A Fosun, gigante chinesa dona do Cirque Du Soleil, mira o Brasil
EXAME visitou a sede do conglomerado que fatura 13 bilhões de dólares e tem mais de uma centena de negócios mundo afora
Da Redação
Publicado em 30 de outubro de 2018 às 07h08.
Última atualização em 30 de outubro de 2018 às 11h31.
Xangai – O tamanho e a grandiosidade dos investimentos chineses não surpreendem mais os brasileiros. Nos últimos cinco anos, empresas chinesas investiram o dobro das americanas no país. Só no ano passado, foram 24,7 bilhões de dólares, um recorde. Os setores preferidos são infraestrutura e, cada vez mais, tecnologia – no início de outubro dois gigantes chineses de internet, a Tencent e o Alibaba, anunciaram investimentos na fintechs Nubank e Stone. Mas um dos grupos chineses com mais fome de Brasil cresce discretamente.
É a Fosun, um conglomerado de 13 bilhões de dólares em faturamento cujo lucro cresce 30% ao ano desde 2012. Diferentemente de Tencent e Alibaba, a aposta da Fosun é em ativos do mundo real – coisas que as pessoas tocam, visitam, comem e bebem. De farmacêutica a cervejaria, a Fosun tem um portfólio de mais de uma centena de ativos em 17 países, onde emprega 70 mil pessoas. No Brasil, por ora é dona de imóveis, da gestora de recursos Rio Bravo e da corretora e consultora de investimentos Guide Investimentos (a aquisição do controle ainda aguarda aprovação final do Banco Central).
Mas os brasileiros também frequentam outros negócios internacionais da empresa, como a rede de resorts de luxo ClubMed e os espetáculos do Cirque Du Solei. Agora, a empresa planeja conectar seus negócios em um programa de fidelidade global, que já nasce com 148 milhões de pessoas.
Fundada a 26 anos, a Fosun é a 416ª maior empresa do mundo, segundo o ranking da revista Forbes, e dona de um império de 18,6 bilhões de dólares em valor de mercado. Seu fundador, Guo Guangchang, de 51 anos, é o 26ª chinês mais rico, com uma fortuna de 6,6 bilhões de dólares.
EXAME visitou o escritório internacional da Fosun, um edifício ostentoso de 40 andares e 180 metros de altura no centro financeiro de Xangai . A empresa está no Bund Finance Centre, um complexo de cinco torres de escritórios, um shopping center e um centro de eventos onde acontecem shows, exposições de arte e eventos corporativos. Tudo por ali é da Fosun.
Idealizado pelos renomados escritórios de arquitetura britânicos Foster + Partners e o Heatherwick Studio, o Bund Finance Centre é um marco de revitalização da histórica zona portuária da cidade e fica a menos de um quilômetro de um dos endereços mais turísticos de Shanghai, o Yu Garden, região com prédios tradicionais chineses, centro de comércio popular, e um grande jardim do século 15. Tudo ali também é da Fosun.
Investimentos imobiliários estão na tese de investimentos da Fosun – no Brasil, a empresa tem uma torre de escritórios em São Paulo –, mas são outras três áreas que a equipe de negócios da companhia tem focado: financeira, serviços para família e, por último, ativos de tecnologia e inovação.
Os negócios para família são a maior parte do portfólio hoje. Em entretenimento, o grupo chinês é dono, por exemplo, do ClubMed, rede de resorts de luxo que tem quatro unidades no Brasil, do Cirque Du Soleil, o mais famoso circo do mundo, e até de um time de futebol, o inglês Wolverhampton Wanderers. Em cuidados com a saúde, a empresa detém desde laboratórios farmacêuticos, como a Fosun Pharma, um dos maiores da China, rede de farmácias, sites que comercializam produtos para mães e bebês, hospitais, centros de diagnóstico de imagem e clínicas médicas (estes, investimentos em Portugal).
Tem participação ainda na multinacional francesa de produtos de beleza Lanvin, na segunda maior cervejaria da China, a Tsingtao Brewery, e na empresa de bicicletas compartilhadas Hellobike, terceira maior do país, com quase 4 milhões de usuários ativos por mês em 300 cidades.
