Perdigão e Itambé, segundo o ranking da Associação Brasileira dos Produtores de Leite. Nem mesmo a Leitbom, comprada pelo fundo GP Investments, em 2008, e que acabou de fechar um consórcio para operar três fábricas da Laep, controladora da Parmalat, acompanhou o mesmo ritmo - suas vendas cresceram 50% nos últimos dois anos. Em grande medida, a explicação para a expansão do laticínio gaúcho está na presença de um acionista poderoso - o BNDESPar, dono de 35% de seu ca pital (fatia idêntica à de Zanatta). Trata-se da segunda maior participação de capital do BNDESPar numa empresa - só atrás da companhia de energia Brasiliana.

A relação entre Zanatta e o BNDES começou há cerca de dez anos. Filho de agricultores, ele trabalhou no campo e se formou em veterinária antes de abrir seu laticínio em 1993. Sua primeira conversa com o BNDES aconteceu em 2000, numa visita à sede do BRDE, braço do banco na Região Sul. Dois anos depois, com um empréstimo de 4 milhões de reais do banco, Zanatta ampliou sua fábrica para entrar no mercado de leite longa vida - até então ele produzia queijo e leite tipo C em embalagens plásticas.

Aos poucos, foi se aproximando de antigos fornecedores da Parmalat e de cooperativas locais em dificuldade, de modo a ampliar seu volume. Em 2007, o BNDES comprou sua primeira fatia no Bom Gosto - de 23%, com aporte de 45 milhões de reais. Segundo o próprio Zanatta, sem fôlego para continuar sozinho, ele teria pedido recursos para o banco, que cedeu aos apelos. "Com o dinheiro conseguimos quitar nossas dívidas e começar uma nova fase de crescimento", diz.

"O BNDES viu firmeza em nossos planos." Mas por que o Bom Gosto e não qualquer outra empresa do setor? E por que investir em uma companhia de leite e não numa empresa têxtil ou numa fabricante de computadores? Em nota a EXAME, o banco afirmou apenas que "os princípios que nortearam a participação do BNDESPar no Bom Gosto são os mesmos utilizados em todas as demais operações: empresa com boa perspectiva de retorno, compromisso com a adoção de boas práticas de gestão e governança e realização de abertura de capital."


Na mesma proporção em que o Bom Gosto se expandiu, cresceu também o barulho que é capaz de causar entre os concorrentes. Uma das reações mais ruidosas é uma denúncia de concorrência desleal que o Ministério Público Federal de Pernambuco começou a apurar em fevereiro deste ano. Segundo os sindicatos de empresas de três estados do Nordeste, o Bom Gosto vende abaixo do preço de custo.

A empresa entrou no mercado nordestino há cerca de um ano, quando comprou a fábrica da Parmalat em Garanhuns, no interior de Pernambuco. Logo depois, assumiu a liderança no mercado local de leite longa vida, com cerca de 20% de participação. De acordo com a acusação feita ao Ministério Público Federal, o laticínio gaúcho paga mais pelo leite ao produtor e, depois, cobra menos que os concorrentes no varejo.

"Achávamos que era uma estratégia inicial para conquistar mercado, mas os preços baixaram até chegar a 98 centavos o litro. Nenhuma operação pode ter lucro com esse preço", afirma Bruno Girão, presidente do laticínio Betânia, de Fortaleza. Zanatta nega as acusações. "A denúncia é infundada e nosso departamento jurídico vai dar todas as respostas que o Ministério Público solicitar."

A despeito da polêmica, os planos de expansão do Bom Gosto daqui para a frente continuam ousados. Zanatta quer dobrar as vendas da empresa para 3,3 bilhões de reais até 2014 - tanto organicamente quanto por meio de novas aquisições num mercado que ainda conta com um grande número de concorrentes.

No segmento de leite longa vida, as três maiores marcas responderam por 24% do mercado, que movimentou 5,6 bilhões de reais em 2009, conforme dados da Nielsen. O restante é dividido entre pelo menos 80 fabricantes. Segundo consultores, o Brasil tem chance de se tornar um exportador mundial, a exemplo do que aconteceu com a indústria de carnes.

Desde 2004, os fabricantes brasileiros de leite e derivados duplicaram o volume de vendas para o exterior. "Tradicionais exportadores, como Nova Zelândia e Europa, estão no limite de produção", diz Marcelo Carvalho, diretor executivo da AgriPoint, consultoria especializada em agronegócio. "O Brasil é um dos poucos países com condições de ampliar a produção significativamente."

O Bom Gosto é hoje a maior aposta do BNDESPar no setor. O outro investimento do banco na área é no laticínio Nilza, do empresário Adhemar de Barros Neto, ex-acionista da Lacta. Com dificuldades financeiras, o Nilza está em recuperação judicial desde abril de 2009. O Bom Gosto começa a se movimentar para atender o mercado externo. Zanatta está construindo uma fábrica no Uruguai, que deve custar 30 milhões de dólares e ficará pronta em 2011. "O Uruguai já vende para consumidores mais exigentes, como a Europa. Será nossa porta de entrada para esses mercados", diz. Se depender de seu principal sócio, chegar lá será só uma questão de tempo.

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