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Rússia faz concessões para evitar suspensão por doping

Acusada de "doping organizado", a Rússia deu os primeiros sinais de que pretende promover mudanças para evitar a suspensão de todas as competições de atletismo

Técnico trabalha no laboratório antidoping da Rússia: Putin pediu para que haja "uma cooperação mais aberta" com estruturas antidoping (AFP)
DR

Da Redação

Publicado em 11 de novembro de 2015 às 20h08.

Acusada de "doping organizado", a Rússia deu nesta quarta-feira os primeiros sinais de que pretende promover mudanças para evitar a suspensão de todas as competições de atletismo, com o presidente Vladimir Putin lançando um apelo para "fazer de tudo" para acabar com o problema.

Numa reunião muito esperada com dirigentes esportivos do país, realizada em Sochi, sede dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2014, Putin também pediu para que haja "uma cooperação mais aberta e profissional com as estruturas internacionais antidoping", segundo imagens divulgadas pela televisão russa.

Mais cedo, o ministro dos esportes, Vitali Mutko, também deu um passo nesta direção, ao aceitar nomear um "especialista estrangeiro" à frente do laboratório de Moscou, cujo diretor pediu demissão.

"Estamos totalmente abertos e até mesmo dispostos, se for necessário, a nomear um especialista estrangeiro à frente deste laboratório depois das consultas com a Agência Mundial Antidoping (WADA)", informou o ministro dos esportes, Vitali Mutko, à agência Presse R-Sport.

O diretor do laboratório de Moscou, Grigori Rodtchenkov, pediu demissão na noite de terça-feira. Ele é o primeiro a pagar pelo escândalo sem precedentes, que mescla doping e corrupção, envolvendo de atletas até os maiores escalões do governo.

No relatório bombástico que publicou na segunda-feira, a WADA acusa Rodtchenkov de ser o pivô de um esquema de doping organizado e generalizado, com suspeitas inclusive de destruição de amostras.

'Sujar a imagem' da Rússia

O encontro de Sochi já era previsto de longa data, para planejar a preparação dos atletas russos para os Jogos do Rio-2016.

O tema não poderia vir mais a propósito, porque a Rússia corre risco de ficar fora das provas de atletismo na Cidade Maravilhosa, a pedido da comissão independente da WADA que redigiu o relatório.

A decisão está nas mãos da Federação Internacional de Atletismo (IAAF), que se reunirá na sexta-feira para discutir o assunto.

Para tentar evitar o banimento dos atletas do seu país, Putin alegou que as punições precisavam ser "individuais, e não coletivas".

"Se alguém está violando as regras em vigor, a responsabilidade tem que ser individual. Os atletas que nunca foram dopados não devem pagar o preço pelos outros", argumentou.

Uma forma de lembrar que, se a Rússia for suspensa, não pisarão na pista do Engenhão estrelas como Yelena Isinbayeva, lenda viva do salto com vara, que corre risco de perder a oportunidade de encerrar a carreira com o tricampeonato no Rio, mesmo se nunca foi flagrada num exame antidoping.

Putin ainda afirmou que a Rússia tinha que realizar "sua própria investigação interna".

"O problema não existe apenas na Rússia, mas se os nossos colegas estrangeiros têm perguntas, temos que responder, para que não tenham mais", indagou.

Provocações

O ministro Vitali Mutko, por sua vez, usou um tom menos conciliador. "Respeitamos a comissão da WADA e suas conclusões, mas a Rússia é totalmente capaz de resolver seus problemas sozinha", afirmou.

Sempre na linha de frente, Mutko apelou até para a teoria do complô, alegando que o objetivo da punição seria "se livrar de um concorrente importante" e "sujar a imagem" da Rússia.

O ministro também usou um tom provocador, ao afirmar em outra entrevista, à agência Interfax, que o sistema antidoping britânico é "pior" do que o russo, uma forma de rebater as acusações da Wada de que atletas russos dopados teriam "sabotado" os Jogos de Londres-2012.

"Dizem que as medalhas conquistadas pelos nossos atletas em Londres, precisam ser retiradas. Mas parecem estar esquecendo que o sistema que foi aplicado lá foi o britânico", argumentou.

"Sinto muito, mas então, o sistema britânico é péssimo, ainda pior do que o nosso", concluiu.

Mesmo assim, até na própria Rússia, começam a ser ouvidas vozes descordantes. Mikhail Butov, secretário-geral da federação local de atletismo (ARAF), reconheceu nesta quarta-feira em entrevista à BBC que seu país "tem problemas com doping".

