O que a ausência de Putin na cúpula do Brics diz sobre a Rússia e a guerra na Ucrânia?
Presidente irá propor moeda de referência para transação comerciais entre países, para que não haja dependência do dólar
Agência de notícias
Publicado em 22 de agosto de 2023 às 11h01.
A ausência do presidente russo, Vladimir Putin, na cúpula do Brics , em Johanesburgo, evidencia o isolamento da Rússia e os horizontes cada vez menos amplos para Putin, um ano e meio após a invasão da Ucrânia. Todos os outros líderes do bloco — o presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa; o líder chinês Xi Jinping; o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva; e o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi — estão presentes no evento, que começa nesta terça-feira, enquanto o russo, que tem um mandado de prisão contra ele do Tribunal Penal Internacional (TPI), é representado por seu chanceler, Sergei Lavrov.
Desde o início da guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022, Putin se depara com opções de viagens cada vez mais limitadas: o líder russo hoje tem as portas abertas apenas em Pequim, nos países na Ásia Central e no Irã , além, claro, na Bielorrússia, seu grande aliado.
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Em março deste ano, o TPI emitiu um mandado de prisão para Putin por um suposto esquema para deportar crianças ucranianas para a Rússia, o que limitou ainda mais seu roteiro internacional. No caso do Brics, a África do Sul é signatária do tratado que rege o tribunal de Haia, o que a obrigaria a prender indivíduos indiciados pelo tribunal. Em 2015, no entanto, o então presidente sudanês Omar al-Bashir, indiciado por crimes de guerra e crimes contra a Humanidade ligados ao genocídio em Darfur, visitou o país, sem ser preso.
No mês passado, o gabinete de Ramaphosa disse que Putin não compareceria “por acordo mútuo”. Até agora, a África do Sul se absteve de condenar a invasão, em uma atitude que chegou a ser interpretada como apoio a Moscou.
O Kremlin se irrita com qualquer insinuação de que Putin está fugindo da cúpula do Brics por conta do mandado do TPI. Seu porta-voz, Dmitry Peskov, ameaçou que a Rússia consideraria a prisão de Putin como uma “declaração de guerra”.
No fim de julho, o presidente russo disse a jornalistas que não achava que sua presença no Brics seria “mais importante do que na Rússia nesse momento”.De acordo com uma fonte do governo sul-africano, ouvida pelo The New York Times, as instabilidades internas na Rússia, provocadas principalmente pelo motim do Grupo Wagner, contribuíram para a ausência.
Mas a ausência física de Putin, , que participará apenas virtualmente da cúpula, está sendo sentida. Na semana passada, Lula da Silva disse que seria "muito importante" a presença do russo, em entrevista ao jornal sul-africano “Sunday Times”. Um dos principais temas sobre a mesa será a ampliação do número de membros do bloco.
— Lavrov é um diplomata muito importante e experiente, mas seria muito importante que a Rússia participasse desta reunião com seu presidente. Vamos discutir importantes questões globais, como a paz e a luta contra desigualdade, e eu gostaria muito de poder discuti-los pessoalmente com o presidente Putin — disse Lula.
O presidente brasileiro também adiantou que iria propor alternativas para uma moeda de referência para transação comerciais entre os países, sem depender de uma moeda de um terceiro país, como é o caso do dólar — tema que é de extrema importância para Moscou.
Ordem multipolar
Putin é defensor do que chama de “ordem mundial multipolar ”, promovendo outros organismos, entre eles o Brics, como um contrapeso às instituições lideradas pelos EUA e Ocidente. Moscou tenta avançar com uma campanha que apresenta a Rússia como uma potência firmemente anticolonial que apoia uma ordem mundial mais justa e equitativa.
Nos últimos dois anos, Putin vem tentando atrair particularmente sul global. Para o líder russo, a África do Sul é a porta estratégica para um continente que se tornou um campo de batalha diplomático.
— Concordo que o conceito de dominação ocidental promovido pelos Estados Unidos e países subordinados não prevê o desenvolvimento harmonioso de toda a humanidade — disse Lavrov, em uma entrevista recente.
Esse foi um dos principais objetivos da recente cúpula Rússia-África, no mês passado, quando Putin anunciou a assinatura de acordos de cooperação militar com mais de 40 países do continente e a doação de até 50 mil toneladas de grãos a aliados. Mas a baixa participação de líderes africanos pode ter decepcionado o Kremlin, já que menos da metade dos chefes de Estado compareceram ao evento, em relação à última edição antes da pandemia, em 2019.