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Por que o Talibã não é nem de esquerda nem de direita

Valores tribais e volta a princípios da Idade Média, em que a religião dava as cartas até em relação à vida econômica e social, formam ideologia do grupo

Talibã: ideologia do grupo passa longe de conceitos como esquerda ou direita (AFP via Getty Images/Getty Images)

Talibã: ideologia do grupo passa longe de conceitos como esquerda ou direita (AFP via Getty Images/Getty Images)

CA

Carla Aranha

Publicado em 20 de agosto de 2021 às 15h19.

Última atualização em 20 de agosto de 2021 às 17h30.

Embora o Afeganistão tenha um passado socialista e os mujahideen, combatentes afegãos que antecederam o Talibã, tenham lutado contra a dominação da União Soviética na década de 80, ideologias de esquerda ou direita passam longe do receituário do grupo. Os mujahideen queriam simplesmente o fim das botas estrangeiras no país, segundo o cientista político Sébastien Boussois, da Universidade de Bruxelas, sem se importar muito com o que viria a seguir.

Claro que não era só isso: os militantes islâmicos também defendiam uma interpretação rígida da sharia, a lei muçulmana, e do Alcorão, além da volta de valores medievais como a obrigação de frequentar a mesquita e a proibição do consumo de álcool.

“O Talibã, fundado nas estruturas do movimento mujahideen, sempre pregou uma visão ultra radical da religião e nem leva tanto em conta o conceito de nacionalidade, já que o importante é carregar a bandeira do Islã”, diz Boussois. A democracia também não faz parte da lista de pretensões do Talibã.

A curta experiência socialista no país, entre 1978 e 1992, não deixou saudades para os combatentes que inspiraram o Talibã – os mujahideen, auxiliados pelos Estados Unidos, passaram anos lutando primeiro contra a União Soviética e depois contra o governo afegão.

Logo após a retirada das tropas soviéticas, em 1989, o grupo começou a ganhar corpo. “Desde o início, o Talibã tinha uma postura muito associada a uma leitura mega radical do Islã e não tinha nada a ver com esquerda ou direita”, afirma Boussois.

As raízes do Talibã estão conectadas a valores ancestrais das tribos afegãs, implantados muito antes de eventos essenciais para moldar a ideologia política contemporânea, focada na divisão entre esquerda e direita, como a Revolução Francesa, de 1789.

O código de comportamento do grupo tem como uma de suas principais influências a moral Pashtun, das tribos de mesmo nome que formam boa parte da população rural afegã. Há séculos, elas empregam conceitos como a vingança (do tipo “olho por olho e dente por dente”), punições físicas para a prática de crimes e o impedimento à educação feminina.

Em geral, é recolhida uma taxa paga por comerciantes e empresários – além disso, para participar da administração pública é preciso compactuar com os valores do grupo. A assistência aos mais pobres é feita do mesmo modo como séculos atrás, por meio de caridade, quando acontece.

Taxa de juros é proibida

Todo o sistema bancário também fica sujeito às regras do fundamentalismo, com a supervisão de empréstimos e outras operações feita por autoridades religiosas e civis. Ganhar dinheiro com juros é proibido, por ser algo visto como “usura”.

De uma forma geral, todos os negócios precisam ter aprovação do chefe local do Talibã. “É a ideologia da Idade Média, o que inclui uma prevelância da religião sobre todos os aspectos do cotidiano”, diz Vali Nasr, professor de estudos do Oriente Médio da Universidade Johns Hopkins, dos Estados Unidos.

 

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