"Temos consciência do problema que temos, não é uma novidade para todo mundo", afirmou Butov, que repetiu, contudo, o argumento do Comitê Olímpico da Rússia, em defesa dos "atletas limpos".

"Isolar uma federação não é a solução. A suspensão puniria os nossos atletas limpos, e não aqueles que causam problemas", opinou.

Doping e corrupção

Por outro lado, Andrey Baranov, agente de atletas que contribuiu à investigação da WADA, saiu, surpreendentemente, em defesa do seu país.

"É injusto focar apenas na Rússia. Deveria ter o mesmo tipo de investigação sobre Quênia e Etiópia", declarou Baranov, em entrevista ao jornal britânico The Guardian.

O próprio Dick Pound, presidente da comissão da WADA que redigiu o relatório, deixou claro na segunda-feira que "o doping organizado também atinge outros países e outros esportes".

"O Quênia tem um grande problema. Se não trabalharem com seriedade (contra o doping), acho que alguém fará isso por eles", ameaçou Pound.

Em agosto, o país africano, que terminou em primeiro lugar do quadro de medalhas do último Mundial de Atletismo, em Pequim, foi alvo de denúncias de um documentário do canal alemão ARD, o mesmo que deu início ao escândalo e à investigação da WADA.

O escândalo também atingiu a própria IAAF, cujo ex-presidente, Lamine Diack, renunciou nesta quarta-feira ao cargo de membro honorário do COI, do qual tinha sido afastado de forma provisória na véspera.

Diack, de 82 anos, que esteve à frente da entidade de 1999 até agosto deste ano, quando foi substituído pelo britânico Sebastian Coe, foi indiciado na semana passada pela justiça francesa por "corrupção passiva e lavagem de dinheiro", com suspeitas de ter recebido propinas para acobertar casos de doping.

O presidente do COI, o alemão Thomas Bach, afirmou nesta quarta-feira que ficou "triste e chocado" com as revelações do relatório da WADA, e disse confiar em Coe para "limpar a IAAF".

"Nunca poderia imaginar que, dentro de uma federação internacional, dirigentes cheguem a pedir dinheiro dos atletas par manipular os resultados de uma competição", lamentou.

"Haverá medalhas retiradas e reatribuídas pelo COI, e dirigentes punidos e excluídos da IAAF", prometeu.

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Acusada de "doping organizado", a Rússia deu nesta quarta-feira os primeiros sinais de que pretende promover mudanças para evitar a suspensão de todas as competições de atletismo, com o presidente Vladimir Putin lançando um apelo para "fazer de tudo" para acabar com o problema.

Numa reunião muito esperada com dirigentes esportivos do país, realizada em Sochi, sede dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2014, Putin também pediu para que haja "uma cooperação mais aberta e profissional com as estruturas internacionais antidoping", segundo imagens divulgadas pela televisão russa.

Mais cedo, o ministro dos esportes, Vitali Mutko, também deu um passo nesta direção, ao aceitar nomear um "especialista estrangeiro" à frente do laboratório de Moscou, cujo diretor pediu demissão.

"Estamos totalmente abertos e até mesmo dispostos, se for necessário, a nomear um especialista estrangeiro à frente deste laboratório depois das consultas com a Agência Mundial Antidoping (WADA)", informou o ministro dos esportes, Vitali Mutko, à agência Presse R-Sport.

O diretor do laboratório de Moscou, Grigori Rodtchenkov, pediu demissão na noite de terça-feira. Ele é o primeiro a pagar pelo escândalo sem precedentes, que mescla doping e corrupção, envolvendo de atletas até os maiores escalões do governo.

No relatório bombástico que publicou na segunda-feira, a WADA acusa Rodtchenkov de ser o pivô de um esquema de doping organizado e generalizado, com suspeitas inclusive de destruição de amostras.

'Sujar a imagem' da Rússia

O encontro de Sochi já era previsto de longa data, para planejar a preparação dos atletas russos para os Jogos do Rio-2016.

O tema não poderia vir mais a propósito, porque a Rússia corre risco de ficar fora das provas de atletismo na Cidade Maravilhosa, a pedido da comissão independente da WADA que redigiu o relatório.

A decisão está nas mãos da Federação Internacional de Atletismo (IAAF), que se reunirá na sexta-feira para discutir o assunto.

