Talibã celebra vitória após saída dos Estados Unidos do Afeganistão
A retirada americana foi considerada um êxito "histórico" pelo grupo Talibã, que assumiu o controle de Cabul em 15 de agosto
AFP
Publicado em 31 de agosto de 2021 às 07h49.
Última atualização em 31 de agosto de 2021 às 12h20.
Os talibãs celebraram nesta terça-feira (31) a saída dos últimos soldados americanos do Afeganistão, uma imagem que encerrou 20 anos de uma guerra devastadora e abre um novo capítulo marcado pela incerteza.
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A retirada americana foi considerada um êxito "histórico" pelo grupo Talibã, que assumiu o controle de Cabul em 15 de agosto e derrubou o governo afegão após uma ofensiva relâmpago em todo o país.
As tropas dos Estados Unidos invadiram o Afeganistão em 2001, na liderança de uma coalizão internacional, para derrubar os talibãs, que se recusavam a entregar o líder da Al-Qaeda, Osama Bin Laden, após os atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos.
"Felicitações ao Afeganistão (...) Esta vitória pertence a todos nós", declarou Zabihullah Mujahid, porta-voz dos islamitas, no aeroporto de Cabul, que foi controlado até segunda-feira pelas forças americanas.
"Esta é uma grande lição para outros invasores e para nossas futuras gerações .Também é uma lição para o mundo", disse Mujahid.
"É um dia histórico, um momento histórico e estamos muito orgulhosos", completou.
Na manhã desta terça-feira, os talibãs retiraram quase todos os postos de controle no caminho para o aeroporto - apenas um foi mantido. Nas estradas, os combatentes não escondiam a alegria e cumprimentavam os motoristas.
As imagens dos líderes talibãs caminhando vitoriosos pelos hangares do aeroporto, escoltados por milicianos armados que exibiam a bandeira branca do movimento, enquanto posavam para câmeras, ao lado dos helicópteros destruídos pelos americanos antes da retirada do país, resumem de maneira perfeita o novo capítulo que começa no país.
Desde que assumiram o poder, os talibãs se esforçam para apresentar uma imagem conciliadora e aberta. Eles prometeram não aplicar represálias contra as pessoas que trabalharam para o governo anterior.
"Queremos boas relações com os Estados Unidos e o mundo", garantiu Zabihullah Mujahid nesta terça-feira.
Os talibãs também informaram que pretendiam anunciar nos próximos dias a formação de um novo governo após a conclusão da retirada militar americana.
Gosto amargo
Após duas semanas de retiradas precipitadas e em alguns momentos caóticas, o último avião de transporte militar C-17 decolou do aeroporto na segunda-feira pouco antes da meia-noite em Cabul (16H29 de Brasília), anunciou em Washington o general Kenneth McKenzie, que dirige o Comando Central dos Estados Unidos.
A retirada americana foi concluída 24 horas antes da data-limite estabelecida pelo presidente Joe Biden, para quem este dia tem um gosto amargo.
O presidente, que justificou a decisão de retirar as tropas ao alegar que não queria uma guerra ainda mais prolongada, falará nesta terça-feira a seus compatriotas em um discurso difícil, no momento em que muitos americanos perguntam para que serviram as duas décadas de presença no Afeganistão.
Embora o objetivo de neutralizar Bin Laden tenha sido concretizado em 2 de maio de 2011, quando as forças especiais americanas mataram no Paquistão o líder da Al-Qaeda, as tropas dos Estados Unidos permaneceram no Afeganistão, sobretudo para formar um exército afegão que rapidamente desapareceu diante do avanço dos talibãs.
No total, Estados Unidos registraram 2.500 mortes e uma conta de 2,3 trilhões de dólares em 20 anos de guerra, de acordo com um estudo da Brown University.
Além disso, o país deixa o Afeganistão com uma imagem abalada por sua incapacidade de prever a rapidez da vitória dos talibãs e pela maneira como a retirada foi organizada.
Quase 123.000 deixaram o país
Desde 14 de agosto e durante 18 dias, aviões dos Estados Unidos e de países aliados retiraram quase 123.000 pessoas do Afeganistão, segundo o Pentágono.
Entre as pessoas que fugiram estavam cidadãos de países ocidentais, mas também milhares de afegãos que trabalharam para países e organizações estrangeiras ou que por sua profissão ou maneira de viver seriam alvos dos talibãs.
Na segunda-feira, os militares americanos admitiram que não conseguiram retirar todas as pessoas que desejavam, um fracasso que foi criticado pela oposição republicana.
Biden "abandonou americanos à mercê dos terroristas", disse o líder dos republicanos na Câmara de Representantes, Kevin McCarthy.
A grande operação de retirada a partir do aeroporto de Cabul foi manchada de sangue em 26 de agosto com o atentado suicida reivindicado pelo grupo extremista Estado Islâmico de Khorasan (EI-K), que deixou mais de 100 mortos, incluindo 13 soldados americanos.
Grande inimigo do Talibã, o EI-K pode prosseguir como uma ameaça e executar novos ataques no país.
O Pentágono afirmou que evitou no domingo um atentado com carro-bomba do EI-K contra o aeroporto ao destruir, com um drone, um veículo que estaria lotado de explosivos.
Este ataque aéreo pode representar o epílogo da longa lista de tragédias com mortes de civis que marcou as duas décadas de intervenção americana e provocou a perda de apoio local.
Membros de uma família de Cabul afirmaram à AFP que um erro fatal foi cometido e 10 civis morreram no ataque.
"Meu irmão e as quatro filhas morreram. Eu perdi minha filha pequena, sobrinhos e sobrinhas", disse, inconsolável, Aimal Ahmadi.
Medo de um recuo
O governo dos Estados Unidos seguirá "ajudando" todos os compatriotas que desejam sair do Afeganistão, afirmou na segunda-feira o secretário de Estado, Antony Blinken, e "trabalharão" com os talibãs caso cumpram seus compromissos.
"Os talibãs querem legitimidade e apoio internacional. Nossa mensagem é que a legitimidade e o apoio precisam ser merecidos", completou.
Entre 100 e 200 americanos ainda estariam no Afeganistão, segundo Blinken, que anunciou a transferência para Doha das atividades diplomáticas e consulares de Cabul.
O movimento islamista herda um país devastado, apesar dos bilhões de dólares investidos pelos Estados Unidos, e com uma pobreza extrema, a seca e a ameaça jihadista.
Além disso, os novos governantes também terão que enfrentar os receios de grande parte da população, que teme um novo regime fundamentalista como o imposto entre 1996 e 2001, tristemente célebre pelo tratamento reservado às mulheres, a proibição das liberdade básicas e a brutalidade de seu sistema judicial.
"Depois de fazer a jihad durante os últimos 20 anos, agora temos o direito de dirigir o próximo governo. Mas continuamos comprometidos com a formação de um governo representativo", insistiu Mujahid.