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A saída do último Benetton: O que esperar de uma empresa familiar quando o fundador deixa o negócio?

O mundo da marca italiana de moletons não parece ser tão colorido, entre idas e vindas da família na gestão, a companhia segue tentando um caminho para sair da crise financeira que a persegue desde 2013

De acordo com estimativas de sindicatos, a Benetton acumulou perdas de 1 bilhão de euros em receita, aproximadamente 5,61 bilhões de reais desde 2013 (Sergio Gaudenti / Colaborador/Getty Images)

Publicado em 1 de junho de 2024 às 08h00.

Em meio a uma crise milionária, a Benetton, marca italiana conhecida por seus famosos agasalhos coloridos, passa por uma nova restruturação. Luciano Benetton, o cofundador de 89 anos, está de partida do cargo de presidente da companhia que fundou junto com seus três irmãos em 1965, em Treviso, na Itália. A informação foi revelada em entrevista ao jornal italiano, Corriere della Sera, na semana passada.

O mundo da Benetton não parece estar tão colorido há anos — tanto que não é a primeira vez que Luciano deixa o cargo de presidente em meio a uma crise financeira. A mesma mensagem de partida foi anunciada em 2012, quando o cofundador foi afastado do cargo devido aos fracos resultados financeiros da companhia.

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De 2013 para cá, a empresa tem acumulado anos de prejuízos. De acordo com estimativas de sindicatos, o grupo acumulou perdas de 1 bilhão de euros em receitas desde 2013. É o equivalente a 5,61 bilhões de reais desde 2013.

“A marca Benetton tem enfrentado grandes desafios nos últimos anos, devido à intensa concorrência de empresas do segmento de ‘fast-fashion’", diz Joaquim Santini, pesquisador internacional de governança corporativa.

A volta do fundador para a presidência

Em 2018, Luciano retornou para a presidência do conselho da Benetton para tentar tirar a companhia de uma nova crise. Na ocasião, uma decisão pegou o mercado de surpresa: o cofundador, o único que sobrou da família, anunciou sua saída da companhia alegando que o motivo seria uma suposta “traição” do presidente-executivo, Massimo Renon. Segundo Luciano, faltou transparência sobre um déficit de 100 milhões de euros antes de impostos.

"Resumindo, confiei neles e cometi um erro", afirmou Luciano Benetton reforçando que só teve conhecimento do acúmulo de prejuízos em setembro do ano passado.

Apesar da empresa afirmar que Renon não violou nenhuma regra, Luciano anunciou a toda a imprensa, no mesmo dia em que falou sobre a sua saída, que Renon seria substituído por Claudio Sforza, um especialista em reestruturação.

Neste cenário de resiliência, a Edizione, veículo familiar que possui a Benetton, tem mantido a empresa viva com injeções financeiras. Nos próximos quatro anos, planeja investir mais 260 milhões de euros. O desafio agora é revitalizar a marca em um mercado de moda ferozmente competitivo, mesmo que a Benetton siga “sem os Benettons”.

“O mandato de Luciano Benetton como presidente do conselho está previsto para terminar em junho deste ano, coincidindo com o encerramento do mandato da diretoria da Edizione SpA, a holding da família Benetton. Espera-se que uma nova administração seja nomeada pela holding, atualmente presidida por Alessandro Benetton, filho de Luciano”, diz Santini.

As restruturações históricas da Benetton

Com o tempo, toda a empresa passa por um processo de profissionalização — um processo abrangente que envolve mudanças estruturais, culturais e operacionais para garantir uma gestão mais eficiente, transparente e alinhada com as melhores práticas do mercado.

No caso da Benetton, esse processo aconteceu de forma gradual ao longo das décadas, trazendo sobretudo expectativas com os resultados da companhia, afirma Santini.

“O processo de profissionalização de uma empresa familiar traz consigo expectativas de transformações significativas na gestão e nos resultados. Espera-se que a gestão se torne mais eficiente, com a implementação de processos formais de planejamento, controle e tomada de decisão. A contratação de profissionais qualificados e a adoção de práticas de governança corporativa também são mudanças comuns, visando aumentar a transparência, a prestação de contas e a separação entre os interesses da família e os da empresa.”

Abaixo, Santini destaca alguns marcos importantes da companhia neste processo de profissionalização:

Em 2018, Luciano Benetton retornou à presidência do conselho, possivelmente devido a desafios enfrentados pela marca e à necessidade de uma liderança mais experiente e alinhada com os valores da família. Esse retorno demonstra o envolvimento contínuo da família Benetton nos rumos da empresa, mesmo após a profissionalização da gestão.

A saída de Luciano Benetton da presidência do conselho marca o fim de uma era para a marca que ajudou a fundar e que se tornou um ícone da moda italiana, afirma o pesquisador. “Resta agora à nova administração o desafio de reverter as perdas financeiras e reposicionar a Benetton no competitivo mercado da moda”.

Qual é o momento certo da família sair do negócio?

A decisão de uma empresa familiar de não ter mais membros da família na gestão ou propriedade pode ocorrer em diferentes momentos e por várias razões, afirma Santini, que destaca entre alguns cenários comuns:

“É importante ressaltar que não há um momento único ou ideal para essa transição. Cada empresa familiar é única, e a decisão de se afastar dependerá das circunstâncias específicas da família, do setor e do ambiente de negócios. Algumas empresas familiares prosperam por gerações, enquanto outras optam por fazer a transição mais cedo”, afirma Santini.

“No caso da Benetton, a empresa foi por décadas administrada pela família, passou por altos e baixos e agora enfrenta um momento crítico em sua história. A transição para uma nova administração será uma oportunidade para retomar e aprofundar esse processo, buscando uma gestão mais profissional, estratégica e adaptada aos desafios do mercado atual."

Empresas que passaram pelo processo de sucessão familiar

Muitas empresas, no Brasil e no exterior, passaram pela transição da gestão familiar para uma gestão profissional ou de capital aberto - seja qual for a mudança, a empresa se expôe a riscos e oportunidades.

"O impacto da saída da família fundadora depende da situação específica. Em alguns casos, isso permite adaptação e crescimento, em outros, pode levar à perda de identidade e propósito. O mais importante é como a transição é gerenciada", diz Santini. "Com planejamento cuidadoso, governança forte e liderança capaz, a empresa pode prosperar, mas sem esses elementos a transição pode ser prejudicial à sua saúde no longo prazo".

Alguns casos de sucesso de empresas que saíram da gestão familiar:

“Esses exemplos ilustram que, com planejamento e execução adequados, é possível realizar uma transição bem-sucedida da gestão familiar para uma gestão profissional ou de capital aberto, permitindo que a empresa continue a crescer e prosperar sob uma nova estrutura de gestão e propriedade, apesar das particularidades de cada caso”, afirma Santini. “Esperamos que a Benetton também tenha o mesmo destino”.

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