Inovação
Mas a tecnologia é, na visão da Fosun, a chave de seu portfólio, que até hoje cresceu sem grandes saltos e com consistência, como seu fundador gosta de destacar nos relatórios anuais da companhia. “Para a Fosun, tecnologia e inovação são as forças que movem o seu crescimento”, diz o português Diogo Castro e Silva, diretor da companhia na América Latina.
Apenas nos seis primeiros meses de 2018, a Fosun investiu 2,2 bilhões de reais em pesquisas e incubação de startups. Na área de saúde, um exemplo, criou em 2009, a farmacêutica de medicamentos biosimilar Henlius, líder da área em que atua na China e um dos 30 maiores unicórnio do país. Outra startup investida, a Proxai, usa inteligência artificial para fazer diagnóstico de doenças – ganhou por duas vezes a competição internacional de análise de nódulos de pulmão. Vários hospitais já utilizam sua tecnologia. Ainda em inteligência artificial aplicada para diagnósticos, tem outros dois investimentos, a Airdoc e a RXThinking.
Já na área de tecnologias inteligentes, a Fosun tem investimentos bem diversificados, sendo as fintechs, startups que atuam no setor financeiro, o foco central. Na Alemanha, por exemplo, tem a fornecedora de serviço financeiros NAGA. Em Israel, a plataforma de fintechs The Floor e a consultoria de renda fixa BondIT. Além disso, diversas outras startups que investiu oferecem serviços de tecnologia usados por várias indústrias, como big data (Fonova e a Aurora Mobile), computação de nuvem (Fosun Cloud e CloudJet), blockchain (Onchain e Hyperchain) e desenvolvimento de aplicativos (APICloud).
O plano de futuro
O plano máster da chinesa é usar todas as tecnologias de ponta que existem hoje com dois propósitos centrais. O primeiro, é para uso interno, aumentando a eficiência de sua operação ao criar canais de comunicação entre as empresas investidas e promover troca de experiências entre os CEOs. “Daqui do Brasil, tenho acesso a todos os CEOs de empresas investidas pela Fosun”, conta Castro e Silva, da Fosun América Latina. Até mesmo internamente, as empresas estão se digitalizando. No ClubMed, a diretoria e os gestores dos 64 villages do mundo todo usam uma rede social para postar fotos, pedir dicas e fazer sugestões. Os clientes dos resorts também já podem fazer reservas, consultar horários das atividades e até fazer pagamento pelo celular.
O segundo objetivo da Fosun com todos esses investimentos é o mais promissor. A companhia já lançou este ano seu programa de fidelidade Youlè, que pretende conectar todos os negócios do grupo. A ideia é que um cliente do ClubMed, por exemplo, possa comprar pela mesma plataforma – e, muitas vezes, com desconto ou usando pontos de fidelidade – ingressos para o jogo dos Wolverhampton Wanderers ou para um espetáculo do Cirque Du Soleil. Também será possível adquirir produtos, como cerveja, cosméticos, medicamentos e outros que as empresas investidas ofereçam.
“Nossa visão para o futuro é aumentar significativamente o valor das empresas e produtos dentro do nosso ecossistema”, diz Guo Guangchang, fundador e atual presidente do Conselho de Administração da companhia na carta anual aos investidores, no início deste ano. “Acreditamos que o Youlè será uma ‘mão amiga’ importante no aperfeiçoamento de produtos e satisfação de serviços para os clientes de um ecossistema único da Fosun”, completa.
Por ter investimentos em diversas países, o maior desafio da Fosun hoje é se adaptar a mudanças econômicas e sociais. No Brasil, segundo a companhia, o desafio é entender o novo ciclo econômico pelo qual passamos e as novas tendências de consumo da crescente classe média para pensar em mais investimentos. Com o foco grande na integração de todo o portfólio, nada impede que outras áreas em que atua sejam exploradas por aqui, como infraestrutura, saúde e tecnologia. O plano é que você passe a ouvir falar cada vez mais neste gigante chinês – sem precisar ir a Xangai para isso.