Para tentar evitar o banimento dos atletas do seu país, Putin alegou que as punições precisavam ser "individuais, e não coletivas".

"Se alguém está violando as regras em vigor, a responsabilidade tem que ser individual. Os atletas que nunca foram dopados não devem pagar o preço pelos outros", argumentou.

Uma forma de lembrar que, se a Rússia for suspensa, não pisarão na pista do Engenhão estrelas como Yelena Isinbayeva, lenda viva do salto com vara, que corre risco de perder a oportunidade de encerrar a carreira com o tricampeonato no Rio, mesmo se nunca foi flagrada num exame antidoping.

Putin ainda afirmou que a Rússia tinha que realizar "sua própria investigação interna".

"O problema não existe apenas na Rússia, mas se os nossos colegas estrangeiros têm perguntas, temos que responder, para que não tenham mais", indagou.

Provocações

O ministro Vitali Mutko, por sua vez, usou um tom menos conciliador. "Respeitamos a comissão da WADA e suas conclusões, mas a Rússia é totalmente capaz de resolver seus problemas sozinha", afirmou.

Sempre na linha de frente, Mutko apelou até para a teoria do complô, alegando que o objetivo da punição seria "se livrar de um concorrente importante" e "sujar a imagem" da Rússia.

O ministro também usou um tom provocador, ao afirmar em outra entrevista, à agência Interfax, que o sistema antidoping britânico é "pior" do que o russo, uma forma de rebater as acusações da Wada de que atletas russos dopados teriam "sabotado" os Jogos de Londres-2012.

"Dizem que as medalhas conquistadas pelos nossos atletas em Londres, precisam ser retiradas. Mas parecem estar esquecendo que o sistema que foi aplicado lá foi o britânico", argumentou.

"Sinto muito, mas então, o sistema britânico é péssimo, ainda pior do que o nosso", concluiu.

Mesmo assim, até na própria Rússia, começam a ser ouvidas vozes descordantes. Mikhail Butov, secretário-geral da federação local de atletismo (ARAF), reconheceu nesta quarta-feira em entrevista à BBC que seu país "tem problemas com doping".

"Temos consciência do problema que temos, não é uma novidade para todo mundo", afirmou Butov, que repetiu, contudo, o argumento do Comitê Olímpico da Rússia, em defesa dos "atletas limpos".

"Isolar uma federação não é a solução. A suspensão puniria os nossos atletas limpos, e não aqueles que causam problemas", opinou.

Doping e corrupção

Por outro lado, Andrey Baranov, agente de atletas que contribuiu à investigação da WADA, saiu, surpreendentemente, em defesa do seu país.

"É injusto focar apenas na Rússia. Deveria ter o mesmo tipo de investigação sobre Quênia e Etiópia", declarou Baranov, em entrevista ao jornal britânico The Guardian.

O próprio Dick Pound, presidente da comissão da WADA que redigiu o relatório, deixou claro na segunda-feira que "o doping organizado também atinge outros países e outros esportes".

"O Quênia tem um grande problema. Se não trabalharem com seriedade (contra o doping), acho que alguém fará isso por eles", ameaçou Pound.

Em agosto, o país africano, que terminou em primeiro lugar do quadro de medalhas do último Mundial de Atletismo, em Pequim, foi alvo de denúncias de um documentário do canal alemão ARD, o mesmo que deu início ao escândalo e à investigação da WADA.

O escândalo também atingiu a própria IAAF, cujo ex-presidente, Lamine Diack, renunciou nesta quarta-feira ao cargo de membro honorário do COI, do qual tinha sido afastado de forma provisória na véspera.

Diack, de 82 anos, que esteve à frente da entidade de 1999 até agosto deste ano, quando foi substituído pelo britânico Sebastian Coe, foi indiciado na semana passada pela justiça francesa por "corrupção passiva e lavagem de dinheiro", com suspeitas de ter recebido propinas para acobertar casos de doping.

O presidente do COI, o alemão Thomas Bach, afirmou nesta quarta-feira que ficou "triste e chocado" com as revelações do relatório da WADA, e disse confiar em Coe para "limpar a IAAF".

"Nunca poderia imaginar que, dentro de uma federação internacional, dirigentes cheguem a pedir dinheiro dos atletas par manipular os resultados de uma competição", lamentou.

"Haverá medalhas retiradas e reatribuídas pelo COI, e dirigentes punidos e excluídos da IAAF", prometeu.

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